Visão hegemônica

‘Me obrigaram a trocar as palavras militante palestino por terrorista’

Jornalista Heloisa Villela lembra como a mídia comercial se alinha com os interesses do Estado de Israel, reforçando laços com o sionismo para expulsar os palestinos de suas terras

EFE/Mohammed Saber
EFE/Mohammed Saber
"A propaganda anti-árabe e anti palestina é muito forte. Sei por experiência prórpria"

São Paulo – Israel promove na região da Faixa de Gaza o que os palestinos chamam de Nakba. Desde a fundação do Estado de Israel, em 1947, os sinonistas expulsam violentamente os nativos daquele território. A finalidade, argumentam os povos árabes, é de limpeza étnica. Assim, o massacre em andamento, tem tons históricos e fins territoriais. Desde o dia 7 de outubro, mais de 8 mil palestinos, mais de 60% mulheres e crianças, foram assassinadas. Contudo, a imprensa comercial insiste em chamar o genocídio local de “guerra”.

Heloisa Villela, que trabalhou na Globo, relata a parcialidade e a preferência da grande imprensa pelos israelenses e o desprezo pela causa palestina. “A propaganda anti-árabe e antipalestina é muito forte. Sei por experiência própria. As poucas vezes que fiz matérias falando de militantes palestinos, me obrigaram, a direção, a trocar a palavra ‘militante’ por ‘terrorista’. Para ter ideia do que acontece na grande imprensa”, disse a jornalista do ICL.

Para entender melhor esse fenômeno, o Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé realizou um debate hoje (1º) sobre o tema. Participaram, além de Heloisa, repórter-especial do ICL Notícias e única jornalista brasileira que esteve na Cisjordânia para reportar o conflito; Breno Altman, jornalista e fundador do Opera Mundi; e Ana Prestes, socióloga, cientista política, escritora, analista internacional e Secretaria de Relações Internacionais do Partido Comunista do Brasil (PCdoB).

O Nakba final

Sobre a situação na Cisjordânia, a visão de campo de Heloisa traz uma contribuição definitiva sobre a natureza do Nakba. A ideia é a expulsão completa dos palestinos de suas terras. “Todos que moram na Cisjordânia me disseram a mesma coisa. Sabem que quando acabar essa guerra contra os palestinos de Gaza, eles serão expulsos. Os que sobrarem, vão para o Egito. Depois, o alvo são eles. Eles têm certeza disso. Estou convencida que este é o plano de Benjamin Netanyahu, anexar não só Gaza, mas como também a Cisjordânia. Ter o menor número de palestinos, se algum”, disse.

“A Autoridade Palestina sabe que todos palestinos de Gaza irão para o Egito. É uma questão de acordo, de acertar. O Egito espera para saber qual o volume da dívida externa que será cancelada para abrir a porta e deixar morar em um trecho de deserto. Essa é a situação, um descaso completo. Quando a Bolívia decidiu romper relações diplomáticas, China e Colômbia chamaram para conversar com embaixadores, as pessoas da Cisjordânia pensaram ‘E cadê nossos vizinhos do mundo árabe? Por que eles não tomam atitude?’ Esse é o nível de abandono que a população sente”, completou.

Imprensa e sionismo

Já sobre a questão da imprensa comercial que cala diante do massacre, Breno Altman explica sua visão do alinhamento do empresariado com o sionismo. “É um problema ideológico que tem a ver com a natural aproximação da mídia corporativa com os norte-americanos. Mas, neste caso específico, uma pressão direta que o sionismo traz junto aos anunciantes, os meios de comunicação, sobre toda a questão estrutural. Temos que levar em conta que os Estados Unidos não mandam em Israel. É equivocado. É o único país do sistema capitalista que tem uma via de mão dupla”, afirma.

“Israel interfere na economia norte-americana. Uma fração relevante da burguesia norte-americana é judaico-sionista. Se relaciona, conspira, planeja com o Estado de Israel, mesmo dentro da política dos Estados Unidos. Nem França, Reino Unido e Japão têm isso. É uma interferência direta através das frações do empresariado que também é forte no Brasil. O caso de Israel é tratado pelos magnatas com absoluto cuidado. Isso em respeito às relações do sionismo com a burguesia. Esse é um problema, não o único”, completa.

Caça humana

Ana Prestes, por sua vez, relatou o que Altman disse na prática. “Temos relações com movimentos palestinos. Vemos eles se humilhando, pedindo para a Globo e outros canais. Perguntam por que não os ouvem, por que eles não podem falar. É uma coisa realmente impressionante. Assistimos a cenas da nossa imprensa, ao longo desse quase um mês dessa nova etapa do genocídio do povo palestino, é como se tivesse uma torcida para invasões terrestres. Uma caça humana, coisa absolutamente abjeta. Não dá nem para assistir”, disse.

Assista na íntegra: