O preço de ser pobre

Homem é solto após ficar preso por quase 2 anos devido a ‘erros burocráticos’

“Esquecido preso” no CDP de Caraguatatuba, litoral norte de São Paulo, réu teve situação descoberta por acaso pela Defensoria Pública, que obteve soltura neste mês

Sifuspesp/Reprodução
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Para defensor público, caso revela o "quão nociva" é a ausência de Defensorias Públicas nas cidades brasileiras e quanto a privação de liberdade está "banalizada" para quem é pobre

São Paulo – Um homem foi libertado no último dia 11 após ficar preso irregularmente por quase dois anos no Centro de Detenção Provisória de Caraguatatuba, litoral norte de São Paulo. O caso foi descoberto “por acaso” pela Defensoria Pública do estado, que obteve a soltura. De acordo com informações divulgadas pelo órgão, por “erros burocráticos do sistema judiciário”, o homem foi “esquecido preso” por um ano e oito meses. 

Em 2018, ele foi detido em flagrante por furto, e acabou condenado a pena de um ano de reclusão, dada a baixa gravidade do crime na legislação penal. A sentença acabou sendo substituída por prestação de serviços comunitários depois de uma audiência de custódia que o colocou em liberdade provisória. A pena, no entanto, foi novamente revertida, segundo a Defensoria, devido ao descumprimento das medidas cautelares impostas. E o homem teve novamente a prisão preventiva decretada. 

O órgão aponta que o mandado de prisão foi cumprido no final de 2018. Mas, apenas em fevereiro deste ano, a prisão foi certificada em juízo. Nesse período, o homem permaneceu encarcerado apesar da pena fixada de um ano de prestação de serviços. Em agosto, ao tomar conhecimento do caso por conta de uma audiência em outro processo no qual o homem é réu, o defensor público Rodrigo Figueiredo de Oliveira, peticionou a soltura à 2ª Vara de Ubatuba, questionando a demora do ato pela Justiça. 

Privação de liberdade é banalizada

Na petição, de acordo com o órgão, Oliveira destacava que “o réu estava preso cautelarmente havia 1 ano e 8 meses. Tempo superior ao da própria condenação”. A manutenção da prisão, ressaltou o defensor, contrariava o Código de Processo Penal.

Para o defensor, que atua na 3ª Vara Criminal de São José dos Campos, o caso expõe a gravidade da ausência da Defensoria Pública. Em Caraguatatuba, por exemplo, não há unidade do órgão. Até 2014, de acordo com 4º Diagnóstico da Defensoria Pública no Brasil, apenas quatros estados contavam com defensorias em todas as comarcas. Era o caso de Roraima, Tocantins, Rio de Janeiro e Distrito Federal. A Defensoria é a única instância de acesso à Justiça pela população mais pobre do país. 

De acordo com Oliveira, “este infelizmente é o um caso concreto que revela quão nociva é a ausência da Defensoria Pública em todas as comarcas do Estado, e como a privação da liberdade é banalizada no país. Réu pobre, esquecido preso, que por mero acaso e sorte teve sua situação descoberta, permitindo sua libertação”, contestou o defensor.

O homem ainda ficou preso até o dia 11 de dezembro, quando o juiz Fabrício José Pinto Dias, da 2ª Vara de Ubatuba, deferiu o pedido de soltura.