palanque antecipado

Serra aproveita evento oficial do governo paulista para exaltar suas ações

Durante evento oficial de inauguração da Casa da Aids, candidato tucano discursou por nove minutos sobre as ações de enfrentamento à doença em seu tempo como ministro

Marcelo D/Folhapress

Já em ritmo de campanha por uma vaga paulista ao Senado, o tucano falou de sua gestão como ministro da Saúde de FHC

São Paulo – Em sua primeira aparição em São Paulo depois de anunciar a candidatura ao Senado pelo estado, o tucano José Serra participou hoje (2) do lançamento de um programa para assistência e prevenção à aids e da inauguração da Casa da Aids, em Pinheiros, zona oeste da capital. Ao lado do secretário estadual da Saúde de São Paulo, David Uip, e em meio a secretários, gestores estaduais de saúde, médicos, professores e trabalhadores do setor, o tucano esteve muito à vontade. Usou o palanque, mas para a reportagem da RBA disse que não queria falar de política.

Bem humorado, sorridente e recheando seu discurso de nove minutos com piadas e brincadeiras, encontrou na solenidade oficial  um palanque sob medida para falar sobre um de seus assuntos prediletos: seu tempo à frente do Ministério da Saúde (1998-2002) durante o governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB, 1995-2002).

Sem dizer com todas as letras que foi o melhor ministro da Saúde que o Brasil já teve, como apregoam os tucanos, Serra partiu do lançamento do programa da Saúde de Alckmin contra a aids para chegar onde justamente queria: falar de algumas de suas ações.

De acordo com ele, no começo da década de 1990, o Brasil e a África do Sul estavam praticamente nivelados no número de casos da doença. “No caso da África, havia muitos pretextos para não fazerem nada, como o fracasso do regime pós-apartheid, preconceitos. Nós pegamos outro caminho, que não foi só aprovar e materializar a ideia de direito ao tratamento de cada pessoa portadora do vírus: fizemos parceria com 600 ONGs, que foram o braço executivo do programa”, disse.

Para destacar o arrojo com que vê a política tucana para o setor, Serra relatou ainda como o Brasil foi ao Banco Mundial em busca de financiamento para tratamento, mas o que recebeu foi apenas recursos para publicidade de ações em prevenção. “Mas nós defendemos a tese do tratamento integral, que prevaleceu, porque o tratamento também acaba barrando o crescimento da doença porque as pessoas ficam com mais auto estima, se cuidam e assim diminuem seu papel de potenciais transmissores”, destacou.

O candidato a senador ressaltou ainda sua atuação como ministro, ao apontar que, por conta de sua gestão, o Brasil contribuiu com uma mudança significativa no tratamento dos sintomas da doença. “Nós fomos à Organização Mundial do Comércio e defendemos a tese de que seria possível quebrar patente de medicamentos em caso de dificuldade financeira do governo e de interesse social. Conseguimos sair vitoriosos em negociações com os Estados Unidos e alguns outros países desenvolvidos”, lembrou o candidato. “Foi até engraçado, porque era no começo do governo Bush, que era difícil de negociar. O fato é que ficaram mais na defensiva, acabaram negociando e assim mudou o mercado mundial de medicamentos”.

Serra não perdeu a oportunidade para alfinetar órgãos do governo federal, como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), enquanto lembrava outro episódio que enaltecia sua gestão. Segundo contou, um executivo de laboratório farmacêutico aposentado certa vez teria dito que o motivo de o país não ter genéricos para tratamento do câncer é culpa da agência. “É assim porque a Anvisa não consegue organizar o teste de bioequivalência e biodisponibilidade. Incompetência, porque em outros países, na União Europeia, já fazem. É só ver como eles fazem para saber como fazer”, relatou.

“Esse mesmo senhor me disse que eu dei o maior prejuízo da carreira dele porque nós ameaçamos quebrar a patente. Embora fosse só ameaça, ele me disse que baixou o preço de 100 para 30”, emendou. Quando praticamente tinha devolvido a palavra à mestre de cerimônias, retomou o microfone para insistir num ponto, que é critico, segundo ele: “Nós reduzimos a transmissão vertical da doença, que acabou estacionando porque, quando chega na parte mais pobre da população não avança. O governo não tem feito nenhum programa especial. É incrível isso”.

É inexplicável também que Serra se gabe tanto de ter criado os medicamentos genéricos. Longe de preocupação com a saúde da população – e de seu bolso – a ideia teve origem num episódio pouco conhecido pela maioria da população.

Em 1996, o governo FHC aprovou, a toque de caixa, a Lei 9.279, conhecida como Lei Brasileira de Propriedade Industrial (LPI). Seus artigos 230 e 231 instituíram as chamadas patentes pipeline, reconhecendo patente de invenções, inclusive medicamentos, que já estavam em domínio público. O reflexo imediato da medida, que proibiu a venda de genéricos, levou a um gasto adicional do Ministério da Saúde da ordem de US$ 519 milhões entre 2001 e 2007 só com a compra de cinco medicamentos do coquetel de combate aos efeitos da aids. 

Os artigos permitiram a aprovação automática, sem avaliação prévia, dos pedidos ou de patenteamento feitos ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) até um ano após a entrada da lei em vigor. Bastava ao requerente comprovar o registro original de patente em outro país para obter aqui o direito de exclusividade. A corrida foi grande. Entre maio de 1996 e de 1997 foram depositados 1.182 pedidos, dos quais mais de 700 eram de fármacos.

Eleição

Ex-prefeito de São Paulo (2005-2006) e ex-governador do estado (2007-2010), Serra teve a candidatura ao Senado confirmada na última segunda-feira (30). Há a informação, não confirmada, de que o tucano estava em dúvida entre concorrer a uma vaga de deputado federal ou de senador, mas que teria decido aceitar a campanha pelo Senado assim que garantiu figurar pelo mesmo tempo na propaganda eleitoral na TV que Geraldo Alckmin (PSDB), que concorre à reeleição como governador.

O confronto direto de Serra pelo Senado será contra Eduardo Suplicy (PT), que concorre pela quarta reeleição consecutiva para o posto de senador por São Paulo, que ocupa desde 1991. Com mandato de oito anos de duração e três representantes por unidade federativa, o Senado passa por renovação em eleições alternadas: em 2010, dois parlamentares foram eleitos por estado, e, em 2014, será apenas um; em 2018, novamente dois parlamentares, e assim sucessivamente.

Além de Suplicy e Aloysio, a bancada paulista no Senado conta ainda com Marta Suplicy (PT), atualmente licenciada para desempenhar a função de ministra da Cultura. O suplente em exercício é Antonio Carlos Rodrigues (PR).