Argentina

Oposição e organizações civis criticam medida de Macri para restringir protestos

Em meio a manifestações contra o governo e a prisão de Milagro Sala, Ministério de Segurança aprova protocolo para conter e dispersar protestos no país

Twitter/Prensa Madre

Polícia quis impedir protesto semanal das Mães na Praça de Maio; nada as detém

Opera Mundi – Deputados da oposição e organizações civis argentinas têm criticado a medida aprovada na quarta-feira (17) pelo Ministério de Segurança para restringir os protestos em vias públicas no país. Segundo a nova diretriz, as manifestações públicas, que durante o período kirchnerista eram livres, deverão agora ser comunicadas às autoridades, que vão autorizar ou não o percurso indicado e terão o mandato para dispersar os protestos quando julgarem que estes estejam afetando o trânsito.

O protocolo, aprovado pelo Conselho de Segurança Interna, prevê uma série de regras para os protestos em vias públicas, a repressão das manifestações com uso da força pela polícia e a prisão de manifestantes que se opuserem à dispersão. “Este ministério não vai permitir que a rua seja um caos. Queremos mudar a cultura do bloqueio (de vias)”, afirmou a ministra da Segurança, Patricia Bullrich, na última quarta-feira.

Ontem (18), em entrevista a rádios argentinas, Bullrich reiterou a intenção do governo em reprimir os manifestantes. “Se não saem em cinco ou dez minutos (após serem advertidos), nós vamos removê-los. Se não se retirarem, vamos proceder à liberação da rua. As forças de segurança poderão atuar de maneira imediata”, disse a ministra.

As manifestações públicas, tradicionais na Argentina, têm se intensificado desde a posse de Mauricio Macri em oposição a várias medidas implementadas pelo atual presidente, como tentativa de modificação da Lei de Meios e o fim dos subsídios estatais na tarifa de eletricidade, que levou a um aumento de 600% nas contas de luz. Além disso, a prisão da líder comunitária Milagro Sala, que faz oposição ao governador do estado de Jujuy, Geraldo Morales, aliado de Macri, tem motivado protestos diários nas últimas três semanas. Na quarta-feira, manifestantes fecharam estradas em vários pontos do país enquanto pediam pela libertação da ativista e deputada do Parlasul.

“Em um contexto em que tantos setores precisam se manifestar em defesa de seus direitos trabalhistas e sociais, (o governo) busca silenciá-los através deste protocolo que não tem outra finalidade que não a de disciplinar a sociedade”, declarou a deputada opositora Andrea Conde, do partido Frente para a Vitória (FpV), ao jornal argentino Pagina/12.

Para a deputada Myriam Bregman, da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT), a nova política está vinculada ao objetivo do governo argentino de “blindar o ajuste e impedir manifestações contra as demissões, pelo salário e contra os cortes de luz e a megamineração”. “Não é algo pequeno, se está limitando o direito ao protesto, que está contemplado na Constituição”, declarou ao La Nación. Parlamentares do FpV e da FIT apresentaram uma moção de repúdio à medida no Congresso argentino.

O Centro de Estudos Sociais e Legais (Cels), liderado pelo jornalista e escritor Horacio Verbistky, divulgou um comunicado em que denuncia que “a circulação se tornou mais importante do que a integridade das pessoas e do que os direitos ao protesto e à liberdade”. O Cels enfatizou também o perigo de permitir que as forças de segurança usem armas de fogo para dispersar protestos populares. A ministra Bullrich afirmou, porém, que os agentes usarão apenas armas não letais. “Haverá um uso mínimo da violência legítima, mas sem armas de fogo”, declarou.

Um dia após a aprovação do novo protocolo para manifestações, houve uma tentativa ontem por parte da Polícia Federal de impedir a marcha realizada toda quinta-feira pelas Mães da Praça de Maio em Buenos Aires. Os agentes tentaram impedir a entrada de ativistas da organização na icônica praça no centro da capital argentina, ocupada pelas Mães há quase 40 anos. Os policiais se recusaram a ceder aos pedidos dos manifestantes, que reiteraram que a marcha é realizada semanalmente há décadas, e só cederam após advogados da associação se apresentarem no local.

“Se querem nos bater, que batam; se querem nos prender, que prendam, mas ninguém vai nos tirar da Praça”, afirmou Hebe de Bonafini, uma das Mães, em discurso antes da manifestação. A ativista pediu que deputados do FpV acompanhem a marcha a partir da próxima quinta-feira para evitar impedimentos por parte da polícia.

Bonafini também levantou suspeitas sobre a visita do presidente dos EUA, Barack Obama, à Argentina, ter sido programada para o dia 24 de março, aniversário do golpe que instaurou a ditadura militar no país em 1976 e feriado nacional em memória às milhares de pessoas torturadas e desaparecidas pelo Estado naquele período. “Macri não o convidou para qualquer dia, mas sim para o 24 de março, para não nos deixar realizar a marcha”. Ela afirmou que as ativistas pretendem “encher a Praça, custe o que custar”.