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Para governo turco, morte de trabalhadores em minas ‘é habitual e inevitável’

Primeiro-ministro Erdogan acirra a tensão e provoca protestos em todo o país, ao tentar minimizar tragédia e tem assessor flagrado agredindo manifestante

ERDEM SAHIN/efe

Sindicalistas precisaram ser hospitalizados após a intervenção policial com gás lacrimogêneo

São Paulo – O número de mortos na explosão em uma mina de carvão no oeste da Turquia subiu para 282, até o início da manhã de hoje (15, pelo horário de Brasília) e são pequenas as esperanças de se encontrar sobreviventes, informou o ministro de Energia turco, Taner Yildiz.

Desde ontem, várias manifestações públicas denunciam as precariedades das condições de trabalho no país. “Não é acidente, é assassinato”, cantavam os manifestantes, em referência à redução das medidas de segurança na mina de carvão de Soma, responsável, em sua opinião, pelo acidente que matou pelo menos 282 operários.

Na própria Soma, a tensão é grande, e a visita, ontem, do primeiro-ministro, Recep Tayyip Erdogan, não ajudou a acalmar os ânimos, pelo contrário.

As palavras de Erdogan, em entrevista coletiva no local da tragédia, contribuíram para aumentar a indignação de parte da população. O premiê ressaltou que este “tipo de acidente ocorre a todo momento” e enumerou uma série de acidentes industriais na mineração desde o século XIX para justificar suas palavras.

twitter/reprodução
Assessor de Erdogan chuta manifestante imobilizado

As redes sociais turcas viralizaram uma foto que mostra um parente dos mineiros mortos caído no chão após ser controlado por dois membros da equipe de segurança de Erdogan, enquanto um assessor do primeiro-ministro, Yousef Yerkel, o chutava.

Yerkel confirmou à imprensa que de fato se tratava dele na polêmica imagem, e prometeu explicar o incidente “em breve”.

Também causou espanto as declarações de Erdogan, de que um acidente de mineração dessa magnitude é “algo habitual” e “inevitável”, citando vários exemplos da Inglaterra do século XIX e da China e Índia em meados de século passado.

Protestos

Ontem (14), ocorreram protestos em dezenas de localidades, desde o local da tragédia, Soma, até as três maiores cidades do país: Istambul, Ancara e Izmir. Houve enfrentamentos entre os manifestantes, que pediam a renúncia do governo, e a polícia, que dispersou os protestantes com jatos d’água e gás lacrimogêneo.

A Turquia tem o pior índice de acidentes no trabalho da Europa, com uma média de três mortes por dia, e a mineração é, proporcionalmente, o setor mais afetado.

Em média, 80 operários morrem por ano em acidentes nas minas da Turquia, o que equivale a um de cada mil trabalhadores, segundo dados de um estudo universitário recente.

Cerca de 20 mil pessoas se manifestaram hoje (15) na cidade de Esmirna, perto da mina acidentada, para denunciar as condições de trabalho nas minas de carvão privatizadas. A manifestação aconteceu como parte da greve geral convocada para hoje pelo sindicato de funcionários KESK e a Confederação de Sindicatos Operários Revolucionários (DISK). Os Sindicatos pediram que os cidadãos vistam roupas pretas ou utilizem um laço dessa cor em sinal de solidariedade com as vítimas,

Vários sindicalistas precisaram ser hospitalizados após a intervenção policial com gás lacrimogêneo que tentava frear um protesto pelo acidente na mina de Soma, o mais grave da história da Turquia. A polícia interveio contra a manifestação com canhões de água e gás lacrimogêneo, informa a emissora “CNNTürk”.

Por consequência da intervenção, vários manifestantes, entre eles o presidente do sindicato DISK, Kani Beko, perderam a consciência e tiveram que ser levados de ambulância a um hospital próximo. Também em Istambul, a polícia local bloqueou uma manifestação sindical e isolou uma importante via do bairro de Besiktas para evitar que a passeata seguisse adiante.

Resgates

Ainda sobre o acidente de ontem, o ministro Taner Yildiz relatou que, dos 282 corpos já recuperados, 217 já foram entregues às suas famílias, enquanto os trabalhos de resgate podem voltar a ser interrompidos nas próximas horas “pelo acúmulo de gás e porque o incêndio prossegue” no interior da mina.

“Nas últimas 12 horas não foi possível resgatar ninguém com vida”, afirmou o ministro em outro sinal de que as possibilidades de que ainda existam sobreviventes são muito pequenas, sobretudo porque o incêndio persiste dentro da mina. Yildiz se negou a dar uma estimativa total de mortos na tragédia, mas a imprensa turca situa o número em cerca de 350.

Os sindicatos consideram que a pressão dos responsáveis pela mina – uma empresa privada – para reduzir custos, além da falta de equipamentos e de medidas de segurança, estão por trás das causas do acidente