Ato fálico

O que Bolsonaro ganhará com campanha no 7 de setembro? Mais processos na Justiça

Presidente fez campanha com dinheiro público nas comemorações da Independência. Falou apenas para apoiadores, ostentou suposta masculinidade e mulher-princesa e atacou democracia

Reprodução/Twitter
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Rio de Janeiro, passageiros reagem a motociata bolsonarista

São Paulo – O 7 de setembro na Avenida Paulista, em São Paulo, foi marcado pela presença de seguidores de Bolsonaro abaixo do esperado. Enquanto integrantes do núcleo de apoio do presidente discursavam, incluindo seu filho 03, Eduardo Bolsonaro, não tremulava no caminhão principal a bandeira do Brasil, mas sim a dos Estados Unidos. Já no Rio de Janeiro, onde o presidente articulou um comício no lugar da tradicional parada cívica, uma motociata antecedeu sua chegada. Mas marcada por protestos de populares furiosos com o trânsito e fazendo gestos “imbrocháveis” de dentro dos ônibus. O presidente sequestrou as manifestações cívicas do bicentenário da Independência para fazer campanha eleitoral, falando apenas com sua bolha.

Por volta das 16h, bolsonaristas ocuparam trechos da Avenida Paulista. As mesmas bandeiras antidemocráticas vistas pela manhã, em Brasília, marcaram presença no local. Nada sobre os 200 anos da Independência do Brasil, fato que será alvo de apurações da Justiça por abuso de poder. Em contraponto, dizeres como “Bolsonaro, acione as Forças Armadas contra o STF”, eram abundantes. “Limpe o STF e o TSE”, dizia outra faixa. Os ataques contra o Judiciário foram constantes ode houve movimentação de apoiadores radicais do presidente.

“Sentiu”

Até mesmo canais criados para apoiar Bolsonaro nas redes sociais não esconderam o sequestro da data cívica pela campanha eleitoral do presidente. “Copacabana está lotada em apoio ao presidente Bolsonaro (…) Mais um vídeo da manifestação em Brasília a favor do presidente Bolsonaro”, apontou um dos portais da bolha bolsonarista nas redes sociais. De fato, o presidente utilizou a relevância deste 7 de setembro de bicentenário da Independência para promover sua candidatura. Desse modo, o uso da máquina pública pode ser tipificado como crime, como apontam juristas.

Para o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ayres Britto, a Constituição foi “estapeada” por Bolsonaro durante o dia de hoje.

“A nossa Constituição resultou estapeada nesse discurso. Quem elaborou a Constituição não foi um governo, foi a nação brasileira. Não há chefe da nação. A nação é que é chefe de todo mundo.”

“Ele falou do dia 2 de outubro ao final do discurso. Até a vitória, ele afirmou. O que configura um pedido de voto. Não se pode tapar o sol com a peneira. O princípio da paridade de armas eu prefiro chamar de correlação de forças. O TSE vai ter que apreciar e usar de isenção, de tecnicidade no equacionamento jurídico desse caso. Comprovar se configura um ilícito eleitoral”, disse em entrevista ao UOL. “Bolsonaro pôs o 7 de setembro a serviço dele”, completou.

Abuso da máquina

O ex-presidente Lula divulgou vídeo afirmando que participou por duas vezes de comemorações do 7 de setembro em anos eleitorais, em 2006 e 2010. “Nunca utilizamos o Dia da Pátria para campanha eleitoral.”

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição, criticou os discursos de Bolsonaro neste feriado e afirmou que irá contestar na Justiça Eleitoral o uso do aparato estatal em favor da campanha de reeleição. “Ajuizaremos ação junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para apurar o abuso da máquina pública cometido por Bolsonaro hoje”, disse.

A presidenta do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann, reforçou a crítica. “Apropriação indébita do Bicentenário da Independência do Brasil por Bolsonaro. Ele roubou do povo a comemoração para fazer sua campanha”, disse. Segundo Gleisi, Bolsonaro apequenou o 7 de setembro. “Usou um palanque para se auto elogiar e atacar Lula. Desprezível, quis se colocar acima do país.”

‘Micareta golpista’

O cartunista Carlos Latuff foi à avenida Paulista “infiltrado”, de acordo com seu relato. “Infiltrado na histeria bolsonarista na avenida Paulista me deparo com as faixas típicas. Ataques ao STF e ao ministro Alexandre de Moraes, e claro, apelos às forças armadas para um golpe militar.”

O portal Quebrando o Tabu cravou, a respeito do dia: “As imagens da praia de Copacabana, da avenida Paulista e da Esplanada dos Ministérios são bem claras: O 7 de Setembro se tornou uma micareta golpista”.

Mesmo sem a fala explícita a respeito, bolsonaristas encararam “decepção” com a situação de Bolsonaro nas pesquisas neste 7 de setembro. Mas a data de hoje foi alardeada pelo presidente e apoiadores como um marco. Muitos esperavam investidas mais fortes do bolsonarismo no sentido de um golpe, diante da provável derrota nas urnas. “Expectativa: 7 de setembro pode empoderar Bolsonaro para a concretização do golpe. Realidade: caminhões proibidos de entrar na Esplanada e Bolsonaro chorando no banho”, provocou o deputado federal André Janones (Avante-MG)

Sequestro da data

“Bolsonaro não ganhou um voto hoje. Falou apenas para sua base de extrema direita. O sequestro da data nacional, o crime eleitoral explícito, a ameaça de golpe e a fala machista de homem fraco só o isolam mais política e eleitoralmente. Bolsonaro perdeu de novo no 7 de Setembro. Tem gente, mas menos do que Bolsonaro e aliados esperavam. É um comício da extrema-direita, que vai perder a eleição presidencial. Bolsonaro não tem maioria no país”, avaliou o jornalista Kennedy Alencar.

Os fatos observados foram evidenciados pela própria organização bolsonarista em Brasília. Ao ser anunciado, o locutor do comício disse: “Aqui hoje na Esplanada mais de 100 mil, após o desfile oficial deste 7 de setembro. É o povo brasileiro que clama por liberdade”, disse. Imediatamente, o locutor foi corrigido por pessoas próximas do presidente, e multiplicou o número de presentes. “Em toda Esplanada, chegou os dados, 1 milhão de pessoas aqui”, disse. Cálculos de especialistas estimaram um público de 32 mil pessoa, baseados na ocupação territorial (pessoas por metro quadrado).


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Discurso repetido

Em Copacabana, Bolsonaro repetiu o discurso de Brasília. “Não sou educado. Falo palavrões, mas não sou ladrão”, disse o político que ainda não explicou 51 imóveis comprados com dinheiro vivo por familiares. “Esse tipo de gente precisa ser extirpada da vida pública”, prosseguiu, ao se referir à “velha política”. Bolsonaro e três de seus filhos são políticos de carreira, alinhados ao chamado centrão há mais de uma década. Bolsonaro não compareceu à avenida Paulista, em São Paulo.


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