Equador declara ‘conflito armado interno’ e põe Exército nas ruas
Violência explode no Equador após presidente Daniel Noboa decretar estado de exceção. Um grupo de homens armados e encapuzados invadiu uma TV, que transmitiu ao vivo a ação dos criminosos
Publicado 09/01/2024 - 20h44
São Paulo – O presidente do Equador, Daniel Noboa, assinou nesta terça-feira (9) um decreto que declara o país em estado de “conflito armado interno” e ordena as Forças Armadas a “executar operações militares para neutralizar” grupos criminosos ligados ao narcotráfico, em meio a uma nova onda de violência nas principais cidades do país. O decreto de emergência classifica 22 grupos como “terroristas”.
A decisão se deu após homens armados com fuzis e granadas invadirem os estúdios do canal público de televisão TC, em Guayaquil, a maior cidade equatoriana. Quase ao mesmo tempo, os criminosos invadiram a Universidade de Guayaquil, tentando sequestrar alunos e professores. Além disso, também houve ataques ao comércio em diversas localidades.
A onda de violência é uma reação à decretação de estado de exceção em todo o país nessa segunda (8). Esta medida, por sua vez, ocorreu após a fuga do chefe da maior quadrilha criminosa equatoriana de um presídio em Guayaquil. A medida, que vale por 60 dias, inclui toque de recolher das 23h às 5h. E autoriza as Forças Armadas a apoiarem a polícia no patrulhamento das ruas.
Desde então, diversos episódios violentos foram reportados no Equador. O mais grave, conforme relatado pelas autoridades locais, é o sequestro de quatro policiais. Também há relatos de execuções de policiais e agentes penitenciários pelos grupos criminosos.
“Não se brinca com as máfias”, foi possível escutar durante a invasão ao canal de televisão, transmitida ao vivo. Encapuzados, os criminosos ameaçaram e agrediram os trabalhadores no local. A polícia mobilizou unidades especiais, que resgataram o pessoal da televisão e prenderam alguns membros do grupo. De acordo com a rede de TV Teleamazonas, outros meios de comunicação evacuaram o pessoal e fecharam as portas, temendo a repetição das cenas que foram registradas na TC.
Apoio e apreensão
Noboa, de 36 anos, venceu as eleições em outubro do ano passado prometendo acabar com os cartéis ligados ao tráfico de drogas no país, emulando o estilo do ultradireitista salvadorenho Nayib Bukele. No entanto, diante da onda de violência que toma conta do país, o ex-presidente progressista Rafael Correa manifestou “total e irrestrito” respaldo às medidas de exceção adotadas pelo novo mandatário.
“Compatriotas, o país vive um verdadeiro pesadelo. Algo impensável, inimaginável até pouco tempo, fruto da destruição sistemática do Estado de direito, dos erros e ódios acumulados nos últimos sete anos, dos quais temos sido uma das principais vítimas. Mas hoje é momento de unidade nacional”, afirmou Correa, pelas redes sociais.
O jornalista João Paulo Charleux, por outro lado, alertou para a supressão de vários direitos humanos e civis, a partir do novo decreto de Noboa. Isso porque ao declarar “conflito armado interno”, as Forças Armadas passam a ter uma atuação militar propriamente, e não mais com o perfil de “Garantia da Lei e da Ordem”, em cooperação com as forças policiais, conforme a decretação do estado de exceção.
Governo reconhece a existência de grupo(s) armado(s) organizado(s) de perfil militar, com meios e métodos de guerra, existência de cadeias de comando de perfil militar e capacidade de exercer controle sobre porções do território do país, o que caracteriza um conflito interno …
— João Paulo Charleaux (@jpcharleaux) January 9, 2024
O governo tem com isso cobertura legal para exacerbar os padrões de uso da força para parâmetros de guerra, não mais parâmetros policiais. Isso blinda comandantes militares e autoridades políticas do risco de processos futuros. Mas limites legais seguem existindo …
— João Paulo Charleaux (@jpcharleaux) January 9, 2024
É uma guerra? Em termos leigos, sim. É o que se chama em outros contextos de guerra civil. O direito em si não usa esse termo. Tecnicamente, fala-se em conflito armado internacional (vulgarmente, guerra) e conflito armado não internacional (vulgarmente, guerra civil).
— João Paulo Charleaux (@jpcharleaux) January 9, 2024