Votação de projeto sobre a capitalização da Petrobras é adiada

Oposição, ciente de que não terá força para barrar ação do governo, tenta ao menos estipular valores fixos para a medida, que pode resultar em um aporte de US$ 50 bilhões

Os deputados que compõem a comissão especial da Câmara encarregada de analisar o Projeto de Lei sobre a capitalização da Petrobras decidiram adiar para o dia 10 de novembro (terça) a votação do texto apresentado pelo relator João Maia (PP-RN). Inicialmente prevista para esta quarta-feira (4), a votação do PL 5941/09 foi adiada por três sessões a pedido do líder da bancada do PR, deputado Sandro Mabel (GO).

Ofuscada pela intensa batalha política travada nos últimos dias em torno da futura divisão dos royalties e demais recursos financeiros provenientes da exploração do pré-sal, a discussão sobre a capitalização da Petrobras também tem pontos polêmicos. O PL enviado pelo governo determina a emissão de títulos públicos para reforçar o caixa da empresa no valor equivalente ao preço de cinco bilhões de barris de petróleo a serem retirados do pré-sal. Estabelece também que o governo pode ceder à Petrobras, sem licitação, áreas contíguas aos blocos já operados pela empresa.

O texto que o relator submete à apreciação da comissão especial tem praticamente o mesmo conteúdo do documento original enviado pelo governo ao Congresso. Além de fortalecer a Petrobras, o Projeto de Lei procura aumentar o controle acionário da União sobre a empresa, o que atenderia parcialmente a reivindicações de organizações ligadas aos movimentos sociais como a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Federação Única dos Petroleiros (FUP), entre outras, além de setores do próprio governo.

Com o novo aporte de capital, estimado em US$ 50 bilhões de acordo com os valores atuais do petróleo, a União, que atualmente detém 32% do capital social da Petrobras, poderá chegar a ter o controle de 49% desse capital. Já detentora da maioria das ações nominais (com direito a voto) da empresa, a União, com a capitalização da Petrobras, passaria a ter um controle primordial sobre o ritmo de exploração e comercialização do petróleo e do gás provenientes do pré-sal. Os acionistas minoritários da Petrobras, segundo o projeto, poderão aportar capital na mesma proporção que detêm atualmente.

A concessão para que a Petrobras possa utilizar essa reserva de cinco bilhões de barris para se capitalizar, prevista no projeto de lei, incomoda a oposição. Cientes de que não terão força para barrar a capitalização no voto, parlamentares de PSDB, PPS e DEM defendem que ao menos seja estipulado um valor em dinheiro para o negócio. Ao que tudo indica, no entanto, o relatório de Maia deverá ser aprovado na íntegra pela comissão, para felicidade do governo: “O teor principal do projeto está mantido”, resumiu o ministro da Articulação Política, Alexandre Padilha.

Acionistas e FGTS

A Petrobras, por sua vez, assegura aos acionistas e investidores que a capitalização da empresa se dará em respeito ao bom senso e à lógica do mercado: “O preço do barril [a ser estipulado] para a capitalização será justo”, tem repetido por onde passa o presidente da empresa, José Sérgio Gabrielli. Segundo a Petrobras, as reservas brasileiras confirmadas deverão nos próximos três anos saltar dos atuais 14 bilhões de barris por ano para 35 bilhões de barris. O preço exato do barril de petróleo a ser utilizado no processo de capitalização, segundo a direção da empresa, será determinado por fatores como a curva de produção, a localização do poço e o valor do barril no mercado futuro, entre outros.

A expectativa da Petrobras é que, uma vez aprovado o projeto na Câmara e no Senado, se possa realizar a capitalização no menor prazo possível: “Estamos deixando tudo estruturado. É possível que se inicie a primeira fase da capitalização em até três meses”, disse o gerente de Relação com Investidores da Petrobras, Alexandre Fernandes, em evento realizado na segunda-feira (2) em Curitiba.

Outro ponto polêmico do PL 5941/09 é a proibição da aquisição de novas cotas da Petrobras através de recursos provenientes do FGTS pelos trabalhadores que já adquiriram ações dessa forma anteriormente. Segundo a proposta do governo, mantida pelo relator do projeto, os trabalhadores que já são cotistas somente poderão participar da capitalização da Petrobras se utilizarem dinheiro: “Prevaleceu o princípio de que os recursos do FGTS devam ser destinados a projetos de habitação e saneamento”, diz João Maia.

O PL enviado pelo governo determina ainda que o pagamento de Participações Especiais aos estados produtores não incidirá sobre os cinco bilhões de barris a serem utilizados na capitalização da Petrobras. Em vigor no atual regime de concessão, as PEs beneficiam, sobretudo, os estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, que já manifestaram seu desagrado com a decisão do governo federal: “O Rio poderá perder um bilhão de reais com a capitalização”, estima o secretário estadual de Desenvolvimento Econômico, Júlio Bueno.

Líder do governo na Câmara, o deputado Henrique Fontana (PT-RS) não espera nenhum susto na aprovação do PL 5941/09: “Acredito que consigamos votar o Projeto de Lei sobre a capitalização da Petrobras na terça que vem. O governo não vislumbra alterações significativas no texto original. O relator está muito firme e o pedido de vista feito pela liderança do PR é normal e faz parte das inter-ocorrências da Câmara.”

Apesar dos adiamentos das votações sobre a capitalização da Petrobras e a divisão dos royalties, o governo, segundo Fontana, “vê com otimismo” a tramitação dos quatro projetos relativos ao pré-sal no Congresso: “Está sendo mantida a estrutura do novo marco regulatório para a exploração de petróleo no Brasil. Para o governo, é muito saudável que as maiores discussões estejam concentradas na questão dos royalties”, diz o deputado.

Movimentação

Mesmo antes da aprovação da capitalização da Petrobras pelo Congresso, setores do poder público já se movimentam para iniciar o quanto antes a busca pelos cinco bilhões de barris de petróleo com os quais a empresa “pagará” ao governo pelo direito de explorar o pré-sal. Com o início das operações previsto para quinta-feira (5), a Agência Nacional de Petróleo (ANP) vai perfurar os blocos vizinhos aos campos de Tupi e Iara, já em exploração pela Petrobras. O objetivo da ANP é determinar quais desses novos blocos localizados no pré-sal têm comunicação com Tupi e Iara e, dessa forma, podem ser unitizados (integrados) pela Petrobras.

Quem também já se movimenta para o processo de capitalização da Petrobras mesmo antes da aprovação do Projeto de Lei é o Banco Central. Como a capitalização da empresa será feita em dólares, o mercado está preparado para uma valorização repentina do real face à moeda norte-americana assim que a operação for oficialmente anunciada. A intenção do BC é evitar que o processo de capitalização acarrete desequilíbrios cambiais ao Brasil.