prisão política

Acusadores de sem-teto presos são os mesmos da ação em que Carmen Silva foi absolvida

Movimentos de moradia marcaram um mês da prisão política de lideranças com manifestação no Ministério Público paulista e promessa de mais lutas

Elineudo Meira
Elineudo Meira
Manifestantes fizeram ato pacífico, parando na Secretaria de Segurança e no Ministério Público Estadual

São Paulo – Centenas de sem-teto protestaram na tarde de hoje (24) diante da Secretaria da Segurança Pública e do Ministério Público Estadual de São Paulo. As prisões arbitrárias das lideranças de movimentos de moradia Angélica dos Santos Lima, Janice Ferreira (a Preta), Ednalva Franco e Sidney Ferreira, há um mês, foram o alvo da manifestação.

O grupo protocolou documento reivindicando a libertação dos militantes e solicitou reunião com o procurador-geral de Justiça, Giampaolo Smanio. Advogados dos coordenadores destacaram ainda que parte das testemunhas que os acusam de extorsão são as mesmas do processo em que foi absolvida a coordenadora do Movimento Sem-Teto do Centro (MSTC) e da Frente de Luta por Moradia (FLM) Carmen Silva.

“A Carmem já foi acusada do mesmo crime de extorsão, por boa parte das mesmas testemunhas desse inquérito atual. Durante dois anos levamos várias testemunhas e provamos que ela não cometeu nenhum tipo de extorsão. Que essas contribuições coletivas são estabelecidas nos estatutos e discutidas nas assembleias”, reafirmou o advogado e membro do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana de São Paulo (Condepe) Ariel de Castro Alves. A coordenadora também tem mandado de prisão decretado pela Justiça paulista.

Os advogados do MSTC aguardam decisão da 6ª Vara Criminal do Fórum Central de São Paulo sobre o pedido de revogação das prisões de Preta Ferreira e Sidney Ferreira, membros do movimento. Outros advogados atuam na defesa dos demais sem-teto. Os defensores sustentam que as prisões são ilegais e que a polícia paulista não apresentou provas de que eles estivessem coagindo ou ameaçando testemunhas para justificar as prisões cautelares. “Eles sempre colaboraram com as investigações e compareceram na delegacia quando chamados, bem antes da decretação das prisões, onde prestaram todos os esclarecimentos necessários”, ressaltou Alves.


Fotos: Elineudo Meira


Constrangimento ilegal

No dia 16, o promotor Cassio Conserino denunciou e pediu a prisão de 19 integrantes de movimentos por moradia por crime de extorsão e associação criminosa. Os defensores sustentam que não foram apresentadas provas de extorsão e muito menos de associação criminosa, já que os militantes integram movimentos diferentes.

Os advogados concluem que está ocorrendo constrangimento ilegal, que os integrantes dos movimentos sociais estão sendo criminalizados em razão da luta pelo direito à moradia, previsto na Constituição Federal e no Estatuto das Cidades, e pedem a imediata liberdade dos detidos.

“O MSTC tem assistentes sociais que fazem o acompanhamento das famílias sem-teto, auxiliam a reinserção no mercado de trabalho. Ninguém é excluído por não pagar contribuições. Quando alguém é excluído é porque não cumpriu reiteradamente as normas da ocupação. Provamos no outro processo que muitas dessas testemunhas eram pessoas que tentaram levar traficantes para dentro da ocupação, tentaram levar o crime organizado, exploração sexual. Homens que agrediam mulheres. Essas pessoas foram excluídas, sim, por esses fatos”, explicou Ariel.

Para o coordenador do MSTC Valcir Félix, a única justificativa para as prisões é a tentativa de desestabilizar a amedrontar os movimentos sociais. “Temos certeza absoluta que se trata de uma ação do Estado contra os movimentos sociais. Os movimentos de moradia são os que mais incomodam os paulistas mais ricos. Essas prisões não têm nenhum embasamento legal, estão fundamentadas apenas em uma perseguição aos sem-teto, com o objetivo de desmontar. Eles foram jogados nos Centros de Detenção Provisória (CDP) sem ter nenhuma condenação. Simplesmente por defenderem os direitos dos mais pobres. É uma prisão política e não judicial. E a luta vai ser muito grande”, afirmou.

“Somos trabalhadores”

Sobre as afirmações do promotor, de que todas as ocupações de sem-teto da capital paulista são palco de extorsão, Félix fez um convite a todos que queiram conhecer as ocupações, em especial ao autor da denúncia. “Convidamos o promotor Conserino a visitar qualquer uma de nossas ocupações. Ele vai ser muito bem recebido, não precisa ter medo. E nem precisa levar segurança, porque nós não somos bandidos, somos trabalhadores de baixa renda e respeitamos tanto as leis e a cidadania”, disse.

O presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana de São Paulo (Condepe), Dimitri Sales, relatou ter visitado os quatro presos e que eles estão bem, mas que a mobilização da sociedade é fundamental para garantir a segurança deles. “Eles estão indignados com a injustiça que estão sofrendo. Indignados por serem vítimas de um processo político que deteriora a democracia e criminaliza os movimentos sociais. Estão firmes e conscientes de que sofrem um processo político e não judicial.”

Sales ressaltou que o Condepe nunca recebeu “nenhuma denúncia sobre extorsão ou violência nas ocupações organizadas pelos movimentos sem-teto na cidade de São Paulo”.