Indecisões

André do Rap: STF julga hoje artigo que revisa prisões preventivas

Caso serviu para reanimar o defunto da Lava Jato. Parlamentares também pressionam por PEC da prisão em segunda instância. Por trás, o medo de Lula presidente em 2022

Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Caso abriu crise entre o presidente do STF, Luiz Fux, e o novo decano, Marco Aurélio Mello

São Paulo – O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) começa a julgar nesta quarta-feira (14) o caso do traficante André Oliveira Macedo, o André do Rap. Ele foi solto no último sábado (10) pelo ministro Marco Aurélio Mello. No mesmo dia, a ordem de prisão foi restabelecida pelo presidente da Corte, Luiz Fux, que cassou a liminar concedida pelo colega. Mas a suspeita é que o traficante tenha fugido para o Paraguai.

Além do caso específico, os ministros devem avaliar a aplicação do artigo 316 do Código de Processo Penal (CPP). Aprovado pelo Congresso no chamado pacote anticrime, o dispositivo prevê que as prisões preventivas devem ser revistas a cada 90 dias, sob pena de serem consideradas ilegais.

Foi com base nesse artigo que Marco Aurélio proferiu sua decisão. Como não houve a reavaliação da preventiva pelo juízo responsável, nem solicitada a sua renovação pelo Ministério Público dentro do prazo estabelecido, ficou demonstrado, segundo ele, a ilegalidade da sua prisão.

Os magistrados também devem avaliar as prerrogativas do chefe da Suprema Corte para revogar decisões dos colegas. Por isso, o caso foi levado rapidamente ao plenário. Como controla a pauta do Tribunal, assim o presidente viraria uma espécie de “superministro”, caso possa derrubar decisões monocraticamente.

Tiranetes

Para o cientista político Cláudio Couto, professor da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP), tanto Marco Aurélio quanto Fux erraram ao agirem de maneira monocrática. Em entrevista ao Jornal Brasil Atual, ele afirma que é preciso reformar o regimento do Supremo.

O risco, segundo ele, é que cada ministro acaba atuando como um “pequeno tirano”, indo contra decisões colegiadas ou dos colegas. “O que esse caso nos ensina é que o Supremo precisa se repensar. Os juízes precisam abrir mão um pouco desse poder monocrático, em nome da instituição a que eles pertencem. Para que não tomem decisões dessa gravidade de forma individual”, afirmou.

Lavajatismo

O caso também serviu para reavivar as forças punitivistas representadas pela Operação Lava Jato. O ex-ministro Sergio Moro se apressou em dizer que o artigo 316 foi inserido pelos parlamentares no pacote anticrime contra a sua vontade. Ele afirmou, inclusive, que sugeriu ao presidente Jair Bolsonaro que vetasse o trecho em questão. “Daqui a pouco pode ter assassino sendo solto”, alardeou Moro, em entrevista à Globonews.

O Diário do Centro do Mundo lembrou episódio parecido, quando Moro utilizou a possibilidade de soltura de um traficante para acuar o então ministro Teori Zavascki. Relator da Lava Jato no STF em 2014, Teori havia mandado revogar a prisão do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa.

O ministro havia considerado ilegal a prisão preventiva decidida por Moro. Como as investigações tinham atingido o então deputado federal, José Janene (PP-PR), o inquérito devia ter sido encaminhado ao Supremo, o que esvaziaria os poderes do juiz da Lava Jato. Naquele momento, Moro já tomava decisões – como a quebra de sigilo, por exemplo –, sem consultar os procuradores. Algumas vezes, o Ministério Público Federal era avisado posteriormente. E, em pelo menos um dos casos, Moro decidiu contra determinações dos procuradores.

Com o intuito de colocar freio aos abusos cometidos por Moro, em 18 de maio de 2014, Teori determinou que os processos da Lava Jato fossem enviados ao Supremo e que Paulo Roberto Costa e os demais presos pela operação fossem colocados em liberdade. Moro soltou Costa, mas retrucou, alegando que a libertação dos presos colocaria em liberdade o traficante Reni Pereira da Silva. Ele operava esquema de lavagem de dinheiro juntamente com o doleiro Alberto Yousseff.

Fator Lula

Além de possíveis alterações no artigo 316 do CPP, a soltura de André do Rap também está sendo utilizada para reacender os debates em torno da possibilidade de prisão após condenação em segunda instância. Preso preventivamente, o traficante já havia sido condenado, em tribunal colegiado, por tráfico internacional de drogas.

De maneira oportunista contudo, alguns setores pretendem aproveitar essas discussões para estabelecer a volta do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a prisão. O presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, afirmou nesta terça-feira (13) que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que permite a prisão em segunda instância deve ser votada ainda em 2020.

O mesmo Supremo, que em poucos dias decidiu levar o caso de André do Rap ao plenário, tem protelado, desde novembro de 2018, para julgar habeas corpus de Lula pedindo que seja declarada a suspeição do então juiz Sergio Moro. Ele foi solto em novembro de 2019, após o STF considerar inconstitucional a prisão após condenação em segunda instância. Lula passou 580 dias preso na Superintendência da Polícia Federal (PF), em Curitiba, impedido de participar das eleições de 2018.


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