Justiça à vista

PGR corre para tentar blindar Bolsonaro, prestes a perder o foro privilegiado

Bolsonaro deve ser alvo de diferentes processos junto à primeira instância da Justiça Comum. Então, a PGR corre para tentar arquivamentos

Arquivo/EBC
Arquivo/EBC
Não é a primeira vez que a vice-procuradora-geral atua em benefício de Bolsonaro. Ela já recomendou o arquivamento de inquéritos contra o ex-presidente

São Paulo – O presidente Jair Bolsonaro (PL) está às vésperas de deixar o Planalto e perderá o foro privilegiado. Isso aproxima a possibilidade de prisão, já que pesam sobre ele uma série de inquéritos e investigações por supostos crimes. Assim, a Procuradoria-Geral da República (PGR) corre contra o tempo para tentar protegê-lo. A instituição, aparelhada pelo candidato à reeleição derrotado nas urnas, vem apresentando uma série de pedidos de arquivamento de investigações.

Sob comando do indicado de Bolsonaro Augusto Aras, já solicitou ao menos dez arquivamentos de processos contra o presidente. Contudo, a decisão final a respeito (oferecimento da queixa ou denúncia ou arquivamento) cabe ao Judiciário. No caso de quem tem foro privilegiado, a decisão final é do Supremo Tribunal Federal (STF). A Corte já negou o arquivamento de cinco processos e despachou três para investigação da Polícia Federal (PF).

Boa parte destas ações surgiram a partir da CPI da Covid. Entre os supostos crimes de Bolsonaro estão charlatanismo, emprego irregular de verba pública, incitação ao crime e prevaricação. Durante os piores dias da pandemia de covid-19, Bolsonaro fez propaganda abertamente de medicamentos ineficazes contra o vírus, como cloroquina e ivermectina. O presidente ainda ignorou dezenas de propostas para aquisição de vacinas. Ao contrário, o governo preferiu conduzir negociações com a vacina Covaxin, em um esquema que seria superfaturado. Contudo, a CPI da Covid conseguiu impedir a concretização do contrato.

Amiga do rei

A grande parte dos pedidos de arquivamento veio da vice-procuradora-geral Lindôra Araújo. Ela é vista dentro do Ministério Público Federal (MPF) como conservadora e próxima de Bolsonaro. Durante a Operação Lava Jato, ela atuou como coordenadora dos casos dentro do MPF e representante do órgão junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Lindôra foi levada à PGR por Aras em abril de 2022.

De fato, os membros da CPI a apontaram como parcial. Eles apontaram que suas ações eram tentativa de blindar o presidente. Em julho, o vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), denunciou uma série de encontros secretos entre Lindôra e Bolsonaro. O presidente teria prometido o cargo de Procuradora-Geral da República após o fim do mandato de Aras, no ano que vem. Plano este frustrado após a derrota nas urnas para o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Então, na semana passada, após mais uma série de pedidos de arquivamento de Lindôra, Randolfe disse que a atuação da procuradora é “um absurdo”. “A Procuradoria se esforça para negar os crimes de Bolsonaro”, completou.

Cobranças

Entidades da sociedade civil ligadas à ciência e à saúde se manifestaram em uma série de notas de repúdio contra a blindagem de Bolsonaro. A presidenta do STF, ministra Rosa Weber, por sua vez, cobrou ações da PF, responsável por inquéritos policiais em caso de foro privilegiado, Na última segunda-feira (7), o delegado Elias Milhomens de Araújo disse que a polícia não recebeu ainda os documentos necessários da PGR para dar andamento às investigações.

Contudo, na mesma segunda-feira, Lindôra voltou a proteger Bolsonaro e seu clã. Ela pediu um novo arquivamento, desta vez contra o presidente, seus filhos Flávio e Eduardo (senador e deputado federal, respectivamente), além dos bolsonaristas do núcleo do presidente Onyx Lorenzoni, Osmar Terra, Bia Kicis e Carla Zambelli. Todos eles foram indiciados por incitação ao crime. Pesam declarações públicas em favor de aglomerações, contra vacinas e contra o uso de máscaras, por exemplo.

Os pedidos de arquivamento não são restritos ao âmbito da CPI da Covid. Lindôra também pediu arquivamento de investigação sobre suposta interferência de Bolsonaro no comando da PF, em benefício próprio e de sua família. Esta investigação surgiu após denúncias do ex-juíz e senador eleito Sergio Moro (União-PR) que, ironicamente, apoiou Bolsonaro nas eleições.

Investigações contra Bolsonaro

Ao passo que Bolsonaro perde o foro privilegiado, outros processos passarão a andar mais rápido, em tribunais de primeira instância. Por exemplo, acusações de desvio de salários (as rachadinhas) em seu gabinete quando deputado federal. Este caso também envolve o envio de uma série de cheques do suposto laranja Fabrício Queiroz para a primeira-dama Michelle Bolsonaro.

Em outra ação que deve voltar a correr na Justiça, Bolsonaro é investigado por injúria e incitação ao crime. Trata-se de uma queixa-crime movida pela deputada federal Maria do Rosário (PT-RS). Bolsonaro disse à parlamentar que ela “não merece ser estuprada” por ser “muito feia” e que “não faz seu tipo”.