Embate no Senado

Governistas exaltam Moro e Lava Jato. Oposição questiona imparcialidade, e senador pede renúncia

Para Humberto Costa, ministro deveria pedir desculpas públicas. Cid Gomes defendeu CPI para apurar vazamentos e possível conluio entre Judiciário e Ministério Público

Pedro França/Agência Senado
Pedro França/Agência Senado
OAB questiona Coaf sobre pedido de investigação do jornalista Glenn Greenwald, responsável pela veiculação de notícias com troca de mensagens por meio das quais Moro orientava atuação dos procuradores da Lava Jato

São Paulo – Em clima de relativa tranquilidade na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado, o ministro Sergio Moro insistiu, já com quatro horas e meia de audiência pública nesta quarta-feira (19), em questionar a autenticidade do material divulgado pelo site The Intercept Brasil e no objetivo de atacar a Operação Lava Jato e as próprias instituições. Repetiu várias vezes que não possui mais o conteúdo de suas mensagens no Telegram e foi ironizado por sua “péssima memória”, como chegou a comentar o líder do PSD, Otto Alencar (BA).

Um dos momentos mais tensos ocorreu durante embate entre Moro e o senador Humberto Costa (PT-PE). “Vossa excelência é auto-indulgente, mas não tem indulgência com ninguém”, afirmou o parlamentar, que também ironizou o fato de o ministro e ex-juiz falar em “sensacionalismo” com a divulgação das mensagens, depois de tornar a Lava Jato uma espécie de espetáculo midiático. Afirmou que Moro ficou “envaidecido com o estrelismo”. Em seguida, pediu a renúncia de Moro e um pedido público de desculpas. O ministro reagiu dizendo que as afirmações do senador eram “bastante ofensivas” e que, nesse caso, ele iria declinar de responder.

Cid Gomes (PDT-CE) propôs a instalação de uma CPI para investigar quem foram os responsáveis pelo possível vazamento, e por outro lado, se houve conluio entre o Judiciário e o Ministério Público, “o que certamente compromete qualquer processo”. Ele afirma que muitos juristas sustentam que a atuação de Moro no processo judicial ficou comprometida. Para o senador, a corrupção é “carrasca da democracia”, mas não pode ser vista como “panaceia” para todos os problemas do país. O também ex-governador comentou que o ministro repetiu “três ou quatro mantras” durante a audiência.

A argumentação básica de Moro foi no sentido de ter sido vítima de um ataque hacker por um grupo organizado e que as conversas vazadas, se autênticas, não o comprometem.  “Vamos esclarecer. Aqui na tradição jurídica brasileira não é incomum que juiz converse com advogado, que juiz converse com promotor. Isso acontece a todo momento. E, no caso do juiz criminal, é muito comum, já que o juiz responsável tanto pela fase de investigação como pela fase do processo, receba policiais e procuradores e converse sobre diligências que vão ser requeridas, diligências que vão ser cumpridas. Isso é absolutamente normal.”

O tucano Tasso Jereissati (CE) disse que a Lava Jato “é um marco na história deste país”, mas acrescentou que a operação teve alguns abusos de procedimento. “Aquela busca e apreensão do ex-presidente Lula me chamou a atenção com uma coisa desnecessária de ser feita”, citou, sobre a condução coercitiva determinada pelo então juiz em março de 2016. Abusos que foram se desdobrando, acrescentou o senador do PSDB, que pede aperfeiçoamento da legislação sobre crimes cibernéticos. Rival regional, Cid Gomes propôs mudanças nas regras processuais para que o juiz da instrução não seja o mesmo responsável pelo julgamento.

Houve conflito também durante a intervenção de Fabiano Contarato (Rede-ES), para quem houve desrespeito ao devido processo legal por parte de Moro e violação do princípio da isonomia no tratamento com os envolvidos na operação. “O senhor defende a anulação de tudo, então?”, reagiu o ministro, considerando que o senador fazia uma “defesa peculiar” da Lava Jato. ” Não ponha palavras na minha boca. Inclusive, eu fui eleito enaltecendo a Lava Jato. O que eu não defendo é quebra do princípio da isonomia, que é uma garantia constitucional, do Código de Processo Penal e da Declaração dos Direitos Humanos”, respondeu Contarato.

Alguns senadores se limitaram a exaltar o ministro e a Lava Jato. “Estamos diante de um crime claro e de um escândalo”, afirmou Marcio Bittar (MDB-AC), referindo-se ao vazamento de mensagens. “É um amontoado de palavras, de frases, que não prova nada, mas que tem o claro objetivo de criar uma revanche às operações de combate à corrupção no Brasil.”