Disputas internacionais futuras estarão no mar, diz juiz

Tribunal do Mar, com sede em Hamburgo, espera aumentar seu papel com ações que visem definir se recursos dos fundos oceânicos, como petróleo, pertencem aos Estados ou à humanidade

Criado na década passada por força da Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar, o Tribunal Internacional do Direito do Mar não vive seus dias mais agitados. Umas poucas causas esperam por avaliação dos juízes em Hamburgo, Alemanha. Seus integrantes, juristas com uma lista de títulos da extensão dos autos de uma ação internacional, ainda que desanimados com o presente, projetam um futuro mais movimentado.

A leitura é de que o avanço da tecnologia, ao permitir a prospecção de recursos minerais –  especialmente o petróleo – em profundidades cada vez maiores gerará novas disputas jurídicas. Pode ser que, diferentemente do perfil das ações atuais, os imbróglios se deem entre a “humanidade” e um Estado.

Tribunal Internacional do Direito do Mar

Criado em 1982, tem sede em Hamburgo, na Alemanha. Seus idiomas oficiais são francês e alemão, mas outras línguas podem ser usadas em processos específicos. Os 21 juízes são distribuídos entre os continentes, sendo que África e Ásia têm cinco cada, Europa Ocidental possui três, América Latina e Caribe somam quatro, assim como Europa Oriental e demais nações. Nenhum país pode ter mais de um juiz. Apenas o presidente e o vice permanecem na cidade-sede do Tribunal.
A finalidade do fórum é lidar com disputas por plataformas marítmas, análogas a territórios, conforme a Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar.
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O brasileiro Vicente Marotta Rangel, juiz do Tribunal do Mar há 13 anos, explica que a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, de 1982, cria, além do próprio tribunal, a Autoridade dos Fundos Oceânicos, com sede na Jamaica.

Em entrevista à Rede Brasil Atual durante a abertura do 7º Congresso Brasileiro de Direito Internacional, o professor emérito da Faculdade de Direito da USP que ocupa uma das 21 vagas para magistrados no organismo explicou que esta é uma entidade com vistas futuras e que transcende os Estados.

“Enquanto os Estados possuem mar territorial, zona econômica exclusiva e plataforma continental, existem também recursos que as Nações Unidas entenderam não destinar aos Estados, mas a esta entidade que é a humanidade”, explica. Isso quer dizer que pode haver disputas entre uma nação e o conjunto da humanidade.

Hoje, parte do recesso forçado do Tribunal do Mar diz respeito ao prestígio da Corte Internacional de Haia, na Holanda, que, por ser a mais antiga e a de maior jurisprudência, recebe um grande número de causas. Mas, no futuro, o Tribunal do Mar será a única entidade a recorrer em caso de disputas pelos fundos oceânicos.

Um Estado pode entender que aquilo que em tese está nos fundos oceânicos, na verdade, pertence à sua plataforma continental. A plataforma é uma espécie de território marítimo de uma nação que começa na linha da costa e se estende até atingir a profundidade de 200 metros em média.

Com o Brasil não constam problemas registrados entre países na costa do Pacífico ou na Europa que já disputam entre si fronteiras marítimas. No futuro, é provável que ocorra uma eventual disputa jurídica seja do Estado brasileiro pedindo a inclusão em sua plataforma de uma área que pertencia aos fundos oceânicos (pertencia à humanidade, em última instância).

Estados Unidos

Durante a abertura do evento em São Paulo, os oradores chamaram atenção para o avanço do Direito Internacional na questão dos tribunais com jurisdição supranacional. Para Marotta Rangel, trata-se de um avanço progressivo que beneficia a sociedade.

Mas, como em vários outros aspectos, os Estados Unidos contrariam a regra. O governo daquele país ainda não assinou a Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar e, portanto, não está sujeito à jurisdição do tribunal de Hamburgo.

O juiz aponta que, agora, há uma esperança de que o governo de Barack Obama assuma a responsabilidade. “Há informações de que o Senado dos Estados Unidos está em vias de dar uma aprovação definitiva para a questão”, afirma.

Atualmente, 158 nações mais a União Europeia são signatárias da convenção.