Movido por novo sistema, trem do Metrô ‘desembesta’ para fim da linha em São Paulo
Comprovada por relatório, falha não é nova, mas se repete na estação Vila Prudente só quatro dias depois de governo ignorar recomendação do Ministério Público
Publicado 27/02/2014 - 16h49
São Paulo – Um trem do Metrô de São Paulo, comandado pelo novo sistema de sinalização e operação das composições, conhecido como CBTC, descambou na última segunda-feira (24) em direção ao paredão que existe depois da estação Vila Prudente, um dos terminais da Linha 2-Verde. Só não houve colisão porque o condutor agiu rapidamente, aplicando freio de emergência. O incidente ocorreu em horário de pico, às 8h, e havia passageiros na composição.
A falha, que não é inédita, ocorreu apenas quatro dias depois de o Metrô ter contrariado recomendação do Ministério Público de São Paulo (MP-SP) e decidido continuar com a instalação da nova tecnologia, contratada junto à Alstom por R$ 726 milhões. A informação consta em documento interno do Metrô, conhecido como Relatório de Ocorrência Técnica, ao qual a RBA teve acesso.
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Na descrição do incidente, o condutor explica que o trem estava se aproximando normalmente da estação Vila Prudente, reduzindo a velocidade, quando, ao chegar na metade da plataforma, acelerou sozinho. O metroviário puxou a alavanca de frenagem e conseguiu parar a composição cerca de dez metros além do devido: é o que se conhece como “parada longa”, ou seja, quando o trem cessa movimentos depois dos limites da plataforma.
No relatório, o operador afirma que essa diferença correspondeu ao comprimento de um vagão. Condutores ouvidos pela RBA afirmam que o espaço entre a estação Vila Prudente e o para-choque que sinaliza o fim da linha é de, no máximo, três vagões. Como o trem ficou desalinhado com a plataforma, nem as portas do trem nem as da plataforma se abriram.
As três estações mais novas da Linha 2-Verde do Metrô de São Paulo – Sacomã, Tamanduateí e Vila Prudente – possuem portas de plataforma, assim como ocorre em toda a extensão da Linha 4-Amarela. Elas só puderam ser abertas por um dispositivo de emergência, acionado pelo funcionário da estação. Então, um manobrista assumiu o comando do trem na cabine contrária, alinhou a composição e procedeu ao desembarque de passageiros. Com a situação regularizada, novos usuários embarcaram e prosseguiram viagem.
A composição avariada é nova: é conhecida como G14 e pertence à frota G, fornecida pela Alstom entre 2008 e 2010. A empresa francesa também é responsável pelo desenvolvimento e instalação do CBTC (sigla para Communication Based Train Control) na Linha 2-Verde. Apenas as estações Sacomã, Tamanduateí e Vila Prudente operam com CBTC em tempo integral, todos os dias da semana. Mas testes com o novo sistema ocorrem em toda a extensão da linha, aos domingos.
Falhas são comuns. Neste mês, ao menos três panes acometeram o CBTC na Linha 2-Verde. Duas delas ocorreram aos domingos, nos dias 9 e 16 de fevereiro. Na ocasião, trens sumiram das telas do Centro de Controle Operacional (CCO) do Metrô, provocando uma situação de risco conhecida como “trens fantasmas”. O defeito levou a paralisações que duraram 17 e 40 minutos, respectivamente.
Até onde se sabe, o problema registrado na estação Vila Prudente na última segunda-feira (24) é o mais recente no histórico de falhas do CBTC. Mas não é a primeira vez que trens movidos pelo sistema da Alstom desembestam rumo ao fim da linha. Denúncias de metroviários apontam que o mesmo incidente ocorrera “pelo menos cinco vezes” em 2011 e 2012, no início da fase de testes.
Falhas e atrasos na implantação do sistema motivaram o promotor Marcelo Milani a recomendar que o Metrô suspendesse os contratos com a empresa francesa. A companhia, porém, “diante da ausência de elementos ou indícios suficientes de irregularidades”, decidiu continuar implementando a tecnologia.
O governo do estado de São Paulo já desembolsou R$ 490 milhões com o CBTC. Em contrapartida, a Alstom já pagou R$ 77 milhões em multas contratuais devido aos atrasos e problemas na instalação do sistema. Devido a irregularidades, os pagamentos estão suspensos há cerca de um ano. A questão é razão de disputa entre a multinacional e o poder público paulista.
A Alstom é investigada por corrupção no fornecimento de equipamentos elétricos à Empresa Paulista de Transmissão de Energia (EPTE) e formação de cartel em contratos metroferroviários com o governo estadual, ambos em conluio com membros da administração tucana. A promotoria estima que o esquema, conhecido como “propinoduto tucano”, tenha desviado R$ 800 milhões para alimentar o caixa dois do PSDB e partidos aliados.
Procurado, o Metrô não desmentiu a falha da última segunda-feira (22). “O Metrô esclarece que não há registros de ocorrências que tenham comprometido o desempenho do sistema CBTC e a segurança operacional do trecho entre as estações Vila Prudente e Sacomã, extensão da Linha 2- Verde”, afirmou a companhia, em nota.
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