Coincidência?

Agente da PF que acompanhava Tarcísio em Paraisópolis estava com Bolsonaro no dia da facada

Cinegrafista censurado pela equipe de Tarcísio de Freitas relata que, além do agente da Abin, o policial federal Danilo Campetti também se apresentou como assessor do candidato no dia do tiroteio. Embora licenciado, imagens mostram ele com arma em punho e o distintivo da PF no peito

Jornal da Cultura/YouTube/Reprodução
Jornal da Cultura/YouTube/Reprodução
Por causa da participação na facada em Juiz de Fora (MG), Danilo Campetti (foto) foi condecorado na Alesp e, em seguida, contratado pela Abin na gestão de Alexandre Ramagem, amigo de Bolsonaro

São Paulo – O tiroteio em Paraisópolis, comunidade da zona sul da cidade de São Paulo, no último dia 17, onde foi assassinado Felipe Silva de Lima, de 27 anos, segue cheio de perguntas sem respostas ou explicações convincentes por parte do candidato a governador de São Paulo Tarcísio de Freitas (Republicanos). As imagens do episódio revelam que, além do agente licenciado da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Fabrício Cardoso de Paiva, nomeado pelo governo de Jair Bolsonaro (PL), havia um segundo servidor no momento do tiroteio, o policial federal Danilo Cesar Campetti (Republicanos). 

Campetti se licenciou da PF para concorrer a uma vaga como deputado estadual na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) e acompanhava Tarcísio na visita a um projeto social em Paraisópolis. Mas, apesar de afastado, no momento que começaram os disparos, ele é flagrado com um arma em punho e o distintivo da corporação no pescoço. 

Além disso, em entrevista ao Jornal da Cultura, na quinta-feira (28), o cinegrafista que foi censurado pelo agente da Abin para que apagasse imagens que mostravam os seguranças de Tarcísio atirando no local onde foi morto Felipe, também relatou que Campetti se apresentou como assessor do candidato bolsonarista. A confirmação de que o policial federal estava no momento da ocorrência levantou novas suspeitas sobre o caso que vem sendo cercado contradições. Campetti também estava no dia em que Bolsonaro levou uma facada em Juiz de Fora (MG), durante a campanha de 2018. 

Dois casos, uma única farsa

O atentado em Juiz de Fora foi fundamental para Bolsonaro conseguir se eleger à época. Da mesma forma, Tarcísio e o próprio presidente da República, de quem é aliado, tentaram usar o tiroteio em Paraisópolis para faturar politicamente. Sem quaisquer provas ou respaldo de autoridades do estado, os dois alardearam o fato também no horário eleitoral como um “atentado político”. No mesmo dia, no entanto, a Secretaria de Segurança Pública do estado confirmou que não havia indícios de motivação política. Tarcísio precisou então recuar da versão. 

A presença de Campetti em mais esse caso também rendeu argumentos para aqueles que apontam a facada em Bolsonaro como uma “grande farsa”. “Uma das questões mais obscuras do que aconteceu em Paraisópolis é essa daqui: por que o mesmo policial Danilo Campetti que estava fazendo a segurança de Bolsonaro no dia da facada (e depois virou subcelebridade bolsonarista) estava com o Tarcísio lá em Paraisópolis?”, questionou o cientista político e especialista em Políticas Públicas Leonardo Rossatto. 

Por causa da participação no episódio, o agente da PF foi condecorado na Alesp. Em seguida, ele foi contratado pela Abin na gestão de Alexandre Ramagem, que é amigo de Bolsonaro. Campetti também ficou conhecido nas redes bolsonaristas ao fazer parte da escolta do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que o conduziu ao velório de seu neto, Arthur Lula da Silva, morto em 2019, na época que o petista era um preso político.

Escala de violência bolsonarista

Em nota à TV Cultura, a Abin declarou, porém, que havia apenas um servidor licenciado para trabalhar na campanha de Tarcísio. 

Neste sábado, o adversário do candidato do Republicanos, o ex-ministro e ex-prefeito Fernando Haddad (PT) lembrou do caso para alertar contra a “escalada da violência do bolsonarismo” em São Paulo. Em um vídeo publicado nas redes sociais, Haddad relacionou o tiroteio e o assassinato de Felipe ao ataque armado da deputada federal bolsonarista reeleita Carla Zambelli (PL-SP) contra um homem negro, e o atentando contra a PF de outro aliado de Tarcísio e Bolsonaro, o ex-deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ). 

“Fatos que não são coincidentes, mas sinais que precisam ser lidos pela população diante do risco que o nosso estado esta correndo”, advertiu o petista. “Onde essa escalada autoritária vai acabar? Isso vai acabar muito mal. E nós sabemos que essa doença tem cura e depende de todos nós. (…) Temos que ter a consciência cívica do que fazer em um momento tão grave do nosso querido estado de São Paulo e do nosso país”, pediu o candidato a governador. 

Relação Tarcísio e Zambelli

A perseguição armada de Zambelli também foi comparada à proposta de Tarcísio de acabar com o programa estadual que prevê a instalação de câmeras nas fardas de policiais militares. Assim como a pressão do agente da Abin bolsonarista para que o cinegrafista apagasse imagens de um cenário em que um crime aconteceu. Isso porque a deputada inventou uma agressão para justificar o ataque nesse sábado, também apontado como um crime eleitoral. Uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) veta o uso de armas de fogo nas 48 horas que antecedem e sucedem o segundo turno eleitoral deste domingo. 

“Vocês sabem por que o Tarcísio queria tirar câmeras do PMs e apagar o homicídio ocorrido durante sua campanha, né? Em meia hora, tivemos dois vídeos que desmentiram a versão de Zambelli”, observou o ex-perito criminal Julio Ponce em seu Twitter. 

O jornalista Joaquim de Carvalho, do site Brasil 247, também apontou para uma relação entre os casos. Carvalho entrevistou o pai de Felipe, assassinado no momento da visita de Tarcísio a Paraisópolis, que acusou o candidato do Republicanos de “armação”. “Matou meu filho para ganhar a eleição”, lamentou o pai da vítima. 

No último debate contra Haddad, Tarcísio não condenou a postura do membro de sua equipe. E, nas redes, chegou a chamar Felipe de “criminoso”. O candidato do Republicanos não conseguiu até o momento dar explicações convincentes sobre as suspeitas que cercam essa morte.