Sem saída

Gervásio Maia e Vital do Rêgo encurralam Anderson Torres na CPMI do 8 de janeiro

Senador do MDB usou técnica de interrogatório contra Torres, delegado da PF. Já deputado do PSB pontuou: “Pelo seu histórico, se tem uma coisa que o senhor não é, é incompetente”

Marcos Oliveira/Agência Senado
Marcos Oliveira/Agência Senado
Gervásio Maia e Vital do Rêgo desconstruíram a retórica de Torres, que alegou não saber de nada

São Paulo – No período vespertino da oitiva do ex-secretário de Segurança Pública Anderson Torres à CPMI dos atos golpistas, o deputado Gervásio Maia (PSB-PB) e o senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB) foram os parlamentares que desconstruíram a retórica do depoente, construída habilmente para tentar convencer a comissão de que não sabia de nada do que estava prestes a acontecer no 8 de janeiro: o ataque golpista aos prédios dos Três Poderes em Brasília.

Vital do Rêgo usou uma técnica de interrogatório para se dirigir Torres, que não por acaso domina a linguagem da evasão, já que é delegado da Polícia Federal. O senador emedebista construiu seu discurso usando alguns episódios.

Primeiro, perguntou ao ex-ministro da Justiça de Jair Bolsonaro se, dada sua aparente displicência, o 12 de dezembro “não significou nada” para ele. Na data, Brasília teve “ônibus queimados prestes a serem lançados viadutos abaixo, carros depredados, tentativa de invasão da Polícia Federal”. Depois, o senador emendou se isso foi pouco para tomar medidas “duras”, já que no dia 24 de dezembro houve o episódio do “quase ataque a bomba nas imediações do aeroporto de Brasília”.

Torres respondeu que o Ministério da Justiça (MJ) agiu com “todo rigor necessário, tanto que no dia seguinte abrimos inquérito na PF do DF”. O depoente afirmou que não tinha condições de responder sobre o governo distrital porque estava no MJ, mas que a PF “prestou apoio” à Polícia Civil do DF, que prendeu alguns dos responsáveis.

Lances para xeque-mate

Vital do Rêgo então surpreendeu Anderson Torres e citou a ex-diretora de Inteligência da Secretaria de Operações Integradas do MJ no período em que ele era ministro. Marilia Alencar afirmou na CPI dos Atos Antidemocráticos da Câmara Legislativa do DF que, no dia 7 de janeiro, seu departamento informou “que havia manifestantes com ânimos exaltados e dispostos a enfrentar as forças de segurança”. Ela ressaltou: “avisamos isso várias vezes”.

“Tomou conhecimento disso?”, perguntou o senador a Anderson Torres. “Exatamente. Por isso fizemos um protocolo de ação integrada (PAI) tão radical, tão completo, pra que servisse de base no dia 8”, respondeu o ex-secretário.

O senador então afirmou que, com a resposta, o depoente “entra em completa contradição”, já que passou toda a oitiva alegando “que não tomara conhecimento” das ameaças. “Tomou conhecimento, sim”, disse Vital do Rêgo. Torres teve de admitir que, se assinou o protocolo de ação integrada, é porque “identificou ser possível que acontecessem coisas graves”.

Anderson Torres também contradisse o ex-diretor adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Saulo Moura da Cunha, que disse à comissão na semana passada que o órgão enviou 32 alertas de risco de atos golpistas de seguidores de Bolsonaro. “Vossa senhoria desconhece também?”, disparou o senador. “Marilia Alencar disse que o Ministério sabia dos alertas.”

O parlamentar concluiu que o discurso do ex-ministro e ex-secretário do DF de que não sabia do que estava por acontecer “não se sustenta (…). Não há como convencer a quem quer que seja”, disse. Segundo o senador, Torres sabia dos ônibus lotados de manifestantes “identificados como arruaceiros, baderneiros e golpistas, alimentados com a sanha de abolir a estrutura de Estado, e o (então) secretário de Segurança preferiu se ausentar” (Torres viajou de férias para os Estados Unidos dois dias antes).

Clima de tensão

Antes, o deputado Gervásio Maia pontuou que não tinha como o então secretário de Segurança não perceber “o clima de tensão, sobretudo nas redes sociais”, que se disseminava no país. Segundo Maia, “não precisava de nenhum procedimento de inteligência (policial) para verificar aquilo”.

“O movimento dos inconformados com a eleição era visível, ameaçando que (Lula) não subiria a rampa. O fato é que o presidente tomou posse e o que havia sido planejado ocorreu exatamente no dia 8 de janeiro. Aquele que era ministro já ocupava o cargo de secretário de Segurança Pública do DF”, relatou Maia didaticamente. “Viajou e alega que não sabia de absolutamente nada porque não tinha tomado pé da pasta. Ninguém vai acreditar nisso”, continuou.

“Vossa senhoria faz parte de capítulo duro, difícil, criminoso daquilo que fracassou no dia 8 de janeiro. Pelo seu histórico, pelo seu currículo, se tem uma coisa que o senhor não é, é incompetente. O senhor sempre foi um profissional competente, que sabia o que estava fazendo. Essa história de que o senhor não sabia de nada… Todos sabiam. O senhor não vai conseguir escapar do Poder Judiciário”, concluiu Gervásio Maia.

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