Obama: o senhor da paz ou um prisioneiro de guerra?

Barack e Michelle Obama em galeria de Washington D. C. (Foto: Flávio Aguiar) Deu para perceber a relativa cautela com que os Estados Unidos entraram na aventura do bombardeio aéreo […]

Barack e Michelle Obama em galeria de Washington D. C. (Foto: Flávio Aguiar)

Deu para perceber a relativa cautela com que os Estados Unidos entraram na aventura do bombardeio aéreo sobre a Líbia.

Também deu para notar o açodamento de franceses e britânicos, que arrastaram a OTAN na sua cola, inclusive a Itália, cujo governante era próximo de Gadaffi, mais até do que Sarkozy e a média dos líderes europeus.

Na verdade a operação Líbia, que extrapolou, e muito, o mandato dado pelo Conselho de Segurança da ONU, obedeceu a duas lógicas. A primeira foi a da França, que vem reconstruindo sua área de influência na África à custa de intervenções, como esta que aconteceu na Líbia e como a que houve na Costa do Marfim, derrubando governantes a seu bel prazer. A outra segue a lógica dos ajustes históricos dos britânicos com os líderes nacionalistas do mundo árabe, coisa que lembra a deposição de Muhammad Mossadegh (com ajuda decisiva da CIA) na antiga Pérsia, hoje Irã, nos idos de 50 e poucos. Nota Bene: há muito pouco em comum entre o aristocrático e nacionalista Mossadegh de então e o ditador cruento e bufo em que Gadaffi se transformou. Inclusive porque, ao contrário deste, Mossadegh nunca passou para o bando dos “eleitos”, coisa que aconteceu com o ditador líbio desde que as companhias petroleiras o abarrotassem de dólares e os governantes ocidentais de lisonjas desde coisa de cinco anos atrás, para depois demonizá-lo novamente.

Obama entrou na operação pisando em ovos, ou melhor, nas dívidas milhardárias de guerra que o governo Bush lhe deixou de herança como parte da atribulada questão da dívida pública norte-americana, que o fez refém dos Tea Party, do Partido Republicano e dos tíbios democratas. Obama não podia arriscar-se a uma intervenção ilimitada que possa desandar num novo Iraque ou Afeganistão (o risco ainda não desapareceu), nem podia sequer seguir o exemplo de franceses e britânicos que subsidiaram diretamente e por terra o confuso e ineficiente exército (?) rebelde.

Essa conjuntura mostra bem alguns dos limites da administração de Obama, que, se de um lado é o presidente da nação mais poderosa da história humana, de outro é prisioneiro dessa mesma função e da continuidade de suas políticas estratégicas. Não que Obama não pertença ao establishment político norte-americano. Mas não é de todo conveniente para esse establishment, que se sentiria muito mais à vontade com Hillary Clinton na Casa Branca.

Também conta o fato de que Obama se tornou presa dessas guerras pelo fator inevitável da busca da reeleição. Os Estados Unidos vivem ainda sob a síndrome de Jimmy Carter, o presidente que, depois de querer se tornar o campeão dos direitos humanos em escala internacional, foi derrotado ao término de seu primeiro mandato entre outras coisas pela erosão de sua popularidade graças à crise da invasão da embaixada norte-americana no Irã e a intervenção soviética no Afeganistão. Como no caso de Obama hoje, também um estado de crise econômica comprometia a imagem de seu desempenho. Ser derrotado na passagem do primeiro para o possível segundo mandato equivale a um enterro político e para a história. Carter deu a volta por cima tornando-se o líder de um centro que continuou se envolvendo com direitos humanos; não é certo que Obama – o “enjeitado filho de destino” – venha a ter essa sorte caso perca a próxima eleição.

Em termos práticos, até o momento o que mais parece poder garantir sua reeleição são as vicissitudes da guerra do que o esforço para debelar a crise econômica e política em que os Estados Unidos estão envolvidos. O assassinato (chamemos as coisas pelo nome) de Osama Bin Laden e a intervenção milimetricamente calculada na Líbia podem compensar  o atolamento que continua no Iraque e no Afeganistão, e na paralela questão de Guantánamo (agora agravada pela denúncia com documentos de que o governo norte-americano pagou empresas particulares para remover acusados de terrorismo ao redor do mundo a fim de tortura-los). Mas essas intervenções podem custar caro ao império. O exemplo soviético é eloqüente, pois também o encalacramento e seus custos do Exército Vermelho no Afeganistão contribuíram para a derrocada da URSS.

 

A seguir: As complicações na frente interna.