Condutas abusivas

MPF pede cassação da concessões da Jovem Pan

Para procuradores, emissora participou de “campanhas de desinformação” que atentaram contra o regime democrático, e pedem indenização de R$ 13,4 milhões por danos morais coletivos

Divulgação
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MPF afirma que a Jovem Pan contribuiu inclusive para estimular a tentativa de golpe em 8 de janeiro

São Paulo – O Ministério Público Federal (MPF) entrou nesta segunda-feira (26) com uma ação civil pública pedindo o cancelamento das três outorgas de radiodifusão concedidas à Jovem Pan. O requerimento se deve ao alinhamento da emissora a “campanhas de desinformação”, com veiculação sistemática de conteúdos que atentaram contra o regime democrático. Além do cancelamento das outorgas, o MPF pede que a Jovem Pan pague uma indenização de R$ 13,4 milhões por danos morais coletivos.

Os procuradores também querem que a Justiça obrigue a emissora a veicular, ao menos 15 vezes por dia, durante quatro meses, mensagens com informações oficiais sobre a confiabilidade do processo eleitoral.

Em nota, o MPF justifica a severidade das medidas pela gravidade da conduta da emissora. Alegam que a Jovem Pan “disseminou reiteradamente conteúdos que desacreditaram, sem provas, o processo eleitoral de 2022”. Além disso, “atacaram autoridades e instituições da República, incitaram a desobediência a leis e decisões judiciais”. Da mesma forma, “defenderam a intervenção das Forças Armadas sobre os Poderes civis constituídos e incentivaram a população a subverter a ordem política e social”.

Nesse sentido, os procuradores afirmam que a emissora contribuiu para que “enorme número de pessoas” duvidasse da idoneidade do processo eleitoral e tomasse “ações diretas” contra o resultado das urnas. Citam, por exemplo, os bloqueios nas rodovias após o resultado do segundo turno, bem como a tentativa de golpe em 8 de janeiro, quando bolsonaristas invadiram e depredaram as sedes dos três poderes.

Linha editorial golpista

O MPF conduziu uma análise detalhada do conteúdo transmitido pela Jovem Pan entre janeiro de 2022 e janeiro de 2023. A investigação teve foco em programas específicos, como “Os Pingos nos Is“, “3 em 1“, “Morning Show” e “Linha de Frente“. Assim, o levantamento revelou uma série de discursos que ultrapassaram os limites da liberdade de expressão e configuraram manifestações ilícitas. Mais de 20 comentaristas foram identificados como defensores das mesmas teses, alinhadas à linha editorial da emissora.

Desde os primeiros meses de 2022, os comentaristas da Jovem Pan afirmavam repetidamente que as urnas eletrônicas não eram seguras. Do mesmo modo, sustentavam a ideia de impossibilidade de auditagem dos aparelhos, além de alegar um conluio entre autoridades para manipular os resultados das eleições. Essas afirmações eram infundadas, pois as urnas eletrônicas são submetidas a testes e auditorias que nunca indicaram brechas para fraudes.

Os comentaristas também direcionaram ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), inclusive contra seus ministros. Chegaram a utilizar inclusive termos como “entrave” e “câncer” para caracterizar as cortes. Eles defendiam frequentemente que o Senado abrisse processo de impeachment contra os membros do STF, especialmente Alexandre de Moraes. Além disso, incitaram a desobediência às ordens judiciais e propuseram uma intervenção militar para “restabelecer a ordem”, elogiando a ditadura militar e defendendo atos violentos.

A ação do MPF destaca que as manifestações da emissora procuravam legitimar atos de grupos radicalizados, que pediam intervenção militar. Nesse sentido, propunham uma “guerra civil” como alternativa ao suposto impasse institucional. Em 8 de janeiro, a cobertura da Jovem Pan tratou com normalidade a chegada dos bolsonaristas e elogiou o ato até que os ataques começaram. A partir daí, o discurso dos comentaristas se tornou mais moderado, mas ainda tentando legitimar as ações golpistas.

Inconstitucional e ilegal

Assim, para o MPF, a Jovem Pan praticou atos ilegais e abusou de seu serviço público. A ação se baseia na Constituição Federal e em legislação específica que estabelecem limites para o conteúdo veiculado pela radiodifusão, visando preservar os interesses da coletividade. Assim, as normas legais estabelecem que as empresas de radiodifusão devem dar preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, respeitando os valores éticos e sociais da pessoa e os direitos fundamentais dos cidadãos.

O MPF alega que a Jovem Pan cometeu diversas condutas abusivas, como incentivar a desobediência, veicular notícias falsas que colocam em perigo a ordem pública, econômica e social, e incitar a rebeldia ou indisciplina nas Forças Armadas. Todas essas condutas podem levar ao cancelamento das outorgas de radiodifusão, de acordo com a legislação.

Além do cancelamento das outorgas, o MPF também solicita que a União seja responsável por fornecer e fiscalizar a inserção de informações oficiais sobre o processo eleitoral na emissora. O MPF busca que a Justiça Federal estabeleça o dever da União de inspecionar e, se necessário, punir outras detentoras de outorga de radiodifusão que transmitam conteúdos produzidos pela Jovem Pan.

Para preservar as provas, o MPF requer que a emissora seja proibida de apagar conteúdos de seu canal no YouTube. Em relação ao Google, o MPF solicita que a empresa disponibilize um link em nuvem contendo todos os vídeos publicados pela Jovem Pan na plataforma.

Recomendações

Por fim, o MPF recomenda à Controladoria-Geral da União (CGU) a instauração de processo administrativo que pode impedir a Jovem Pan de celebrar contratos com a Administração Pública federal. Como base, citam um parecer vinculante aprovado pela Advocacia-Geral da União (AGU) logo após os ataques de 8 de janeiro. De acordo com a norma, empresas envolvidas em atos antidemocráticos devem ser consideradas inidôneas para contratar com o governo.