Novas acusações

Ronnie Lessa, acusado de matar Marielle, é alvo de operação da PF contra tráfico internacional de armas

PM reformado importava peças dos EUA para fabricação caseira de armas. Agentes cumprem outros seis mandados de prisão

Reprodução
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Ex-policial Ronnie Lessa está preso desde 2019. Ele é o autor dos disparos que mataram Marielle e o motorista Anderson Gomes

São Paulo – Uma operação da Polícia Federal, deflagrada nesta terça-feira (15) para investigar tráfico internacional de armas, tem como um de seus alvos o policial militar reformado Ronnie Lessa. Ele é acusado pelo assassinato da vereadora carioca Marielle Franco (Psol) e do motorista Anderson Gomes, crime que completou quatro anos ontem (14), ainda sem desfecho na investigação. E recebeu hoje na penitenciária de Campo Grande, onde aguarda o julgamento, mais um mandado de prisão pela Operação Florida Heat.

Lessa é acusado de importar peças dos Estados Unidos para a fabricação caseira de armas no Brasil. Segundo informações do jornal O Globo, ele costumava pedir para que a filha, Mohana Lessa, trouxesse o material dos Estados Unidos, onde morava por causa de uma bolsa de instrutora de futebol em Atlanta, no estado da Geórgia. O pagamento era feito em várias parcelas de menos de R$ 10 mil para despistar o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), conforme reportagem do portal g1. Os investigadores apontaram à imprensa que as peças menores que a filha de Lessa não conseguia enviar eram substituídas com a utilização de uma impressora 3D.

Além de Lessa, outras seis pessoas foram alvos de mandados de prisão preventiva. Outros cinco mandados de busca e apreensão também foram expedidos pela 1ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro. Pela manhã, os agentes da PF e do Ministério Público Federal (MPF) prenderam Ilma Lustosa, acusada de receber em sua casa, na Vila Isabel, zona norte do Rio, a matéria-prima importada. Do local, os equipamentos eram repassados para as “oficinas”. No mesmo bairro também foi preso Victor Souza de Oliveira. 

Armas para milicianos

A Polícia Federal afirma que o grupo também era responsável pela aquisição de armas de fogos, acessórios e munições. O dinheiro adquirido com o tráfico de armas, ainda segundo o órgão, era investido em imóveis residenciais, criptomoedas, ações, veículos e embarcações de luxo. A Justiça determinou o sequestro de bens avaliados em cerca de R$ 10 milhões. A PF disse que a célula estadunidense, em Miami, também foi alvo da operação. Os agentes federais apontam que as peças e as armas de fogos eram enviadas por esse grupo tanto em contêineres de navios cargueiros quanto em encomendas postais por avião pelos estados do Amazonas, São Paulo e Santa Catarina. Todo material tinha como destino final o Rio de Janeiro.

A quadrilha finalizava o trabalho nas oficinas, com o auxílio de Ghost Gunners, as impressoras 3D específicas para fazer os armamentos. De acordo com os agentes, as peças bélicas eram “posteriormente distribuídas para traficantes, milicianos e assassinos de aluguel”.

Reportagem de O Globo detalha conversas entre Lessa e a filha Mohana em que um dos assuntos era a compra de peças de fuzis. Nas mensagens, trocadas por meio de um aplicativo, Lessa explica, de maneira metódica, como ele comprava pela internet de casa, na Barra da Tijuca, os armamentos e mandava entregar na casa dela em Atlanta. O grupo deve responder pelos crimes de tráfico internacional de armas, organização criminosa e lavagem de capitais.

Ligações com o caso Marielle

Em julho de 2021, a mulher de Ronnie Lessa, Elaine Figueiredo Lessa, já havia sido presa sob acusação de tráfico internacional de armas. Fazia dois dias que ela tinha deixado a cadeia após ser condenada, em outubro de 2019, a quatro anos de prisão por atrapalhar as investigações do caso Marielle. Elaine seria a responsável por dar sumiço às armas usados por Lessa no assassinato da vereadora e do motorista. A Delegacia de Homicídios do Rio e o Grupo de Atuação de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público suspeita que uma submetralhadora HK-MP5, que teria sido utilizada na execução de Marielle e Anderson, tenha sido jogada no mar da Barra da Tijuca, próximo às Ilhas Tijucas.

Ronnie Lessa também já havia sido alvo de outra ordem de prisão por lavagem de dinheiro em outubro do ano passado. O policial militar reformado é conhecido ainda por ter sido vizinho do presidente Jair Bolsonaro (PL). Na época do crime contra Marielle, ambos moravam no condomínio Vivendas da Barra, na mesma rua, na Barra da Tijuca. Em 2019, o delegado Giniton Lages, da DH do Rio, então responsável pelas investigações sobre o crime contra a parlamentar, apontou que a filha de Lessa teria namorado um dos filhos do presidente, o caçula Renan Bolsonaro. 

Recentemente, o jornalista Bruno Paes Manso, pesquisador no Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP), observou que essa história serviu como “álibi” para explicar a ligação do clã Bolsonaro com um dos acusados de ter matado Marielle e Anderson, já que à época se descobriu uma série de trocas de telefonemas entre as duas casas. De acordo com o estudioso em milícias, em entrevista ao Brasil 247, a filha de Ronnie Lessa já morava nos Estados Unidos na ocasião. A informação, destaca, foi confirmada por ela em depoimento quando o pai foi preso. Além de Lessa, o ex-policial militar Élcio Vieira de Queiroz é o segundo acusado pelo MP do Rio de ser responsável pela execução dos assassinatos.

Redação: Clara Assunção