Ação golpista do presidente de El Salvador tem como pano de fundo sua reeleição
Para Amauri Chamorro, Nayib Bukele não eleva tensão no país por empréstimo, mas visando testar instâncias e angariar apoio para alterar Constituição, que veta novo mandato presidencial
Publicado 11/02/2020 - 14h33
São Paulo – A tentativa de golpe do presidente de El Salvador, Nayib Bukele, tem como pano de fundo sua intenção de se reeleger. A avaliação é do analista e consultor internacional Amauri Chamorro. Neste domingo (9), o Legislativo salvadorenho denunciou que, para forçar a realização de uma sessão extraordinária que aprovasse um empréstimo internacional de US$ 109 milhões para um plano emergencial de segurança, o presidente enviou tropas da Polícia Nacional Civil e do Exército à Assembleia Nacional.
Amauri Chamorro, no entanto, avalia que por trás dessa crise política inaugurada por Bukele sob o argumento do plano de segurança, há na verdade uma investida para testar a capacidade das instâncias do Estado e garantir apoio popular para alterar a Constituição, que veta a reeleição no país.
“Ele quer declarar as instâncias do país inconstitucionais para poder convocar uma assembleia constituinte e assim modificar a Constituição e permitir que ele possa ser reeleito (…) E a Corte Constitucional, faz alguns meses, decidiu que um presidente, para que possa se lançar novamente presidente, tem de esperar pelo menos 10 anos. É isso que ele está tentando, pressionar para que a população saía às ruas e indicar que não existe legitimidade na Corte Constitucional e no parlamento”, explica o analista, na Rádio Brasil Atual.
Após a incitação do golpe por Bukele, que ainda convocou a população a se insurgir contra os parlamentares que se recusaram a votar o projeto a toque de caixa, a Corte Suprema de El Salvador declarou a ação do presidente inconstitucional, proibiu-o de utilizar as forças armadas para pressionar o poder Legislativo e contestou o ministro da Defesa e o diretor da Polícia. Ambos violaram a Carta Magna do país ao invadir o congresso. “Agora Nayib Bukele ficou de mãos atadas, porque a máxima Corte do país parou essa decisão dele”, diz Chamorro.
Em entrevista ao jornal espanhol El País, Bukele destacou ter dado uma semana de prazo à bancada dos parlamentares da oposição para aprovar o empréstimo, afirmando ainda que “tem todo o apoio para assumir ‘o controle de tudo'” e negando que tenha interesse em se reeleger. “Meu único desejo é deixar um legado e baixar ao mínimo a criminalidade em El Salvador”.
Eleito em primeiro turno por um partido pouco expressivo, em fevereiro de 2019, Bukele tornou-se conhecido pelo uso das redes sociais e seus discursos de combate à corrupção e à criminalidade, e com diversas críticas voltadas à imprensa e sem participação em qualquer debate eleitoral. Ainda no dia no pleito, chegou a ganhar uma infração do Tribunal Superior Eleitoral de El Salvador (TSE) por violar a “lei do silêncio”.