Carnaval húngaro

Bolsonaro nega preocupação com prisão e diz que foi até a embaixada ‘fazer política’

Defesa do ex-presidente afirmou que é “ilógico” sugerir que ele fosse pedir asilo ou tentar fugir. Jurista afirma que provas e circunstâncias indicam justamente o oposto

Reprodução/NYT
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Bolsonaro foi tentar asilo em 'território amigo', diz Maierovitch

São Paulo – O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tentou explicar ao Supremo Tribunal Federal (STF) as razões que o levaram a passar o carnaval na embaixada da Hungria. Em resposta encaminhada por sua defesa ao ministro Alexandre de Moraes, ele alegou que não tinha “preocupação com a prisão preventiva”. E que permaneceu duas noites no local, em plena folia, para tratar de “assuntos estratégicos de política internacional de interesse do setor conservador”.

“Diante da ausência de preocupação com a prisão preventiva, é ilógico sugerir que a visita do peticionário à embaixada de um país estrangeiro fosse um pedido de asilo ou uma tentativa de fuga. A própria imposição das recentes medidas cautelares tornava essa suposição altamente improvável e infundada”, alegou a defesa de Bolsonaro. Nesse sentido, seus advogados classificaram ainda como “equivocadas quaisquer conclusões” de que ele pudesse pedir asilo diplomático na embaixada.

Conforme divulgou o jornal The New York Times, Bolsonarou ficou hospedado nas dependências húngaras entre 12 e 14 de fevereiro. Sua estadia ocorreu quatro dias após a Polícia Federal (PF) apreender seu o passaporte e ordenar a prisão de quatro assessores. Eles foram alvo da Operação Tempus Veritatis, que apurava tentativa de golpe de Estado.

Além disso, o ex-presidente entrou na embaixada da Hungria após convocar seus seguidores para ato na Avenida Paulista, que acabou ocorrendo em 25 de fevereiro. Na ocasião, sobressaltado com a possibilidade de prisão, falou em “pacificação” e “conciliação”. Sugeriu “passar uma borracha no passado” e pediu anistia “para aqueles pobres coitados que estão presos”, insinuando perdão a ele próprio.

A partir da revelação do episódio, Alexandre de Moraes deu prazo de 48 horas para que Bolsonaro se explicasse. Já o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) acionou a Procuradoria-Geral da República (PGR) pedindo a prisão preventiva do ex-presidente, alegando risco de fuga. Após receber as alegações, Moraes solicitou parecer à Procuradoria.

Explicando o “inexplicável”

Na prática, pelo Direito internacional, como embaixadas são áreas invioláveis, Bolsonaro só poderia ser alcançado por agentes brasileiros, em caso de uma nova operação, com o consentimento do governo húngaro. Além disso, Bolsonaro é próximo política e ideologicamente do primeiro-ministro Viktor Orbán, político de extrema direita. Durante seu mandato, chegou a chamar o líder húngaro de “irmão”.

Para o jurista e professor Wálter Fanganiello Maierovitch, Bolsonaro “subverte a lógica para tentar explicar o inexplicável”. Em sua avaliação, o investigado “saiu para testar um asilo político” em território do amigo, já que estava sem passaporte. Além disso, poderia utilizar a embaixada europeia como uma “espécie de cercadinho”, para discursar e promover agitações entre seus seguidores.

“Essa era a lógica que se pode extrair das provas, circunstâncias e do “iter (caminho) criminoso” percorrido por Bolsonaro. É ilógico pensar diversamente”, escreveu Maierovitch, em sua coluna no portal UOL.

“Deprimente episódio”

Também hoje, mas ainda antes de virem a público as explicações de Bolsonaro, o senador Humberto Costa (PT-PE) afirmou que a estadia na embaixada era uma estratégia para não ser preso. “Mais um lamentável e deprimente episódio protagonizado por ele, o que demonstra a sua limitada estatura política (…). É um claro indicativo de que procurava imunidade em uma área protegida por convenções internacionais, por receio de eventual decretação de prisão preventiva”, disse em discurso na tribuna do Senado.

“Uma evidente manobra para impedir que o Poder Judiciário cumpra eventuais medidas decorrentes do avanço de investigações empreendidas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público, que o apontam como mandante e responsável por vários crimes”, acrescentou o parlamentar.