Relatório da ONU aponta Bolsonaro como responsável pelos ataques à democracia brasileira
Desmonte promovido pelo ex-presidente, ameaças à democracia e ataques ao sistema eleitoral foram centrais no documento elaborado por relator da ONU. Para observadores, informe representa um verdadeiro “indiciamento” do governo anterior
Publicado 20/06/2023 - 16h27
São Paulo – O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) é acusado pelo relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) de ter relação direta com o enfraquecimento da democracia brasileira. No documento de 18 páginas, o desmonte da estrutura de participação social na definição de políticas públicas, o ataque às instituições do país, a disseminação de fake news sobre o sistema eleitoral e a defesa da ditadura são apenas algumas das políticas implementadas por Bolsonaro, e mencionadas pela entidade, que justificam a acusação. As informações são da coluna do jornalista Jamil Chade do UOL.
O informe sobre Bolsonaro foi preparado pelo relator especial da ONU sobre direitos à reunião pacífica e liberdade de associação, Clément Nyaletsossi Voule. Ele denuncia pela primeira vez, de forma explícita, o ex-presidente e será ainda debatido no Conselho de Direitos Humanos da ONU. E marca também a semana em que Bolsonaro será julgado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
De acordo com o correspondente internacional, em entrevista à edição desta terça-feira (20) do ICL Notícias, transmitido pela TVT e a Rádio Brasil Atual, o documento da ONU não implica qualquer tipo de sanção internacional contra Bolsonaro. Mas amplia a pressão internacional e o constrangimento sobre ele, além de servir para em embasar futuras ações no Judiciário brasileiro.
Retrocesso significativo com Bolsonaro
Ainda segundo informações de Jamil Chade, o relator da ONU esteve no país no primeiro semestre de 2022 e realizou visitas a diferentes cidades, onde constatou a crise democrática. No relatório, Voule pondera, por exemplo, que a transição do Brasil do regime ditatorial para a democracia foi formalizada pela Constituição de 1988. Ele lembra que a Carta Magna garantiu o direito à liberdade de expressão, associação e reunião.
Mas adverte que essas garantias constitucionais foram “afetadas negativamente nos últimos anos como resultado da proliferação de leis e decretos adotados pelas autoridades brasileiras em uma tentativa de minar esses direitos. Tais leis e decretos enfraqueceram a democracia do país e a participação da sociedade civil e das comunidades marginalizadas nos assuntos públicos”, destaca o informe.
A avaliação é que, com Bolsonaro, a democracia experimentou “um nível significativo de retrocesso”. Marcado “por um aumento dos valores liberais, da violência política e dos ataques às instituições democráticas”. Voule expressa preocupação principalmente com o fato de, antes das eleições, o então presidente da República ter promovido uma campanha de ataques contínuos contra instituições democráticas, o judiciário e o sistema eleitoral no Brasil, incluindo o sistema eleitoral eletrônico”.
Indiciamento internacional
O relator acrescenta que as eleições de outubro de 2022 “aumentaram essa crise democrática”. “Nesse contexto, o Relator Especial observou com preocupação o aumento dos incidentes de discurso de ódio e violência política”, destacou. Para o Alto Comissariado da ONU, essa violência e o questionamento da eleição, sem provas, foi um ponto marcante do ataque à democracia no dia 8 de janeiro.
O documento também cita a flexibilização do acesso a armas e munições no país como um meio de escalada da violência. E também contesta a resposta de Bolsonaro à pandemia de covid-19, que criticou o distanciamento social e outras medidas de proteção e atacou especialistas e instituições científicas.
“Em um país onde quase 700.000 pessoas morreram de covid-19, a resposta do governo não apenas colocou em risco a vida de milhões de pessoas, mas também aprofundou a polarização e a desconfiança no governo”, apontou Voule. De acordo com Jamil Chade, para observadores internacionais, o relatório da ONU representa ainda um verdadeiro indiciamento de seu governo.