Criticada, Venezuela justifica saída do sistema interamericano de direitos humanos

Presidente Hugo Chávez quer sistema 'mais sério e comprometido'

São Paulo – A Organização de Estados Americanos (OEA) lamentou hoje (12) a decisão do governo venezuelano de retirar oficialmente o país da Convenção Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). As críticas do grupo foram secundadas por manifestações desfavoráveis de organizações não governamentais que lutam pelo respeito aos direitos humanos na região, enquanto o presidente Hugo Chávez reafirmou a resolução e pediu um sistema de direitos humanos mais sério e comprometido.

“É preocupante para a CIDH que as violações aos direitos humanos que possam ocorrer na Venezuela não mais poderão ser conhecidas pela Corte Interamericana”, expressou o organismo regional, lembrando que a saída definitiva apenas se efetivará no prazo de um ano – ou seja, em setembro de 2013. Até lá, as instâncias supranacionais continuarão exercendo sua jurisprudência sobre o país. “Caso o Estado venezuelano conduza o processo de desligamento até o fim os cidadãos da Venezuela perderão uma instância de proteção de seus direitos, ficarão mais vulneráveis aos abusos e terão menos recursos disponíveis para se defender.”

A CIDH lamentou ainda que a decisão da Venezuela venha a enfraquecer o Sistema Interamericano de Direitos Humanos, o que contraria as resoluções firmadas pelos países membros na última reunião de cúpula da OEA, realizada em Cochabamba, na Bolívia.

Na ocasião, a CIDH já havia recebido críticas contundentes não apenas dos venezuelanos, mas também dos países que formam a Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (Alba), representados então pelo presidente do Equador, Rafael Correa. Parte dos líderes regionais acredita que o Sistema Interamericano é fortemente politizado e o denunciam por supostamente perseguir os governos que se opõem às orientações de Washington.

Independência

A OEA, a CIDH e algumas ongs dedicadas à observância dos direitos humanos na América Latina discordam dessa tese e reafirmam sua independência. “Um fato primordial é que os membros da comissão são todos especialistas, e não representantes dos Estados”, define Juana Kweitel, diretora de programa das Conectas, ong sediada no Brasil. “Estão lá devido a seu conhecimento e compromisso com os direitos humanos, e têm independência para tomar decisões.” Por isso, Juana Kweitel avalia que alguns governos sentem-se ameaçados pelas análises e recomendações da CIDH – sobretudo quando tais decisões contrariam seus interesses políticos ou econômicos.

No entanto, os números mostram, no caso venezuelano, que o presidente Hugo Chávez tem suas razões para bater de frente com a CIDH. Desde sua chegada ao poder, em 1999, a comissão multiplicou as decisões e relatórios desfavoráveis à Venezuela, em proporções amplamente superiores ao resto da América Latina: entre 1959, quando foi criada, até a eleição do atual presidente, a CIDH emitira apenas cinco decisões denunciando violações aos direitos humanos na Venezuela. Em contrapartida, entre 2000 e 2012, durante o governo de Hugo Chávez, Caracas foi condenada 36 vezes. No espaço de 12 anos, a Comissão condenou a Venezuela sete vezes mais do que durante os 40 anos anteriores.

Em 2002, a CIDH  também havia reconhecido o governo de Pedro Carmona, que fora empossado depois de um golpe de Estado empresarial-militar que sequestrou, prendeu e deixou Chávez por cerca de 48 horas fora do poder, enquanto os meios de comunicação privados alardeavam que o presidente havia renunciado. “Tomara nós tenhamos em algum momento uma comissão séria e que possamos lutar com outros governos pelos direitos humanos”, disse o mandatário, justificando que tem bastantes argumentos para respaldar a postura do país. “Nossa decisão foi baseada em nossos princípios éticos e em nossa conduta moral.”