Relações duvidosas

STF manda investigar atuação da Transparência Internacional junto à Lava Jato

Decisão do ministro Dias Toffoli foi motivada por notícia-crime do deputado Rui Falcão (PT-SP) que denunciou “parceria” da Lava Jato com a Transparência Internacional

Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Corte vai investigar "duvidosa legalidade" de fundação que a Lava Jato pretendia criar com a participação da Transparência Internacional

Brasília – O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou, nesta segunda-feira (5), que a Procuradoria-Geral da República (PGR) encaminhe à Corte uma série de documentos para apurar a atuação da organização não governamental (ONG) Transparência Internacional no Brasil.

“Tal providência faz-se necessária especialmente para investigar eventual apropriação indevida de recursos públicos por parte da Transparência Internacional”, justificou o ministro. Nesse sentido, a investigação atinge também os respectivos responsáveis pela ONG.

Assim, Toffoli determinou que a PGR lhe entregue cópia dos documentos que obteve em investigações que têm conexões com casos sob sua responsabilidade.

“Bem examinados os autos, verifico que fatos gravíssimos e que não passaram pelo crivo do Poder Judiciário e do Tribunal de Contas da União (TCU) foram descritos na decisão proferida nestes autos pelo ministro Humberto Martins, do Superior Tribunal de Justiça (STJ)”, acrescentou Toffoli. Ele referiu-se à decisão anterior, na qual Martins afirma ser “adequada e prudente” a remessa do processo instaurado no STJ para apurar a atuação da ONG.

As decisões de Martins e de Toffoli foram motivadas por uma notícia-crime que o deputado federal Rui Falcão (PT-SP) apresentou contra os procuradores da República que participaram da assinatura do acordo de leniência firmado pela empresa J&F Investimentos, dos empresários Joesley e Wesley Batista e controladora da JBS, entre outras.

Combate à corrupção

Em sua petição, o parlamentar sustenta que, desde ao menos 2014, o MPF atuou em parceria com a Transparência Internacional. Por sua vez, a parceria resultou em ações “genericamente apontadas como de combate à corrupção”. Ele lembra que, em março de 2018, iniciou-se uma negociação para que parte do valor das multas fosse para a ONG.

“(Falcão) entende que, sob o pretexto de desenvolver ações de combate à corrupção, o Ministério Público Federal, de forma ilegal, concedeu à Transparência Internacional poderes de gestão e execução sobre recursos públicos, sem que se submetessem aos órgãos de fiscalização e controle do Estado brasileiro de modo que existem circunstâncias a serem esclarecidas sobre a atuação da entidade e de membros do MPF ”, explicou o ministro Humberto Martins na decisão que Toffoli cita para justificar sua própria sentença.

“Duvidosa legalidade”

Toffoli também menciona manifestação do ministro Alexandre de Moraes, do STF. Em 2019, Moraes suspendeu um acordo que a força-tarefa da operação Lava Jato firmou com o governo dos Estados Unidos. Ao estabelecer o valor que a Petrobras iria ressarcir a investidores norte-americanos, o acordo previa que parte da multa – cerca de R$ 2,5 bilhões – iria para uma fundação. Os procuradores da Lava Jato seriam os responsáveis pela tal fundação.

“O ministro Alexandre de Moraes, ao deferir o pedido de tutela provisória (…) registrou ser “duvidosa a legalidade de previsão da criação e constituição de fundação privada para gerir recursos derivados de pagamento de multa às autoridades brasileiras, cujo valor, ao ingressar nos cofres públicos da União, tornar-se-ia, igualmente, público, e cuja destinação a uma específica ação governamental dependerá de lei orçamentária editada pelo Congresso Nacional, em conformidade com os princípios da unidade e universalidade orçamentárias”, comentou Toffoli. Porém, ele destaca que, segundo o acordo suspenso por Moraes, uma parcela iria para a Transparência Internacional. “Uma instituição privada, ainda mais alienígena e com sede em Berlim”, frisou o ministro.

Pagamento suspenso

Na última quinta (1º), Toffoli suspendeu o pagamento de cerca de R$ 8,5 milhões em multas contra a empreiteira Novonor (antiga Odebrecht). A penalidade decorre da do acordo de leniência assinado com o Ministério Público Federal (MPF), em 2016, também no âmbito da Lava Jato. Anteriormente, o ministro já tinha suspenso o pagamento de uma multa no valor de R$ 10,3 bilhões do acordo de leniência da J&F. 

Nesse sentido, Novonor e J&F pediram acesso integral aos documentos da Operação Spoofing. A Polícia Federal (PF) deflagrou a operação em 2019. O objetivo era investigar a troca de mensagens que revelaram que o ex-juiz Sergio Moro e integrantes do MPF combinavam procedimentos investigatórios na Lava Jato.

Assim, em seu pedido, a Novonor argumentou que “uma simples análise parcial do material obtido a partir da Spoofing” permite corroborar as suspeitas. Para a empreiteira, membros da Lava Jato praticaram “excessos”, os quais visaram a coagi-la para a celebração de um acordo.

No entanto, ao atender o pedido da J&F, Toffoli afirmou que, a seu ver, “há, (no processo,) no mínimo, dúvida razoável sobre o requisito da voluntariedade da requerente ao firmar o acordo de leniência com o Ministério Público Federal que lhe impôs obrigações patrimoniais, o que justifica, por ora, a paralisação dos pagamentos, tal como requerido pela autora”.

Agência Brasil entrou em contato com a Transparência Internacional por e-mail e aguarda resposta. Em outras ocasiões, a ONG negou ter recebido recursos indevidamente. Além disso, em dezembro de 2023, a entidade afirmou ser alvo de acusações infundadas e de assédio judicial.


Por Alex Rodrigues, repórter da Agência Brasil