Ligações suspeitas

Violência sexual, fraude dos kits de robótica, nepotismo: entenda as denúncias contra Arthur Lira

Escândalo revela que o assessor mais próximo do presidente da Câmara e o sócio da empresa que forneceu kits de robótica, investigados pelo PF por suspeita de desvios de recursos da Educação, estiveram juntos no MEC no governo Bolsonaro

Billy Boss/Câmara dos Deputados
Billy Boss/Câmara dos Deputados
De acordo com jurista, apenas a Procuradoria-Geral da República (PGR) tem competência para investigar o presidente da Câmara

São Paulo – O assessor mais próximo do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o sócio da empresa Megalic, fornecedora de kits de robótica a prefeituras alagoanas, estiveram juntos na sede do Fundo Nacional de Desenvolvimento à Educação (FNDE), órgão do Ministério da Educação (MEC) responsável pela liberação do dinheiro que abasteceu as compras desses equipamentos e que são investigadas agora pela Polícia Federal por suspeita de desvios.

De acordo com informações da Folha de S. Paulo, que trouxe à tona a relação, Luciano Cavalcante, uma das pessoas de maior confiança de Lira, e Edmundo Catunda, sócio da empresa, foram recebidos na manhã de 3 de fevereiro de 2021. Naquele dia, dados oficiais obtidos pelo jornal mostram que Cavalcante deu entrada no prédio, em Brasília, às 8h11. Na sequência, às 8h15, Catunda entrou na sede. Ao todo, o empresário, cuja família tem relação com Lira, esteve 29 vezes no FNDE, do início de fevereiro de 2021 a 24 de março de 2022, na época sob o comando do ministro Milton Ribeiro no governo de Jair Bolsonaro (PL).

Parte das visitas, mostra a Folha, coincidem tanto com a liberação de recursos para os kits de robótica quanto para encontros com Lira. Em abril do ano passado também foi identificado que o governo Bolsonaro havia destinado R$ 26 milhões para sete cidades em Alagoas – estado natal de Lira – comprarem kits de robótica, apesar de sofrerem graves deficiências de infraestrutura. A gestão bolsonarista atuava ainda para acelerar os repasses de recursos da Educação para a compra.

Kits de robótica

Na época, reportagem da Agência Pública também mostrou que a Megalic foi uma das empresas que teve contratos fechados com a Educação com base na verba do chamado orçamento secreto. A empresa, porém, não fabricada os equipamentos. E sim trabalhava como intermediária e revendia os robôs para as prefeituras por R$ 14 mil. Um valor 420% superior ao pago por eles. O caso passou a ser investigado pela Polícia Federal. No início de junho, tanto o assessor mais próximo de Lira como o sócio da empresa foram alvo de operação da PF.

Com Cavalcante, os policiais ainda encontraram documentos com citações a Lira e uma lista de pagamentos atrelado ao nome “Arthur”. O documento, revelado pela revista Piauí neste domingo (25), lista R$ 843 mil em valores pagos de 2022 e 2023. Desse total, ao menos R$ 650 mil tem à frente do valor o nome “Arthur”.

Cabidão na CBTU

Essa não é, contudo, a única polêmica recente envolvendo o nome do presidente da Câmara. Lira também é acusado de empregar ao menos 10 familiares e aliados em postos-chave da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU). As informações são do jornal O Estado de S. Paulo. A empresa pública dispõe de um orçamento bilionário. Mensalmente, o grupo ligado a​​o deputado recebe, ao todo, R$ 128 mil em salário.

Chamada de “estatal de Lira”, o presidente da Câmara controla os principais cargos da companhia. E também empregou na superintendência do órgão, em Maceió, Carlos Jorge Ferreira Cavalcante. O comandante da CBTU alagoana é irmão do principal assessor de Lira, investigado pela PF. Luciano Cavalcante acabou sendo exonerado após a Polícia Federal revelar que ele deu “apoio operacional” a entregadores de dinheiro que seriam participantes do esquema de desvio na capital alagoana.

Filhos com contratos milionários

Os nomes de Lira e Cavalcante também estão relacionados com a notícia de que seus filhos Arthur Lira Filho e Maria Luiza Cavalcante faturaram em contrato de publicidade com o Ministério da Saúde, no governo Bolsonaro, cerca de R$ 34 milhões. Com apenas 23 e 25 anos, respectivamente, eles abriram juntos, em Brasília, uma empresa para intermediar contratos de publicidade firmados com o governo federal.
A celebração de contratos marca a aliança de Lira com o então presidente da República. Enquanto Luciano circulava desenvolto como seu assessor pelos gabinetes mais importantes da Esplanada, de acordo com o portal Metrópoles.

Violência contra ex-mulher

As suspeitas de corrupção também foram apontadas por Jullyene Lins, ex-mulher de Lira, conforme reportou a RBA. Jullyene contou ao ICL Notícias que, enquanto casada – durante o período em que ele ainda era deputado estadual em Alagoas, entre 1999 e 2011 – via chegar em casa malotes com dinheiro. “Sabe aqueles ‘malão’ de banco? Chegavam lá. Era sempre alguém que trazia os malotes com dinheiro, aquelas malas de viagem também”.

Lira tem também um perfil violento, segundo ela, que chegou a ser agredida diversas vezes. “Ele me ameaçou, inclusive, e disse que aonde não há corpo, não há crime”, afirmou. “E ele tenta me silenciar de várias formas e é por isso que eu tenho essa necessidade de estar sempre indo de um local para outro que seja seguro. Eu não fico mais em Maceió, porque eu não posso caminhar na praia, porque eu tenho medo”, detalhou a mulher. Jullyene recentemente em reportagens compartilhou também ter sido violentada sexualmente pelo ex-marido.

Tempo da Justiça

Apesar da quantidade de acusações, as investigações ainda não responderam às diversas ligações dos casos com Lira. O caso foi comentado pelo jurista Lenio Streck durante sua participação na edição desta segunda do ICL Notícias, transmitido pela TVT e a Rádio Brasil Atual.

De acordo com o jurista, apenas a Procuradoria-Geral da República (PGR) tem competência para investigar o presidente da Câmara. Entretanto, as perspectivas neste sentido não são positivas, avalia. “As elites fazem acordo entre si. Por que ninguém pode dizer que ele (Arthur Lira) será punido por isso? Porque no Brasil as elites fazem acordos. Aqueles que estão no poder fazem acordos. (…) Alguém pergunta ‘o sistema não funciona?’. Negativo, ele funciona, a funcionalidade é sua própria funcionalidade”, lamenta Streck.

Saiba mais na entrevista

Redação: Clara Assunção