Presságio

Caso Roberto Jefferson é ‘spoiler’ do que seria segundo governo Bolsonaro: ‘Violência e sem lei’

Professor de Direito e integrante da ABJD Rogério Dultra dos Santos também critica a negociação da rendição de Roberto Jefferson e aponta “privilégio” ao bolsonarista. “Foi totalmente alheio às regras”

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“Esse fato só demonstra o processo de seleção que o sistema repressivo estabelce. Se fosse um homem negro atirando contra a Polícia Hederal, hoje ele provavelmente estaria morto”, critica o jurista

São Paulo – O processo de negociação da rendição do ex-deputado Roberto Jefferson foi totalmente alheio à doutrina de gestão de crises da Polícia Federal e às regras estabelecidas internacionalmente para a solução de crises como a deflagrada, ontem (23), pelo aliado do presidente Jair Bolsonaro (PL). É o que destaca o professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF) e integrante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), Rogério Dultra dos Santos, em entrevista nesta segunda-feira (24), ao Jornal Brasil Atual

De acordo com o jurista, a falta de isolamento do local do crime, de onde o bolsonarista lançou duas granadas e atirou de fuzil contra agentes da PF, prejudicou a realização da perícia do caso. Santos também chama atenção para o vídeo, divulgado entre policiais federais, que mostra uma conversa amistosa entre o ex-deputado com o agente, identificado como Vinícius Segundo. O policial, que negocia a rendição, chega a rir da resposta de Roberto Jefferson que alegava ter disparado um bomba de efeito moral. 

Vinícius ainda diz ao ex-parlamentar que “o que o senhor precisar  a gente vai fazer”. As imagens mostram que a conversa é acompanhada pelo autodeclarado padre Kelmon (PTB). Ele concorreu à Presidência da República no lugar de Jefferson e fez dobradinha com Bolsonaro nos debates no primeiro turno. “Em negociações de crises você não introduz um sujeito que é alheio às forças policiais num processo de negociação. Então ali não há só contaminação do local do crime, mas o encaminhamento do processo de negociação foi totalmente alheio às regras”, observa o jurista. 

Cordialidade ao acusado

O especialista pondera, contudo, que a PF impediu que a violência escalasse. O que era uma pretensão do aliado de Bolsonaro, que buscava ser transformado em “mártir da liberdade de expressão”, avalia Santos. Roberto Jefferson já havia ferido o delegado Marcelo Vilella e a policial Karina Lino Miranda de Oliveira ao resistir a uma ordem de detenção. A prisão havia sido determinada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) após o ex-deputado descumprir as condições de permanência de sua prisão domiciliar. 

Ele é acusado de tumultuar o processo eleitoral e proferir discursos de ódio, além de atacar instituições democráticas. Por conta das medidas cautelares, Jefferson não poderia se manifestar nas redes sociais ou conceder entrevistas. O que foi desrespeitado diversas vezes. Na mais recente delas, ao atacar a ministra Carmen Lúcia chamando-a “prostituta”, “vagabunda” e “arrombada”. 

Santos ainda acrescenta como ponto alto das críticas o envolvimento do ministro da Justiça, o delegado Anderson Torres, na negociação de rendição, a pedido de Bolsonaro. O presidente chegou a dizer que “o tratamento dispensado a quem atira em policial é bandido”. Mas o vídeo da negociação mostrou a cordialidade do comando da PF com o ex-deputado. 

‘Bolsonaro humilha a PF’

“Foi uma humilhação à Polícia Federal não só essa reação, mas principalmente a atitude do presidente da República de enviar o seu ministro da Justiça para negociar a prisão de um cidadão comum, de um criminoso condenado. Isso rebaixa o Ministério da Justiça. (…) Esse fato só demonstra o processo de seleção que o sistema repressivo estabelece. Se fosse um homem negro atirando contra a Polícia Federal, hoje ele provavelmente estaria morto”, analisa o jurista. 

Ainda de acordo com Santos, essa atentando contra a PF “é um recado inclusive para os policiais de que o objetivo do bolsonarismo não é colocar os policiais em primeira ordem. O objetivo do bolsonarismo é criar um estado de terror. E a polícia também sofre com esse estado de terror porque ninguém fica seguro numa situação como essa, nem mesmo os policiais. (…) Estamos vendo um spoiler do que seria um segundo governo Bolsonaro. Ou seja, um mandato eivado de violência e com objetivo de transformar o Brasil no Afeganistão. (Transformar) em um país sem lei, sem regras, com cidadãos armados, radicalizados por um discurso de ódio”, diz o professor. 

“Esse é o futuro distópico que o Bolsonaro apresenta através de seu agente, seu coordenador de campanha informal, Roberto Jefferson, que é condenado e foi preso em flagrante preso por tentativa de homicídio”, concluiu o integrante da ABJD. 

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