"Bate e depois consola?"

Irmã de Marcelo Arruda critica assédio de ‘cunho político’ de Bolsonaro

“Declarações do presidente não foram legais”, critica irmã. “Marcelo defendeu todos que estavam lá e o perdemos”, disse viúva

Reprodução
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Assassino bolsonarista já desceu do carro atirando. Presidente tentar reparar estrago em sua imagem, depois de minimizar o estrago de um crime a uma família

São Paulo – Familiares do guarda civil municipal Marcelo Arruda, de Foz do Iguaçu, estão incomodados com o assédio de Jair Bolsonaro. Segundo a irmã mais nova, Liziane Arruda, Bolsonaro tenta usar politicamente um vídeo gravado com dois de seus irmãos para tentar reduzir o estrago político após o assassinato de Marcelo, que era dirigente do PT na cidade. Primeiro, seu irmão foi morto pelo agente federal penitenciário Jorge da Rocha Guaranho, um bolsonarista militante, depois de premeditar o que iria fazer na festa de 50 anos do petista. Tardiamente, Bolsonaro fez declarações desastrosas, sem prestar nenhuma solidariedade à família. Além disso, tenta responsabilizar a vítima.

Depois disso, percebendo que o impacto em sua imagem após o crime só piora e afeta ainda mais sua tentativa de reeleição, exibiu uma conversa feita por videochamada com os irmãos de Marcelo Arruda, José e Luiz. A ligação foi feita pelo deputado bolsonarista Otoni de Paula (MDB-RJ).

Ao repórter Artur Rodrigues, da Folha de S.Paulo, Liziane Arruda disse que o vídeo da conversa com os irmãos “foi usado para cunho político”. A irmã caçula de Marcelo disse também que as falas de Bolsonaro e seu vice, Hamilton Mourão, pegaram mal e provocaram fortes reações nas redes. “As declarações do senhor presidente da República e do seu vice não foram declarações legais”.

“Sem saber de nada, a viúva de Marcelo, ao ser informada pelos jornalistas, estranhou o interesse do presidente para falar com a família, por um pequeno detalhe: José e Luiz não estavam na festa do irmão”, escreveu o colunista do UOL Ricardo Kotscho. Em seu texto, intitulado “Como Bolsonaro armou a sórdida intriga na família do petista assassinado“, Kotscho relata os detalhes da tramoia do presidente para se livrar de mais essa culpa.

“Irreparável”

Em seus pronunciamentos, Bolsonaro criticou a violência de “petistas” contra Jorge, que recebeu chutes quando já estava no chão, depois que Marcelo, já baleado, conseguiu atirar contra o bolsonarista. Foi o que acabou evitando uma chacina.

O presidente disse ainda que quer uma investigação “para a gente ver que teve problema lá fora”. E Mourão comparou o crime político cometido pelo apoiador de Bolsonaro a “brigas corriqueiras que ocorrem todo final de semana.”

“De repente, eles resolvem se compadecer da nossa família, resolvem querer nos ouvir”, ironizou Luiziane. “Acho que ele [Bolsonaro] viu que a coisa tomou proporção gigantesca e resolveu voltar atrás nas palavras. Depois que bate ele resolve consolar. A mesma mão que pune é a mesma mão que afaga?”, critica na entrevista.

Ela descreve como “um choque” a forma de divulgação do vídeo da conversa do presidente com seus irmãos. “Para nós foi um choque o que aconteceu e ver daquele jeito a divulgação do vídeo”, disse, ponderando que ainda não tinha falado com José e Luiz sobre o caso.

O irmão Luiz disse ao jornal que a família ainda não tomou decisão sobre o convite de Bolsonaro para visitar o Palácio do Planalto nesta quinta (14) para darem uma entrevista coletiva. Segundo a reportagem, a viúva de Marcelo Arruda, Pamela Suelen Silva, não descarta participar, mas desde que seja coletiva aberta, na qual possa “falar livremente”.

No domingo, em entrevista ao Fantástico, Pamela afirmou ser “irreparável tudo isso que está acontecendo”. Um dos quatro filhos de Marcelo, Leonardo, já havia dito, em outra entrevista à Folha, que a família está incomodada com a tentativa (de Bolsonaro) de responsabilizar Marcelo pelo caso. “O ódio não está em mim, na nossa família. A gente estava comemorando, não foi a gente que procurou isso. Não foi a gente que matou. A gente não odeia ninguém.”

Viúva de Marcelo Arruda

“O Marcelo defendeu todos que estavam lá. Infelizmente, nós o perdemos (…) Eu estou sem chão. Eu estou sem chão, eu não sei o que te falar… É uma extrema estupidez tudo isso que aconteceu. Eu perder uma pessoa, perder o pai dos meus filhos, por um extremismo ridículo. Isso é horrível. E a dor que toda a família está sentindo é terrível. É irreparável tudo que está acontecendo”
Pamela Suelen Silva, viúva de Marcelo Arruda, em entrevista ao Fantástico