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Ato pelo fim das internações em manicômios reúne 3 mil na Paulista

Manifestantes protocolaram carta ao governador exigindo o fim da transferência de dinheiro público para clínicas de reabilitação para pessoas com dependência química, como ocorre hoje no estado

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Há 28 anos, quando movimento foi iniciado, país tinha 100 mil leitos para interdição psiquiátrica

São Paulo – Pelo menos 3 mil pessoas, entre profissionais da saúde mental, pacientes e familiares, realizaram hoje (18), Dia Nacional de Luta Antimanicomial, um ato na Avenida Paulista para reivindicar o fim do encarceramento de pacientes nos chamados manicômios. O país ainda tem 32 mil leitos de internação psiquiátrica, a maioria concentrada no estado de São Paulo – 12 mil, ao todo.

Os manifestantes se reuniram no vão livre do Masp às 12h e realizaram uma série de oficinas artísticas com os usuários dos serviços públicos de saúde mental, aos moldes do que é feito nos Centros de Atenção Psicossocial (Caps). Eles participaram de rodas de maracatu e produziram cartazes com dizeres “Por uma sociedade sem manicômios”, “Trancar não é tratar”, “Contra toda forma de prisão” e “É muito louco ser doido”.

“As pessoas devem ser tratadas em liberdade, rompendo com a ideia de que a loucura é perigosa. Para isso necessitamos de mais investimento público em uma rede para atendê-los, integrando Unidades Básicas de Saúde (UBS), Caps e hospitais para as crises, mas não para internações nem para a administração de medicamentos que inibam os sentimentos das pessoas”, afirma o psicólogo Tiago Ribeiro, participante do movimento.

Em marcha, os manifestantes caminharam até a sede da Secretaria Estadual da Saúde, no bairro de Cerqueira César, e protocolaram uma carta ao governador, Geraldo Alckmin, e ao secretário de Saúde, David Uip, com uma série de reivindicações. Entre elas, está o fim da privatização dos serviços de saúde mental – que tem grande presença de organizações sociais privadas contratadas pelo poder público –, o fim da internação involuntária e a proibição do uso de eletrochoques nos hospitais psiquiátricos que ainda não foram desmontados.

O movimento também reivindica o fim da transferência de dinheiro público para as chamadas comunidades terapêuticas, popularmente conhecidas como clínicas de reabilitação para pessoas com dependência química, como ocorre atualmente em São Paulo: a política do governo Alckmin, chamada “Recomeço”, transfere recursos públicos para comunidades terapêuticas, o que motiva o surgimento de novos leitos psiquiátricos.

“São instituições fora das políticas públicas, ligadas geralmente a movimentos religiosos que se aproveitam de uma falha na saúde pública e da fragilidade das famílias. Elas se propõem a abstinência, que pode ser uma possibilidade, mas que não necessariamente é a mais eficaz”, afirma o presidente do Sindicato dos Psicólogos do Estado de São Paulo, Rogério Giannini.

Histórico

Quando militantes da área de saúde mental iniciaram o movimento exigindo o fechamento dos manicômios, há 28 anos, o país tinha 100 mil leitos para interdição psiquiátrica, que colecionam histórias de violações aos direitos humanos. Em 2001, foi aprovada a lei federal da reforma psiquiátrica (10.216) que reformulou o modelo de atenção, transferindo o tratamento dos hospitais para uma rede estruturada de serviços comunitários.

Atualmente, o acompanhamento é feito no Caps mais próximo da residência do paciente. Lá eles recebem tratamento para os sintomas com equipes de psiquiatras e psicólogos, fazem atividades de socialização, como oficinas de artesanato e grupo de mulheres, e atividade de integração ao mundo do trabalho. As famílias também participam de grupos de discussão.

“O Caps é tudo para mim. Lá as portas estão sempre abertas, inclusive para eu sair para frequentar os lugares que gosto. Minha vida melhorou 100% desde que eu cheguei lá. Antes era só internação atrás de internação”, conta o paciente Leandro de Lima, de 34 anos, enquanto exibe, orgulhoso, sua fantasia de rei do maracatu de uma unidade do Caps em Mauá, na região do ABC paulista.