Visibilidade

Livro sobre 60 anos da Contag traz à tona ‘resistência de sujeitos políticos marginalizados’

Obra recém-publicada acompanha origens da organização sindical rural, que se confundem com a própria formação política do país

Reprodução/Montagem RBA
Reprodução/Montagem RBA

São Paulo – Resultado de tempos efervescentes na política e, especificamente, na organização sindical do campo, a Contag nasceu em dezembro de 1963. Apenas quatro meses antes do golpe que daria início a 21 anos de ditadura – e que logo desarticulou as entidades que representavam os trabalhadores. Prestes a completar 60 anos e com protagonismo no chamado Movimento Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR), a Contag às vezes é preterida na análise histórica em relação a outras entidades.

Isso levou o pesquisador Marco Antonio Teixeira a se debruçar na trajetória da Contag. Além disso, havia um “duplo incômodo” a motivar o autor do livro Contag 1963-2023: ações de reprodução social e formas de ações coletivas, recém publicado pela editora Mórula. Além de certa escassez de dados, havia certa má fama – indevida, avalia – durante certo período de atuação da Contag no pós-ditadura.

Exemplos de organização no campo não faltam. Entre outros, seringueiros no Norte, canavieiros no Nordeste, os movimentos de ocupação que deram origem ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e as sempre lembradas Ligas Camponesas. Havia ainda certa lacuna em relação à trajetória da Contag. “Precisamos contar outras histórias que contribuíram para a conformação do país que temos hoje”, afirma o autor.

Isso significa também falar sobre um ator político central, mas quase sempre menos observado em relação ao trabalhadores urbanos. “Eu diria que o ponto central aqui é entender que é possível contar a história do Brasil por meio da história de resistência de sujeitos políticos marginalizados, incluindo os sujeitos políticos do campo.”

Além disso, o pesquisador analisa as mudanças ocorridas do ponto de vista da produção e da importância do trabalhador rural no combate à crônica insegurança alimentar no Brasil. “Hoje, por exemplo, há uma visão bastante difundida entre os movimentos sociais de que é este setor o principal responsável pela produção de alimentos para o país”, afirma Teixeira, que também é líder do grupo de pesquisa Alimento para Justiça: Poder, Política e Desigualdades Alimentares na Bioeconomia, no Centro de Estudos Ibero-Americanos da Universidade de Heidelberg, na Alemanha.

O livro físico pode ser comprado pelo site da editora. O e-book, que também pode ser acessado na página da Mórula, está disponível (gratuitamente) no site https://www.morula.com.br/produto/contag/.

A Contag surgiu meses antes do golpe de 1964. É correto dizer que as Ligas Camponesas, com origem no final dos anos 1950, estão na base da criação da entidade, apesar das possíveis diferenças político-ideológicas?

Sua pergunta é interessante, porque ela traz a curiosidade sobre a potencial contribuição das Ligas Camponesas para a criação da Contag. Eu entendo que esta curiosidade está baseada no fato de que a historiografia sobre as lutas sociais no campo brasileiro privilegiou alguns eventos e atores em detrimento de outros. Neste sentido, as Ligas Camponesas são as experiências que receberam mais atenção ou visibilidade nos estudos sobre as lutas sociais no campo, estando presentes até mesmo em livros didáticos. Enquanto a Contag e outras experiências foram menos estudadas e visibilizadas.

Uma das motivações para a pesquisa e a publicação do livro foi contribuir para dar mais visibilidade a diversas experiências de lutas sociais no campo que são fundamentais para entendermos o processo de formação do país. Como eu conto no primeiro capítulo do livro, focado na trajetória da Contag – o artigo indefinido é usado aqui propositalmente para chamar a atenção para o fato desta ser uma narrativa possível dentre outras –, três forças políticas principais compuseram a primeira diretoria da Contag e representam as forças políticas que venceram a disputa pela criação de uma confederação de trabalhadores e trabalhadoras rurais: a União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil (Ultab), a Ação Popular e grupos católicos do Nordeste. Veja o que digo no livro no trecho a seguir:

A chapa eleita foi formada por meio de uma composição ampla, envolvendo algumas das principais forças atuantes no campo brasileiro, entre elas a Ultab, a Ação Popular (AP) e grupos católicos do Nordeste. Apesar de a matéria sobre a formação da chapa, publicada no Jornal Terra Livre, anunciar que a frente única era formada por todas as correntes, algumas forças políticas ficaram de fora da chapa eleita, como o Master e as Ligas Camponesas. O primeiro presidente da Contag foi Lyndolpho Silva e o primeiro tesoureiro foi Nestor Veras, ambos ligados ao PCB. O secretário da entidade foi Sebastião Lourenço de Lima, ligado à AP. A composição de forças políticas presentes na primeira diretoria da Contag é representativa de parte dos grupos que disputavam articular a organização sindical dos trabalhadores e trabalhadoras rurais no Brasil. De acordo com Ricci (1999, 2009), no congresso de fundação da Contag, estiveram presentes dez federações vinculadas ao PCB, oito vinculadas à AP e seis dirigidas por grupos católicos do Nordeste“ (p. 69-70).

Os anos 1950 e começo dos anos 1960 foram uma época de ebulição no campo brasileiro, com muitas lutas sociais se visibilizando, se articulando e ganhando centralidade no cenário político nacional. Se as Ligas Camponesas foram uma das experiências daquele momento que tem mais visibilidade hoje, espero que o livro ajude a tornar conhecido outros sujeitos e histórias de resistências no meio rural brasileiro.

Por que a alcunha de “pelega” ou “legalista” foi dada à Contag naquele período? Deve-se a um certo caráter assistencialista nos anos que se seguiram ao golpe? Mas os depoimentos mostram que houve também um processo de resistência.

Eu começo o capítulo 3 do livro (formas de ações coletivas) mencionando que existe uma certa perspectiva difundida em parte do meio acadêmico e social que qualifica a atuação política do MSTTR como “não combativa”, “pelega”, “domesticada”, especialmente quando se fala sobre sua atuação durante a ditadura militar no Brasil (1964-1985). Sem dúvida, poderíamos acrescentar a esta lista de adjetivações o termo “legalista”.

Argumento que essa visão é orientada pela análise da ação política da Contag baseada em uma projeção de como a atuação da Contag deveria ser e não necessariamente a análise de como a atuação da Contag se realizou na experiência história.

E, claro, essa visão está estruturada por uma perspectiva política sobre o papel de movimentos sociais, o que é entendido por ação política ou até mesmo o que é visto como política. Por isso, se a ação da Contag não se adequava ao que se era esperado que um movimento social deveria fazer, logo classificava-se a confederação por meio das alcunhas de “não combativa”, “pelega”, “domesticada” ou “legalista”.

No livro, procuro entender a ação da Contag seguindo não como eu acho que o movimento deveria ter atuado ou como diretrizes políticas determinadas sugerem que um movimento atue. O que eu faço é seguir as perspectivas dos sujeitos políticos sobre as suas próprias atuações naquele momento. Como eu digo no livro, “adotar essa perspectiva significa entender as ações coletivas da Contag abandonando concepções prévias sobre como ela deveria ser e entendendo a ação vivida a partir da experiência e com base no ponto de vista de quem as viveu” (p. 192).

O que eu descobri na pesquisa de arquivos e nas entrevistas foi a existência de um movimento atuante, apesar das descontinuidades, dificuldades e riscos da conjuntura após o golpe de 1964. As lideranças políticas à frente da Contag naquele momento tinham uma leitura política de que era importante, por exemplo, manter a confederação em funcionamento, criar novas sindicatos, investir em formação política, garantir alguns direitos para a população do campo, ainda que com muitos limites. E assim o fizeram. E reorientaram seu modo de atuação em um momento posterior, quando avaliaram que era possível. Isso aconteceu no final dos anos 1970.

Talvez o exemplo mais emblemático para tratar disso seja o caso das campanhas salariais e greves (1979-1980), principalmente a de Pernambuco, que trato no capítulo 3. O que o MSTTR fez ali foi utilizar a Lei de Greve para fazer greves. Ou seja, conseguiram utilizar uma lei criada para dificultar que se fizesse greves para fazer as greves. Isso pode ter custado a alcunha de “legalista”. Mas isso foi resultado da leitura política dos sujeitos políticos daquele momento de que esta era a forma a se atuar naquela conjuntura. Uma leitura que se baseava, por exemplo, na compreensão dos riscos da realização de greves em um contexto rural, para os líderes sindicais e para os assalariados rurais. E que teve resultados muito positivos. Eu trato destas campanhas no capítulo 3, trazendo sobretudo a contribuição da Contag para a sua realização, porque estas campanhas já foram bastante estudadas por outras pesquisadoras, como Lygia Sigaud, que têm livros que são referências no tema.

Eu lhe pergunto: você conhecia a história dessas campanhas salariais? Elas começaram a acontecer em 1978. O que acontecia nesta época em termos de greves no país? As greves do ABCD paulista, que são os fenômenos mais estudados e visibilizados na historiografia e provavelmente na memória coletiva sobre as greves no final dos anos 1970 e começo dos anos 1980. E elas foram absolutamente importantes. Mas não foram as únicas. E precisamos contar outras histórias que contribuíram para a conformação do país que temos hoje. Estou aqui pensando no chamado da escritora Chimamanda Adichie, que nos fala sobre o perigo da história única. Ou seja, como criamos a imagem de um povo, de um país? Precisamos contar as histórias de quem lutou pela transformação deste país para entender quem somos. E, neste sentido, a contribuição da Contag ainda é pouquíssimo considerada.

A sindicalização rural só foi regulamentada em 1962. O fato de até meados do século 20 o Brasil ser um país essencialmente agrícola/rural, com alta concentração de terras, atrasou a organização política do campo, pela influência dos chamados coronéis?

Eu diria que o ponto central aqui é entender que é possível contar a história do Brasil por meio da história de resistência de sujeitos políticos marginalizados, incluindo os sujeitos políticos do campo. Ou seja, sempre houve resistências. Claro, elas tiveram diferentes formas e, muitas vezes, o que entendemos por resistência nos deixa míopes para enxergar as resistências que acontecem nas experiências sociais. E nos leva a concluir que não houve e não há resistências. Mas há vários estudos que mostram como há formas de resistência camponesa no Brasil desde o período colonial, como os dois volumes dos livros Formas de resistência camponesa: visibilidade e diversidade de conflitos ao longo da história, organizados por Márcia Motta e Paulo Zarth. Para as lutas contemporâneas, outros livros de referência são os dois volumes dos livros Lutas camponesas contemporâneas: condições, dilemas e conquistas. O campesinato como sujeito político nas décadas de 1950 a 1980, organizado por Bernardo Mançano Fernandes, Leonilde Servolo de Medeiros e Maria Ignez Paulino.

Estou citando estes trabalhos para reforçar este ponto de que sempre houve resistências ao modelo baseado na concentração de terras e riquezas. Claro, as resistências tiveram diversas formas. O que acontece nos anos 1950 e 1960 é que se reúne condições para que a sindicalização rural, que já tinha sido concedida ao meio urbano, seja estendida ao meio rural. No livro, eu procuro retratar um pouco sobre como se deu este contexto que permitiu que a sindicalização rural acontecesse. O direito à sindicalização é uma conquista importante, mas ela não é condição para a organização política no campo, que sempre existiu, de diferentes formas e com mais ou menos visibilidade, como mostram diversos trabalhos acadêmicos.

A propósito, o Brasil em certa medida segue sendo um país de coronéis, talvez com outra roupagem. A expressão “reforma agrária” ainda é tabu?

Primeiro, acho importante conversarmos sobre o que significa dizer que o país “segue sendo um país de coronéis”. Eu falo sobre isso porque existe de fato essa imagem de um coronel, que, de maneira simplificada, é atribuída a alguém que seja proprietário de terras e dono de votos. Essas características estão na essência do fenômeno do coronelismo, como bem descrito e analisado por Victor Nunes Leal no livro clássico Coronelismo, enxada e voto.

O que acho importante entendermos é que, embora possam haver experiências que se aproximam desta imagem de coronéis, as forças que disputam o projeto de país hoje são diferentes, diversas e bastante complexas. Hoje, estamos falando, por exemplo, do agronegócio, ou melhor, de vários setores do agronegócio que operam de forma distinta dos chamados coronéis. O setor conta, por exemplo, com o suporte do Instituto Pensar Agropecuária (IPA), que possui uma equipe de trabalho e agenda permanente e que serve para subsidiar o trabalho de diferentes setores do agronegócio, inclusive a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) no Congresso. O livro Formação Política do Agronegócio, do Caio Pompeia, por exemplo, mostra como este setor opera. As propagandas publicitárias que buscam construir a imagem do agro como pop são mais um exemplo de como o agronegócio vem disputando a construção da sua imagem na sociedade. E que difere dos coronéis. Mas as lutas sociais de hoje estão enfrentando também empresas de mineração, corporações internacionais, grandes projetos de desenvolvimento, que contam com apoio de setores do Estado. Ou seja, os adversários dos povos do campo, da floresta e das águas são diversos.

E eu falo isso porque entender contra quem trabalhadores e trabalhadoras rurais agricultores familiares, sem-terra, camponeses, indígenas, extrativistas e tantos outros sujeitos do campo estão lutando hoje é fundamental para compreender o desafio colocado.

Neste sentido, eu retomo a sua pergunta e me pergunto: o que seria entender a reforma agrária como um tabu? Significaria entender que é um assunto sobre o qual não se pode ou não se deve falar? Como um assunto proibido? Neste sentido, não vejo a reforma agrária como um tabu. Se observarmos a agenda política de muitos movimentos sociais veremos que a questão da reforma agrária nunca saiu de pauta. Seja para a Contag, Contraf, MPA ou MST, para mencionar alguns exemplos. Também para outros grupos, como para o movimento indígena e quilombola, a questão da demarcação de terras é central e condição para suas existências. E também para a preservação ambiental. Mas é inegável que vivemos um contexto de muita dificuldade de falar em reforma agrária no país, sobretudo no contexto de ascensão de uma direita autoritária durante o governo Bolsonaro. Não eram raros os casos de incitação do ex-presidente Jair Bolsonaro contra ativistas de movimentos sociais rurais, indígenas, quilombolas. Por exemplo, em sua conta no Twitter, no dia 5 de outubro de 2020, Bolsonaro incitou sua militância contra o MST por meio de um vídeo em que exibe supostos membros de um movimento social que aparecem em uma propriedade rural proferindo palavras de ordem ligadas à luta pela reforma agrária. Ao final da publicação, o presidente registra a frase: “Tenho minha opinião, qual a sua?”. A postagem foi suficiente para que, rapidamente, dezenas de seguidores começassem a responder se referindo ao MST como “terroristas”. Ou seja, vivemos um período no qual era muito difícil se falar sobre reforma agrária. E esse período não terminou. Com a força política do agronegócio no país, é difícil para os defensores da reforma agrária conseguirem fazer esta pauta avançar. Mas ela esta aí, latente. Em abril deste ano vimos como algumas ocupações de terra realizadas pelo MST no contexto da Jornada de Lutas em Defesa da Reforma Agrária, o “Abril Vermelho”, tiveram bastante repercussão.

O que significou a mudança de conceito, de “pequeno agricultor” para “agricultor familiar”?

Um dos aspectos interessantes do livro é acompanhar os 60 anos de atuação da Contag e, ao fazer isso, observar como ao longo destas seis décadas alguns termos e temas se transformaram. É um dos casos da pergunta que você me faz. Até o começo dos anos 1990, o termo “pequeno agricultor” era utilizado para se referir ao que chamamos hoje de “agricultor familiar”. Mas também podemos pensar em outros exemplos, como a emergência de categorias políticas como “agronegócio”, um processo também recente.

O livro menciona este aspecto, como parte da transformação da categoria de representação da Contag, mas sem aprofundar nos significados desta mudança em si, que não era o foco do meu estudo. Mas este trabalho é feito por outros pesquisadores, como Everton Picolotto, que no artigo Os atores da construção da categoria agricultura familiar no Brasil mostrou que três conjuntos de atores foram fundamentais para a construção da categoria agricultura familiar no Brasil: alguns trabalhos acadêmicos; as políticas do Estado e as normativas legais; e as organizações de agricultores familiares. O que o autor mostrou foi que essa mudança significou uma alteração da percepção sobre o setor. Enquanto nos anos 1970 e 1980 este setor era considerado pela academia e pelo Estado como tendendo ao desaparecimento, a partir dos anos 1990 a agricultura familiar passou a ser alvo de políticas de Estado, um modelo de agricultura e valorizado nos meios acadêmicos.

Para isso, as organizações sindicais do campo, como a Contag, tiveram um papel central e passaram a valorizar e dar centralidade a esta categoria em seu projeto político. Hoje, esta é a categoria de representação sindical da Contag, uma vez que, desde 2015, a Contag optou pela representação da categoria dos agricultores e das agricultoras familiares e se dissociou da categoria dos assalariados rurais. Para representar esta categoria, foi criada uma nova organização, a Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados e Assalariadas Rurais, a Contar.

A percepção sobre a importância social da agricultura familiar para o país se transformou bastante desde os anos 1990. Hoje, por exemplo, há uma visão bastante difundida entre os movimentos sociais de que é este setor o principal responsável pela produção de alimentos para o país. As experiências de doações de alimentos de muitos movimentos sociais e de atuação política durante a pandemia é mais um indício da relevância deste setor, que junto com outros sujeitos políticos, como sem-terra e camponeses, têm lutado para a construção de outro projeto social para o país e ressaltado a importância desses grupos para a produção de alimentos saudáveis. Isto me parece central em um contexto de altas taxas de insegurança alimentar no país.

O Brasil continua marcado pelo latifúndio, pela concentração da riqueza. Até que ponto a Contag e o desenvolvimento da agricultura familiar ajudam a mudar esse quadro?

Desde a sua criação, a Contag vem lutando por um modelo de desenvolvimento para o meio rural brasileiro. Hoje, este modelo é apresentado por meio do Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário. Trata-se de um projeto cuja primeira elaboração aconteceu nos anos 1990 e que ao longo das últimas décadas vem sendo atualizado. Este modelo de desenvolvimento é diferente do modelo hoje hegemonizado por setores do agronegócio, por exemplo. Trata-se de um projeto político amplo, cujo uma das dimensões centrais é a agricultura familiar como base estruturadora do desenvolvimento rural sustentável e solidário.

E o que é a agricultura familiar hoje? A Lei 11.326/2004 caracteriza o agricultor familiar e empreendedor familiar rural como “aquele que pratica atividades no meio rural, possui área de até quatro módulos fiscais, mão de obra da própria família, percentual mínimo de renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento e gerenciamento do estabelecimento ou empreendimento pela própria família”.

Ou seja, na medida em que um projeto de desenvolvimento rural baseado na agricultura familiar seja expandido para o campo, conseguimos avançar no enfrentamento aos dois problemas que você menciona: da concentração de terras e riquezas.

E, claro, este projeto de sociedade defendido pela Contag também tem outros pontos relevantes, como a defesa da reforma agrária ampla, massiva, de qualidade e participativa, a preservação e conservação ambiental, a soberania alimentar, entre outros aspectos.

Eu acredito que o livro é uma contribuição para ampliar o conhecimento e visibilidade sobre a trajetória da Contag e as lutas que esta confederação fez ao longo das suas seis décadas de existência. E, ao conhecer esta história, conhecemos um pouco mais sobre as questões políticas que marcaram o Brasil contemporâneo, sobretudo, mas não exclusivamente, as do mundo rural. Como eu digo na apresentação ao livro, “conhecer a trajetória da Contag é também conhecer um pouco da formação do Brasil desde a segunda metade do século 20 e, portanto, conhecer um pouco sobre o país que nos tornamos” (p. 24). O livro é um convite para nos conhecermos melhor a sociedade que somos.