Sessão solene

Dilma no Congresso: abraços, fotos e mensagens cifradas de conciliação

Após juras de fidelidade dos caciques do PMDB, prova será a proposta de plebiscito sobre reforma política, que chega esta semana ao Congresso

Geraldo Magela/Senado

A terceira visita de Dilma ao Congresso como presidenta foi feita em meio a rusgas na base aliada

Brasília – O objetivo oficial da visita era a divulgação do relatório da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investigou a aplicabilidade da Lei Maria da Penha no país e propõe melhorias no âmbito do Legislativo e Executivo. Mas o que se viu, no plenário do Senado, durante a manhã desta quarta-feira (27), foi um clima de tentativa de conciliação e busca por maior proximidade, tanto por parte da presidenta Dilma Rousseff, como pelos deputados e senadores.

Por volta das 11h15, uma Dilma vestindo blusa com a tradicional cor vermelha e jeito sisudo – provavelmente por conta dos repórteres que a esperavam para saber sobre a crise no Ministério das Relações Exteriores – chegou ao Congresso e foi recebida por um grupo de parlamentares, dos quais se destacaram, além dos presidentes e secretários das duas Casas legislativas, os senadores Eduardo Suplicy (PT-SP), Inácio Arruda (PCdoB-CE) e Romero Jucá (PMDB-RR), bem como os líderes do PT na Câmara e Senado, respectivamente, José Guimarães (CE) e Wellington Dias (PI).

Em pouco tempo, contudo, o semblante da presidenta suavizou-se e Dilma parou para tirar fotos com servidores dos gabinetes e até empregados terceirizados que trabalham próximo à chapelaria do Senado. Tratou-se da terceira visita dela ao Congresso desde que foi eleita, e a presidenta chegou acompanhada de nada menos que 11 ministros, num gesto entendido, depois, como forma de mostrar valorização ao Legislativo e, ao mesmo tempo, ampliar o estreitamento de laços do governo com as bancadas – uma vez que muitos dos ministros são parlamentares.

Dilma Rousseff se permitiu sentar a portas fechadas com os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e líderes partidários, durante poucos minutos. Saiu brincando com os jornalistas e indagando – “atrasei um pouco, não é?”. Deu-se ainda ao direito, num gesto de descontração, de levantar-se e pedir, da forma mais informal possível, pelo discurso que iria fazer a um dos assessores, momentos antes de iniciar a fala oficial.

Explica-se: depois de conversar no gabinete do presidente do Senado, Dilma achou que não seria necessário fazer mais um pronunciamento previamente preparado. Ao longo da sessão, mudou de ideia e quis destacar os números consolidados sobre as políticas públicas do governo, para apoio e prevenção às mulheres vítimas de violência doméstica. E, num procedimento poucas vezes tão a sua cara, ela se levantou e acenou para o assessor: “discurso”, pediu – chamando a atenção dos olhares atentos no local.

Encontros e afagos

Além dos abraços e beijos em alguns parlamentares, a atenção maior foi dedicada ao senador Jorge Viana (PT-AC), que antes do início da sessão subiu à mesa e entabulou uma conversa rápida (privilégio apenas concedido a ele de forma mais direta). Do plenário, uma plateia que há muito tempo não era vista junta, se encontrava de forma inusitada. Caso de líderes partidários reticentes a votações de matérias de apoio ao governo lado ao lado com os principais defensores do Palácio do Planalto.

Como, por exemplo, os senadores Wellington Dias (PT-PI) e Blairo Maggi (PR-MT), também bem próximos do deputado Eduardo Azeredo (PSDB-MG). Ou o líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), que permaneceu ao lado de parlamentares como o senador Humberto Costa (PT-PE) e a deputada Benedita da Silva (PT-RJ).

Benedita, por sua vez, destacou-se na divisão entre acompanhar o hino nacional ou tirar fotos da sessão com o seu iPhone. A deputada registrou pessoalmente o início da solenidade, mas vários deputados e senadores deixaram para os assessores a tarefa de filmar e fotografar tudo para postar, logo mais, nas páginas de Twitter e Facebook dos seus chefes, conforme contaram. “Não escreve o nome do meu deputado para não ficar chato, mas o abraço que ele deu na presidente vai entrar na página do Face já já”, afirmou a assessora legislativa Sandra Almeida, da Câmara – que trabalha com um deputado pernambucano.

Ao fazer as honras da Casa, o presidente da Câmara afirmou que a visita de Dilma Rousseff representa uma honra para o Congresso, e enfatizou: “Presidente, venha mais vezes a esse parlamento. A democracia se fortalece com essa integração republicana dos poderes”. No mesmo tom, Renan Calheiros, ao citar dados sobre a Lei Maria da Penha apontados por pesquisa do DataSenado, que acompanha a aplicação das leis aprovadas, aproveitou para elogiar e destacar o programa Mais Médicos. A seu ver, “adotado em boa hora”.

“Cumprimento a senhora, aqui, pela presença pública no enfrentamento dos problemas de saúde que afligem os brasileiros. Saiba que o Congresso sempre atua na construção de consensos em relação a este problema”, colocou. O presidente do Senado afirmou, ainda, que a visita deve simbolizar “o olhar de satisfação para o passado e uma diretriz para o futuro”.

E declarou que a instituição apoia demandas como as dos projetos Mais Médicos ou de enfrentamento à violência contra a mulher “acima de qualquer diferença política ou partidária”. Neste último tema, Renan Calheiros lembrou que as recomendações solicitadas pela CPMI foram transformadas em 13 projetos a serem votados ainda esta semana pela Câmara e pelo Senado. Calheiros reiterou, também, que a presença de Dilma no plenário é entendida como “um gesto de humildade, respeito pelo Legislativo e vontade de dialogar”.

A presidenta aproveitou para falar do compromisso do seu governo em lutar e combater, “de forma intransigente, qualquer tipo de violência”. E chamou a atenção para outros programas que precisam ser integrados às políticas de proteção e defesa das mulheres, como o Bolsa-família, o Minha Casa, Minha Vida, projetos educacionais e ações sociais voltadas para a juventude. Segundo ela, tudo forma um contexto único, já que a violência contra a mulher cria vícios e destrói, aos poucos, as famílias – motivo pelos quais, acentuou, essas políticas precisam atuar de forma integrada.

Amadurecimento do país

“Para mim é uma grande honra estar aqui e confirmar o amadurecimento do país no tratamento desse tema (a violência doméstica contra a mulher) a um ponto em que contamos, atualmente, com análises bem fundamentadas sobre a aplicação da lei. Um dos pilares do nosso governo é criar relações civilizadas entre as pessoas e devemos ser mais obstinados no combate a qualquer forma de violência”. “Este relatório traz histórias trágicas que nos emocionam e nos afetam. Admiro e respeito os responsáveis pelo trabalho”, completou.

De um modo geral, o relatório apresenta números cuja coleta foi admirada e elogiada de forma unânime, assim como a quantidade de detalhes abordados. “O trabalho foi resultado de 18 meses de existência da CPI e realização de audiências públicas em praticamente todo o Brasil. O Congresso está de parabéns e a presença da presidenta Dilma aqui mostra o apoio por parte dela a essa bandeira, defendida, principalmente, pelas parlamentares do sexo feminino”, afirmou a ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário.

Mas pelo menos dois outros temas, não abordados de forma direta, ficaram no ar e foram bastante comentados: a intenção da liderança do PT na Câmara de apresentar amanhã o projeto de decreto legislativo (PDL) que pede a realização de plebiscito para a reforma política e a votação, até quinta-feira, da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

O PDL, segundo o presidente do PT, Rui Falcão, já possui mais de 171 assinaturas, o número mínimo exigido para que matéria semelhante possa ser apresentada. Resta saber se a Casa aprovará o plebiscito, já que, para isso, serão necessários 257 votos de apoio. Muitos dos deputados que se posicionaram no sentido de não assinar o projeto em junho, disseram que, se por acaso a ideia vingasse, seriam favoráveis ao plebiscito – como deseja o Executivo – durante a votação do texto em plenário. Agora, está cada vez mais próximo de governo e base aliada tirarem essa prova. E de Dilma saber se a visita feita hoje valeu mesmo a pena.