Novo tremor abala prédios danificados no Haiti, mas não faz vítimas

ONU pede aumento nos contingentes militares e nas doações, e Congresso do Brasil marca para segunda-feira votação sobre aumento de tropas

Autoridades do Haiti temem que possa chegar a 200 mil o número de mortos. Até agora, 70 mil corpos foram enterrados em valas comuns (Foto: Marco Dormino. Reuters)

O novo terremoto que atingiu o Haiti nesta quarta-feira (20) provocou a queda de edifícios com estruturas abaladas, mas não há relatos de vítimas até o momento. O tremor de 6,1 graus na escala Richter é o mais forte dos sentidos desde o devastador fenômeno de 7,5 graus da semana passada, que provocou a morte de ao menos 100 mil pessoas, de acordo com os cálculos do governo local.

As agências internacionais relatam pânico no momento do terremoto, no início da manhã no horário local (em torno de 9h no horário de Brasília), e que militares correram para avaliar a possibilidade de novos desabamentos e fazer eventuais remoções.

“Foi muito forte. Cada novo tremor é assustador. Sentimos bem aqui (aponta para o estômago), porque depois da terça-feira da semana passada, nunca sabemos quão forte será”, disse Lenis Batiste, que acampava em cima da grama com duas crianças.

Desde a semana passada, milhares de pessoas decidiram voltar para casa com medo de novos tremores, apesar da sensação de insegurança em alguns pontos da capital. “A situação geral em Porto Príncipe continua estável, com uma violência limitada, localizada, e saques ocorrendo”, apontou o Escritório de Coordenação de Assuntos Humanitários da Organização das Nações Unidas (ONU).

Mas a prioridade das equipes de ajuda humanitária é o abastecimento de água e de comida, o atendimento aos feridos e o fornecimento de remédios. Além disso, há as questões de abrigo e saneamento e o sepultamento de cadáveres.

A Organização Internacional para Migrações (OIM) informou que pelo menos um milhão de pessoas precisam imediatamente de abrigo no país. O chefe da missão da OIM no Haiti, Vincent Houver, afirma que bairros inteiros estão vazios e que muitos decidiram ir para as casas de familiares ou amigos, muitas vezes sobrecarregando cidades que não têm condições de receber mais pessoas. Há 300 acampamentos “espontâneos” em Porto Príncipe, no qual moram quase 400 mil pessoas sem acesso à água.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki Moon, recomendou um aumento de 2 mil militares nas forças de segurança internacional, a Minustah, nos próximos seis meses. Ele pensa que é necessário praticamente dobrar a tropa restante de policiais haitianos. Dois mil dos 4,5 mil integrantes da polícia local morreram em decorrência do terremoto.

Por outro lado, o governo do Haiti rejeitou os 800 soldados oferecidos pela República Dominicana, país com o qual divide a ilha de Hispaniola e nutre tensas relações. A rejeição, sem declarações oficiais até o momento, foi informada por um diplomata ocidental que pediu anonimato. Segundo resolução desta semana do Conselho de Segurança da ONU, o número de militares estrangeiros na nação pode subir para 12.651 homens, frente aos 9 mil atuais. O Brasil, que comanda a Minustah, ofereceu o envio de mais soldados e o Executivo pediu ao Congresso que vote a resolução. De acordo com o presidente do Senado, José Sarney, uma sessão será marcada para segunda-feira (25) para que se autorize a viagem de mais 700 integrantes da Minustah. 

Tropas dos Estados Unidos

A polêmica de momento está em torno dos 12 mil militares dos Estados Unidos presentes no Haiti. Atores internacionais, entre eles a França, acusam que a presença estadunidense visa mais a repressão de eventuais atos de violência do que a assistência humanitária, ferindo preceitos definidos mundialmente.

A organização Médico sem Fronteiras reclama que os bloqueios militares feitos pelos Estados Unidos no aeroporto de Porto Príncipe atrasaram em três dias a chegada de assistência humanitária às vítimas. Françoise Saulnier, diretora jurídica da organização, acusou em entrevista à Reuters que cinco aviões levando 85 toneladas de alimentos e remédios ficaram parados no terminal aéreo desde domingo à noite. “Esses três dias criaram um enorme problema de infecções e gangrenas, com amputações que agora são necessárias, enquanto poderíamos realmente ter poupado isso a essa gente”.

O presidente da Bolívia, Evo Morales, engrossou o coro ao pedir uma reunião de emergência da ONU para impedir a intervenção militar dos Estados Unidos. Para ele, a presença das tropas do país do norte é desumana, selvagem e oportunista.”Ser sócio ou ter relações diplomáticas não se faz com ocupação militar, nem com tropas militares, nem com bases militares”, enfatizou o boliviano.

O país nega as acusações e enviou nesta quarta o navio-hospital Comfort, que deve permitir a realização de cirurgias. A falta de instalações médicas é um dos graves problemas enfrentados no pós-terremoto. Pacientes em estado grave muitas vezes não podem ser submetidos a cirurgias.

“Mesmo antes de todo este drama os hospitais aqui mal funcionavam”, disse Joel Beaubrun, olhando soldados dos EUA lançarem mantimentos do ar. “Dá para imaginar como está agora.”

Sem ter muitas saídas, o presidente René Preval pede que Estados Unidos e as forças da Minustah coordenem as ações de forma a ajudar os esforços de remoção das vítimas. Chegou a 121 o número de sobreviventes encontrados sob os escombros. Mais quatro pessoas foram resgatadas nas últimas horas, entre elas um bebê de 22 dias e um menino de três anos.

Apesar de todos os esforços, a ONU adverte que ainda não existe um sistema formal de distribuição das doações e que, apesar dos massivos envios internacionais, as necessidades são maiores que a resposta oferecida até agora. “Sabemos que o mundo quer nos ajudar, mas já faz oito dias e ainda não vi comida ou água para a minha família”, constata o sobrevivente Gille Frantz, vendo o desembarque de tropas norte-americanas perto do devastado palácio presidencial.

Brasil

O Exército informou a identificação do corpo do Major Márcio Guimarães Martins, que era dado como desaparecido desde a tragédia. Ele servia na Brigada da Infantaria Paraquedista e desempenhava a função de Oficial de Estado-Maior do Batalhão de Infantaria da Força de Paz. Com a confirmação da morte de uma brasileira – que também tinha nacionalidade francesa e terá o corpo sepultado na Europa –, chega a 21 o número de brasileiros mortos pelo terremoto.

O Itamaraty anunciou para quinta-feira (21) uma cerimônia em homenagem ao segundo homem da ONU no Haiti, Luiz Carlos da Costa. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, confirmou presença na cerimônia. O corpo do vice-Representante Especial do Secretário-Geral da ONU na Minustah chega ao Brasil nesta quarta em um avião da Força Aérea Brasileira (FAB). O sepultamento deve ocorrer em Nova York na sexta-feira (22).

Com informações de Reuters, TeleSur e Agência ANSA.