América do Sul

Dívida: Argentina diz que é soberana e não se submete a fundos-abutre e aos EUA

Chefe de gabinete do governo de Cristina Kirchner afirma que decisão favorável a especuladores é absurda e que país não se submeterá. Presidenta adverte que nação não voltará ao inferno

Casa Rosada

Cristina aproveitou inauguração de fábrica de uma montadora japonesa para afastar risco de dano econômico

São Paulo – O governo da Argentina reiterou hoje (24) a visão de que não será necessário declarar moratória em consequência da decisão da Justiça de Nova York, nos Estados Unidos, que dá razão a detentores de títulos da dívida pública da nação sul-americana na disputa com a Casa Rosada. O chefe de Gabinete de Cristina Fernández de Kirchner, Jorge Capitanich, reiterou que a posição oficial é de “defesa da dignidade nacional, da nossa soberania”.

Nos Estados Unidos continuam sendo realizadas negociações entre os responsáveis pela ação vitoriosa e o governo argentino. No começo deste mês o juiz Thomas Griesa deu razão aos investidores dos chamados fundos-abutre que se sentiram prejudicados pelos acordos firmados pelo governo de Néstor Kirchner entre 2005 e 2010. Neste período a Casa Rosada conseguiu chegar a consenso com 92,4% dos detentores de títulos da dívida que não foram pagos devido à moratória declarada após a crise social e econômica de 2001-02.

“Não podemos sofrer a submissão de abutres e juízes que não respeitem a condição de país soberano, nem de países que pretendem violar a soberania e a vontade de um povo”, afirmou Capitanich durante entrevista coletiva na Casa Rosada. “O tempo passa, a Argentina segue seu ritmo normal e cumpriu com sua responsabilidade. Aqui não pode haver alteração das condições. Está clara a posição da Argentina, sua vontade de pagar.”

Esta semana Griesa rejeitou pedido de liminar apresentado pela Argentina para estender o prazo de negociação relativo ao pagamento de US$ 1,33 bilhão devido aos autores da ação movida em Nova York. Com isso, termina no dia 30 o prazo para que o país honre este compromisso.

O problema é que uma cláusula, chamada Rufo, prevê que os detentores de títulos que já haviam aceitado negociar o pagamento tenham direito a qualquer acordo posterior mais vantajoso, o que torna inviável a situação do país sul-americano. A administração peronista interpreta esta cláusula de outra maneira: a leitura é de que a Rufo impede que se firme qualquer acordo mais benéfico depois que 92,4% dos credores aceitaram as condições negociadas com a Argentina.

Na visão do governo, por isso não há possibilidade de declaração de moratória. Ontem, Cristina afirmou que está disposta a honrar as dívidas com 100% dos credores desde que seja de uma forma considerada “legal e sustentável”. “O país não vai cair em moratória por uma razão tão óbvia que não teria nem que dizê-la: em moratória entram os que não pagam, e a Argentina pagou.”

Ao mesmo tempo, ela cobrou apoio mesmo dos que são contrários ao governo “porque não podemos voltar atrás ao inferno da dívida externa”. Cristina avaliou que a vontade de negociação da Argentina se expressou em vários momentos desde a quebra ocorrida na virada de 2001 para 2002, entre eles pelo pagamento de US$ 190 bilhões em dívidas. “Esta presidenta não vai assinar nada que comprometa o futuro da Argentina, como fizeram outros ao assinar qualquer coisa que logo tivemos de vir nós para se responsabilizar. Não vão me fazer assinar qualquer coisa ameaçando-me com que o mundo viria abaixo.”

O cientista político Emir Sader, colunista da RBA, classifica como “inflexível” a postura do juiz norte-americano. “A Argentina está batendo nele, até o FMI está contra esse juiz, porque acredita que inviabiliza renegociar qualquer país em dívida”, afirma em seu comentário de hoje à Rádio Brasil Atual.

Sader considera que existe um agravante neste caso que diz respeito à situação da economia argentina. Após uma década de recuperação, o país tem apresentado no segundo mandato de Cristina, iniciado no final de 2011, dificuldades na manutenção do crescimento do emprego e do Produto Interno Bruto (PIB), ameaçando um quadro recessivo este ano.

Ouça o comentário completo de Emir Sader na Rádio Brasil Atual: