Água Branca

Entidades cobram destino de R$ 300 milhões de operação urbana em São Paulo

Novas intervenções na região da Água Branca estão sendo debatidas na Câmara. Apesar de mecanismos inovadores, sociedade teme que só setor imobiliário se beneficie

Fernando Stankuns. Flickr

Especialistas temem que a operação sirva à especulação imobiliária e à expulsão das famílias pobres de bairros centrais

São Paulo — Vereadores da Comissão de Política Urbana de São Paulo e o secretário de Desenvolvimento Urbano, Fernando Mello Franco, participaram na noite de ontem (16) de audiência pública para discutir a Operação Urbana Água Branca. Moradores das regiões afetadas fizeram diversas críticas ao projeto que tramita na Câmara Municipal e já foi aprovado em primeira votação.

A nova operação Água Branca prevê uma série de instrumentos que prometem melhorar a qualidade de vida dos moradores da região. Entre eles, o estabelecimento de número máximo de duas vagas de garagem em imóveis não residenciais e apenas um para os residenciais de forma a incentivar o uso do transporte público, além de impor a construção de garagens a partir do primeiro andar, deixando o térreo livro para instalação de comércios e atividade que mantenham as calçadas dinâmicas.

Desde 1995, uma área da região é alvo de uma operação que permitiu a construição de  imóveis acima do tamanho permitido. O dinheiro arrecadado pela prefeitura com esses empreendimentos deveria ser utilizado em melhorias do perímetro atingido, como a construção de moradias populares, e no sistema viário, privilegiando o transporte público. Até hoje, segundo dados da própria prefeitura, foram arrecadados R$ 366,4 milhões e gastos pouco mais de R$ 28,6 milhões, o equivalente a menos de 8%.

“Nós perguntamos que eficiência tem uma operação urbana que se propõe arrecadar recursos para para melhoria daquele território, se os recursos não são utilizados? Onde está esse dinheiro?”, questiona Lucila Lacreta, diretora do Defenda São Paulo.

Agora, muitos mais metros quadrados poderão ser negociados e dessa vez comcertificados na Bolsa de Valores de São Paulo, o que significa muito mais dinheiro arrecadado também. Por isso, além do temor de que a operação sirva apenas para beneficiar o setor imobiliário e provoque a expulsão dos moradores mais pobres e a perda da qualidade de vida da região, especialistas e entidades presente à audiência cobraram a determinação de prioridades entre as centenas de ações elencadas no texto da lei e a inclusão de equipamentos sociais, como escolas e hospitais, o que não está previsto atualmente.

“É uma operação urbana pela metade porque ela permite a construção de muitos metros quadrados a mais, mas não previu aqueles usos que dão suporte para a qualidade de vida”, definiu Lucila.  “O que se depreende disso é que não vai ser um bairro bem qualificado, ele vai ser um bairro verticalizado, extremamente adensado sob o ponto de vista construtivo e sem a correlata qualidade da vida urbana”, acredita.

O projeto também foi criticado pelos vereadores da Comissão de Política Urbana. Andrea Matarazzo (PSDB), que era um dos homens fortes da prefeitura nas gestões José Serra (PSDB) e Gilberto Kassab (PSD), e agora está na oposição ao prefeito Fernando haddad (PT), afirmou ser contrário à operação. “Os receios são muitos: a dispersão dos recursos arrecadados, o PL conflita com o Plano Diretor Estratégico, com o plano regional, com o código de obras e até mesmo com o Estatuto das Cidades”, afirmou.

Paulo Frange (PTB) criticou o que ele considerou um excesso de regras para os parceiros privados da operação que serão responsáveis por construir habitações. Uma das inovações previstas no texto do projeto, por exemplo, é que para cada 3 m² construídos para uso não residencial seja construído 1 m² residencial. “É como se você tirasse a capacidade de imaginação dos arquitetos”, disse.

Toninho Vespoli (Psol) lembrou ter sido o único vereador a votar contra a aprovação do projeto em primeira votação. “Eu queria entender por que a pressa de votar esse projeto nesse momento”, questionou.

Nabil Bonduki (PT) defendeu o aprimoramento da lei para que a operação seja diferente das outras vigentes na cidade, classificadas por ele como “desastres”. “Elas foram concentradoras de valor imobiliário nas áreas de operação que geraram expulsão da população de baixa renda, não gerou aplicação de recurso para quem precisa e foram fundamentalmente operações que investirão recursos no viário”.

No entanto, afirmou ser necessária uma operação na região do distrito da Barra Funda por ele ter a segunda menor densidade de populacional da cidade, perdendo apenas para o Marsilac, uma área de proteção ambiental. “Ele não cumpre sua função social. Precisa ser mexido”, afirma.

O secretário Fernando Mello afirmou que algumas das reclamações dos moradores da região são pertinentes e devem ser consideradas. Mas defendeu o projeto, classificado como “estratégico”, e cujo objetivo seria levar moradias para a região combinadas com qualidade de vida e oferta de transporte público. Ele rebateu as críticas de que a operação urbana conflita com o Plano Diretor e o Arco do Futuro. “Se há uma coisa que eu posso garantir é que nós temos, sim, apesar estarmos aqui discutindo um fragmento da cidade, total consciência da cidade”, afirmou.