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Planos de saúde irão pressionar Bolsonaro a vetar PL que amplia cobertura

Após a aprovação do PL que acaba com o rol taxativo, empresas do setor não descartam o veto, o que não interessa a Bolsonaro às vésperas da eleição. E consideram buscar aval do Supremo Tribunal Federal para continuar negando exames, terapias e cirurgias

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Planos de saúde falam em perdas, mas restrições de cobertura resvalam no SUS, que pagou 93% dos testes para covid-19

São Paulo – Após o Senado aprovar nessa segunda-feira (29) o Projeto de Lei que põe fim ao caráter taxativo do rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), as empresas de planos de saúde prometem pressionar o presidente Jair Bolsonaro (PL) a vetar. Mas admitem também ir à Justiça em busca de aval para manter a cobertura reduzida.

Os senadores apoiaram, unânimes, e sem fazer mudanças, o PL 2.033/2022, de autoria de um grupo de trabalho formado por deputados de diversos partidos. Aprovado na Câmara no último dia 3, a proposta estabelece que os planos devem garantir a cobertura de exames, tratamentos e procedimentos prescritos por médicos e odontólogos independentemente de estarem no rol da ANS. Basta ser reconhecido pela Anvisa ou outras agências internacionais equivalentes.

Apenas os deputados do Novo votaram contra. Em defesa dos interesses dessas empresas, alegaram o aumento de custos, que será repassado aos consumidores. Mas tanto não é bem assim que, bem antes, em 26 de maio, com apoio do governo de Jair Bolsonaro, a ANS autorizou aumento de até 15,5% nas mensalidades dos planos de saúde individuais e familiares. Um aumento recorde na história da agência reguladora que pode ultrapassar 40% conforme a faixa etária.

Planos de saúde argumentam riscos à segurança dos pacientes

Em reação à decisão do Senado, a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) afirmou, por meio de nota, que a mudança trará sérios riscos à segurança dos pacientes e que o setor enfrenta risco de “colapso sistêmico”. Para o presidente da entidade, Renato Casarotti, o projeto foi aprovado no momento em que o setor registra o pior primeiro trimestre da história, com prejuízo de mais de R$ 1 bilhão, mais do que as perdas apuradas em todo o ano passado.

Para ele, o impacto pode não ser imediato, mas terá reflexo nos tribunais. E isso pode exigir repasse na ponta. “Cabe discutir se vale recurso no Judiciário, apresentar de forma republicana nosso ponto ao governo, antes da sanção. Da forma como ficou o texto, sem critérios cumulativos para liberação de procedimentos, deixa uma abertura muito grande ao que pode vir a ser coberto, inclusive sem garantir a segurança do consumidor.”

A FenaSaúde, federação que reúne as maiores operadoras do setor, também se manifestou. E nas entrelinhas traz a dificuldade de convencer Jair Bolsonaro a vetar um PL que, para agradar os planos de saúde, representa a perda de votos. “Sancionada a lei, veremos se cabe uma ação direta de inconstitucionalidade. É lamentável o que está acontecendo, mostra falta de entendimento do funcionamento do setor. A coincidência com o momento eleitoral levou a uma decisão populista. Só estão esquecendo de avisar a sociedade que não é a operadora que vai pagar a conta. É o próprio consumidor. A operadora só administra os recursos, e essa decisão vai refletir em aumento de mensalidade”, disse a diretora-executiva da entidade, Vera Valente.

Impactos sobre o SUS

“Começou o ataque das operadoras via ‘editoriais’. 20 anos de rol exemplificativo e pessoas acionando a Justiça para garantir seu direito à saúde. Vem o STJ em junho e acaba com esse direito. A lei só devolveu. Simples assim”, comentou a jornalista e ativista Andréa Werner em suas redes sociais sobre as reclamações do empresariado.

Comentário nesse sentido fez a representante do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumdor (Idec) no Conselho Nacional de Saúde, Ana Navarrete, que considera o fim do rol taxativo uma grande vitória e alívio para o SUS. “Há um impacto claro e evidente para o SUS. O mercado privado e o SUS atuam em paralelo como vasos comunicantes, então, consequentemente, restrições de cobertura resvalam no sistema público. Portas que se fecham no âmbito da saúde privada acabam gerando consequências na saúde pública. A gente viu isso com testes sorológicos para a covid-19 durante a pandemia: só 7% de todos os exames realizados foram feitos pelos planos de saúde”, disse ao portal Metrópoles.

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) comemorou a aprovação, levando em consideração o poder do lobby dos planos de Saúde, o maior segundo ele. “O lobby dos planos de saúde é o mais poderoso do Congresso Nacional. Ele captura as agências que deveriam ter a responsabilidade de regulá-lo, como é o caso da ANS. Eu imagino as pressões que (o senador Romário) deve ter sofrido. A ganância deles não pode ser maior do que a vida”, disse, referindo-se à pressão que teria sofrido o relator, o senador Romário (PL-RJ).


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