direito das mulheres

Fachin manda governo Bolsonaro explicar cartilha que restringe aborto legal

MInistro citou “padrão de violação sistemática do direito das mulheres”, após despacho em ação que pede suspensão de manual do Ministério da Saúde

Divulgação/Fiocruz
Divulgação/Fiocruz
No Brasil, aborto não é crime em casos de estupro, risco de vida à mãe e fetos anencefálicos

São Paulo – O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu prazo de cinco dias para a Presidência e o Ministério da Saúde explicarem as políticas públicas que restringem o aborto legal no país. O despacho do ministro decorre de uma ação apresentada por quatro entidades de saúde. Elas pedem a suspensão de um manual do ministério que orienta e incentiva a investigação policial de meninas e mulheres vítimas de estupro que tentam acessar o serviço de aborto legal no país. O material também indica limite de 22 semanas de gestação para a realização da interrupção da gravidez. E diz, ainda, não existir “aborto ‘legal”, contrariando a legislação vigente.

Assinam a ação a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), o Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), a Sociedade Brasileira de Bioética (SBB) e a Rede Unida. A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) foi protocolada nesta quinta-feira (30).

Nela, as entidades afirmam que a cartilha do governo “cria entrave que a lei não institui e nem o autoriza a instituir”. “Essa ação é para cumprir a lei que está sendo desrespeitada. Não é para ampliar o aborto, não há nenhuma polêmica. Só a polêmica criada pelo próprio Ministério da Saúde”, diz o texto.

Para o ministro, o quadro narrado pelas requerentes é “bastante grave”, e apontam para “um padrão de violação sistemática do direito das mulheres”. “Se nem mesmo as ações que são autorizadas por lei contam com o apoio e acolhimento por parte do Estado, é difícil imaginar que a longa história de desigualdade entre homens e mulheres possa um dia ser mitigada”, afirmou Fachin.

No Brasil, o procedimento não é considerado crime em três situações: estupro, risco de vida à mãe e em casos de anencefalia (quando o feto tem malformação cerebral).

Ataque às mulheres

Na última terça-feira (28), a Saúde realizou audiência pública para discutir a dita cartilha. Intitulada “Atenção Técnica para Prevenção, Avaliação e Conduta nos Casos de Abortamento”, foi lançado em 7 de junho. O evento foi comandado pelo secretário de Atenção Primária à Saúde, Raphael Câmara. E contou com a participação da deputada federal Bia Kicis (PL-DF), da deputada estadual Janaína Paschoal (PRTB-SP) e do senador Eduardo Girão (Podemos-CE), entre outros.

Na audiência, eles voltaram a atacar a menina de 11 anos, vítima de estupro, que realizou aborto legal na semana passada em Santa Catarina. Girão chegou a apresentar um boneco de um feto réplica de um feto, para supostamente simbolizar o tamanho alcançado aos sete meses de gestação, tempo de gravidez da menina. Disse, ainda, que o “estuprador, entre aspas, era um menino de 13 anos de idade”. No entanto, a lei estabelece como estupro de vulnerável qualquer contato sexual envolvendo menores de 14 anos. Bia Kicis também negou que o caso da menina pudesse ser objeto de aborto legal.

Sem ter sido convidada, a deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP) reagiu, “para dizer verdades que estão entaladas na garganta das mulheres brasileiras”. “Acontece um estupro a cada 10 minutos em nosso país, crimes que contam com conivência e autorização desse governo, que não financia políticas de enfrentamento à violência contra as mulheres, mas promove eventos misóginos como esse.”

“Aqui se promove a investigação das estupradas. Queria saber por que o governo não gasta essa energia para ir atrás dos estupradores? 70% das mulheres estupradas no Brasil têm menos de 18 anos. Por isso, a nossa exigência, e vamos até o fim, é para que seja imediatamente revogado esse documento”, completou Sâmia.

#CuidemDeNossasMeninas

Desde a véspera da audiência, grupos que defendem os direitos reprodutivos das mulheres se mobilizaram na internet pela revogação da cartilha. A campanha #CuidemDeNossasMeninas reuniu milhares de manifestações contra as investidas do governo para restringir o aborto legal no país.

Além disso, a Comissão Arns de direitos humanos afirmou, em nota, que a cartilha do ministério contém falsidades que trazem riscos às mulheres. Anteriormente, outras 78 entidades também divulgaram manifesto apontando “equívocos e ilegalidades” no documento do ministério, exigindo também a sua revogação.

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