Interesses

Campanha alerta para ‘lobby das isenções’ na reforma tributária

A cada setor que conseguir emplacar isenções e benefícios, maior será a alíquota dos tributos que vai incidir sobre todos, inclusive os mais pobres

Valter Campanato/Agência Brasil
Valter Campanato/Agência Brasil
Bancada ruralista se insurge contra cashback em alimentos para a população mais pobre

São Paulo – O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, entregou nesta semana ao Congresso o primeiro projeto de regulamentação da reforma tributária. Agora o Câmara dos Deputados deve formar grupos de trabalho para relatar o projeto com detalhamento das regras do novo sistema. Depois será a vez do Senado apreciar a proposta.

Durante esse período, grupos organizados farão todo tipo pressão sobre os parlamentares em busca de vantagens tributárias que beneficiem seus próprios interesses. Nesse sentido, a Campanha Tributar os Super-Ricos, alerta: “O lobby das isenções e benefícios a setores privilegiados está a postos”.

A proposta inclui, por exemplo, 15 itens na cesta básica com alíquota zero, como arroz, feijão, farinha, leite, açúcar, manteiga e margarina. Outros itens como carnes bovinas, suína e de peixe, e o sal terão alíquota reduzida em 60%. Enquanto os chamados “itens de luxo” terão alíquota de imposto normal. Há ainda o Imposto Seletivo – conhecido como “imposto do pecado” –, uma sobretaxação aos produtos que causam danos à saúde e/ou ao meio ambiente.

Ao mesmo tempo, a proposta também prevê dinheiro de volta dos tributos pagos pelas famílias de baixa renda. A regulamentação do cashback estabelece que a devolução de tributos beneficiará famílias com renda per capita de até meio salário mínimo e as inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico). O mecanismo, portanto, traz um viés de justiça social, com os mais pobres pagando menos impostos proporcionalmente.

Pressões já começaram

A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) afirmou que trabalhará pela aprovação do projeto de lei proposto por ela própria para regulamentar a reforma tributária. A intenção é ampliar a lista de produtos com alíquota zero. Eles querem, por exemplo, a inclusão de carnes, ovos, óleos, gorduras, sucos naturais, castanhas e nozes, molhos preparados e condimentados, biscoito, bolos, chá e mate.

Além disso, os representantes do agronegócio também são contra o cashback. “Reforçamos nossa posição sobre a desoneração da Cesta Básica, sem cashback, para famílias que necessitam de acesso à comida barata e de qualidade, como medida urgente e necessária para combater a inflação de alimentos”, disse a bancada ruralista em nota.

Do mesmo modo, a Associação Brasileira de Supermercados (Abras) também afirmou que irá apresentar, nos próximos dias, uma nova proposta com produtos que considera ideais para compor a cesta.

Em princípio, pode parecer uma reivindicação louvável. No entanto, a ampliação da lista de produtos isentos resultaria em aumento da carga tributária para todos os consumidores. Enquanto os setores do agronegócio e supermercadista pagariam menos. O ataque ao cashback revela que a intenção não é beneficiar os que mais precisam.

Já a Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas não Alcoólicas (Abir), afirma que o setor foi “pego de surpresa” com a inclusão das bebidas açucaradas entre os produtos que terão incidência do futuro “imposto do pecado”. Similarmente, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) também reclamou do Imposto Seletivo, que além dos veículos, também vai atingir mineração e petróleo.

Interesses em jogo

Dessa maneira, as mais de 70 organizações sociais, entidades e sindicatos que compõem a Campanha Tributar os Super-Ricos alertam que “há muitas perguntas e muitos interesses em jogo” no âmbito da regulamentação da reforma tributária. Isso porque a cada setor que conseguir emplacar seus lobbies pela desoneração dos seus negócios, implicará em alíquotas maiores de impostos que recairão sobre todos, incluindo os mais pobres. “É hora de ficar de olho e defender justiça social e fiscal”.