Fake

Por foto com Putin e para mostrar ‘importância’, Bolsonaro se submete a todas as exigências do Kremlin

Encontro com o presidente russo tenta alimentar a falsa ideia de que o brasileiro tem o respeito dos principais governos do mundo, além de dar “munição” exército de aliados e robôs nas redes sociais

Alan Santos/PR
Alan Santos/PR
Para obter a foto do encontro, Bolsonaro esqueceu seu combate a medidas sanitárias no Brasil

São Paulo – Em encontro que rendeu foto para usar na campanha eleitoral, Jair Bolsonaro discursou no Kremlin ao lado do presidente russo Vladimir Putin. A fala foi em parte dirigida ao chamado cercadinho. “Compartilhamos de valores comuns, como a crença em Deus e nos valores da família”, disse. “O mundo é a nossa casa, e Deus está acima de todos nós. Pregamos a paz e respeitamos todos aqueles que agem dessa maneira. Paz para o mundo”, declarou ainda. O chefe do governo brasileiro vai usar a agenda na Rússia, um dos símbolos do comunismo no século 20, para “vender” no Brasil uma liderança que não tem.

Paea isso, a foto com Putin era crucial. O presidente brasileiro está isolado e precisa ter o que mostrar na campanha para se contrapor a Luiz Inácio Lula da Silva. Em novembro, o petista foi recebido na Europa por líderes como o presidente francês, Emmanuel Macron, o primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, e o então novo chanceler alemão Olaf Scholz.

Ao mesmo em que tenta alimentar a falsa ideia de que é respeitado por políticos importantes no mundo, Bolsonaro também dá gás ao exército de aliados e robôs nas redes sociais para fomentar a disseminação de fake news ou informações distorcidas.

Já para o presidente da Rússia, o encontro com Bolsonaro (assim como com o argentino Alberto Fernández semanas atrás) foi importante para marcar posição em países da América Latina, o “quintal” dos Estados Unidos. Putin usa “a lógica de dividir o Ocidente, pela qual é melhor incentivar a divisão (dos aliados dos Estados Unidos)”, na avaliação de Giorgio Romano Schutte, professor de Relações Internacionais e Economia da Universidade Federal do ABC (UFABC).

Estratégia: fake news

Em plena crise entre Rússia e Ocidente/Estados Unidos sobre uma “iminente” invasão da Ucrânia que, tudo indica, não vai acontecer, aliados do presidente brasileiro já mostraram a intenção de criar fake news em torno da visita. Ontem. usaram um “recuo” tático de Putin em relação a suas tropas na Bielorússia para dizer que, com sua viagem, Bolsonaro teria evitado a terceira guerra mundial.

A informação bizarra foi divulgada pelo ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, via Twitter. A própria CNN Brasil desmentiu a “informação”, já que foi envolvida por Salles. A emissora postou o desmentido na mesma rede, acusando a “montagem que atribui à CNN a informação de que Bolsonaro evitou a 3ª Guerra Mundial”. A emissora norte-americana afirmou no tuíte que “a frase mentirosa entra como suposta causa do recuo do presidente da Rússia para invasão da Ucrânia”.

Salles e o ministro do Meio Ambiente, Gilson Machado, compartilharam montagem com suposta matéria de capa da revista Time segundo a qual Bolsonaro teve “papel fundamental” na crise entre os países e seria indicado ao Nobel da Paz”.

Tudo por uma foto

Pessoas como Salles e Machado sabem que essas informações são mentirosas. Mas a intenção é justamente que elas sejam disseminadas em redes sociais, inclsive nos grupos de família de WhatsApp e Telegram. Devido às rígidas regras sanitárias do Kremlin, o governo russo exigiu que  Bolsonaro ficasse confinado em seu hotel, em Moscou, até a reunião com Putin.

Mas, antes da reunião, o presidente brasileiro iniciou a visita oficial à Rússia em uma irônica cerimônia em que ofereceu flores no Túmulo do Soldado Desconhecido, como fazem chefes de Estado que vão à Rússia. Fora essa aparente contradição de visitar um túmulo comunista, Bolsonaro teve de fazer cinco testes de covid-19 desde sua saída do Brasil até o encontro com Putin, para poder encontrar o líder russo de perto.

Para obter a foto do encontro, Bolsonaro esqueceu seu combate a medidas sanitárias no Brasil, à ideia de lockdown e isolamento social para combater a pandemia e se submeteu a todas as condições. Sem isso, seria obrigado e se sentar a uma mesa de cinco metros, como fizeram o alemão Olaf Scholz e o francês Emmanuel Macron, que evitaram os protocolos para supostamente evitar terem seu DNA “roubado”.

Já o argentino Fernández, como Bolsonaro, se dispôs a seguir todas as exigências do Kremlin e foi recebido por Putin em encontro “face a face”.