Exposição perigosa

Campanha cobra fim do uso do mercúrio em restaurações dentárias no Brasil

Coalizão destaca pesquisa recente que aponta que grávidas com pelo menos uma restauração excretavam diariamente pela urina partículas do metal em limite acima do nível seguro. Anvisa estuda proibição a gestantes, lactantes e menores de 15 anos

Michael Ottenbruch/Wikimedia Commons
Michael Ottenbruch/Wikimedia Commons

São Paulo – A Campanha Odontologia Livre de Mercúrio voltou a cobrar medidas para o fim do uso do metal tóxico em restaurações dentárias no Brasil para gestantes, lactantes, crianças e adolescentes. “No pleno exercício de nossa cidadania, devemos exigir a efetivação da Emenda das Crianças da Convenção de Minamata, para que esse público não receba amálgama em suas restaurações dentárias, garantindo a proteção à vida humana em formação e desenvolvimento”, pediram integrantes da Aliança Mundial para a Odontologia Livre de Mercúrio no Brasil por meio de redes sociais.

A Convenção de Minamata à qual se referem é um acordo global para conter o uso da substância. Teve origem na tragédia causada na cidade japonesa de mesmo nome por uma indústria que usava mercúrio para fabricar PVC. Os resíduos do metal contaminaram peixes, mataram perto de mil pessoas e deixaram graves sequelas em outras 5 mil. Isso foi na metade do século passado e o caso, que certamente deixou consequências que ainda persistem, é considerado um dos maiores desastres ambientais.

Após várias rodadas de negociação, mais de 140 países assinaram a Convenção de Minamata em 2013, no âmbito do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). A promulgação no Brasil foi em agosto de 2018, com metas para eliminação das lâmpadas, cumpridas a partir de 2020. Já quanto às amálgamas dentárias, foi estabelecida a necessidade de medidas para sua substituição, mas não o prazo.

Malefícios da restauração à saúde

Enquanto isso os movimentos seguem alertas, pressionando, porque estudos comprovam os malefícios do metal tóxico na restauração dentária à saúde. Desta vez, a manifestação do movimentos dos odontologistas foi motivada pela divulgação recente de uma pesquisa que endossa a necessidade de medidas urgentes. Publicado no jornal Human & Experimental Toxicology, um estudo analisou dados de mulheres grávidas nos Estados Unidos no período de 2015 a 2020. E concluiu que cerca de 600 mil que tinham pelo menos uma superfície de amálgama excretavam diariamente pela urina partículas do metal em quantidades acima do limite seguro estabelecido pela Agência de Proteção Ambiental daquele país.

Ou seja, vapores do metal são inalados e entram na corrente sanguínea, entrando em contato com o feto. “Dado o potencial para efeitos toxicológicos fetais decorrentes da exposição pré-natal ao vapor de mercúrio, é necessário dar ênfase especial à redução e eliminação de amálgamas em mulheres na idade reprodutiva”, destacam os autores da pesquisa.

Em março a Anvisa deu início a um processo regulatório para tratar da restrição do uso de amálgama dentário em gestantes, lactantes e menores de 15 anos. A agência considera a promulgação da Convenção de Minamata no país. E também as características do mercúrio, classificado como uma substância perigosa, principalmente devido a sua toxicidade, à sua capacidade de bioacumulação, e à sua característica poluente persistente.

Anvisa estuda proibir restaurações com mercúrio

Em seu voto favorável à abertura, o diretor Daniel Meirelles Fernandes Pereira destaca “que nos termos da Convenção, os países reconheceram se tratar de uma substância química que causa preocupação global devido à sua propagação atmosférica de longa distância e sua persistência no meio ambiente”.

E que “a exposição humana ao mercúrio caracteriza risco à saúde e pode estar relacionada a prejuízos no desenvolvimento de fetos e crianças, além de danos ao sistema nervoso central, à tireoide, aos rins, aos pulmões, aos olhos, à pele e aos sistemas imunológico, hematológico e cardiovascular”, escreveu o diretor.

No voto, lembrou ainda os terríveis efeitos sobre a população de Minamata, entre 1932 e 1968. “Os sintomas dessa doença incluem ataxia, entorpecimento das mãos e pés, fraqueza muscular generalizada, estreitamento do campo de visão, danos à audição, à fala e, em casos extremos, insanidade mental, paralisia, coma e óbito (Plano Setorial de implementação da Convenção de Minamata Sobre mercúrio)”.

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