Cidadania

Depois de Inglaterra, Irã e Dinamarca, Alemanha adere a protestos na Copa

“Direitos humanos são inegociáveis”, afirmaram alemães antes de jogo. Equipes e autoridades driblam proibições e censura

Reprodução/Montagem RBA
Reprodução/Montagem RBA
Ingleses ajoelhados contra o racismo e alemães com as mãos à boca contra a censura: outro lado do futebol

São Paulo – A Copa do Mundo, que começou no domingo (20), já reservou algumas surpresas na primeira rodada. Foram os casos da vitória da Arábia Saudita sobre a Argentina, ontem (22), e do Japão diante da Alemanha, nesta quarta-feira (23). Em ambos os casos, por 2 a 1, e de virada. Mas o torneio disputado no Catar se destaca também por protestos de algumas equipes, apesar da forte vigilância da Federação Internacional de Futebol (Fifa).

Na segunda-feira (21), por exemplo, antes do início do jogo contra o Irã, os atletas da seleção inglesa se ajoelharam em protesto contra o racismo. Eles repetem esse gesto desde o assassinato de George Floyd, em 2020, nos Estados Unidos, crime que amplificou o movimento Black Lives Matter (Vidas negras importam) pelo mundo. Segundo o técnico do time, Gareth Southgate, é uma atitude que tem repercussão mundial e pode influenciar em particular os mais jovens. “Queremos que todos percebam que a inclusão é importante”, declarou.

Movimento LGBT

Nessa mesma partida, vencida pelos ingleses por 6 a 2, torcedores iranianos se manifestaram por direitos das mulheres em seu país. Eles também protestaram contra a morte da jovem Mahsa Amini, de 22 anos, presa pela “polícia moral” sob acusação de infringir o código de vestimenta feminino. Ele morreu três dias depois e o governo alegou doença, mas a família fala em violência.

A Copa também é marcada pela proibição da Fifa do uso de braçadeira de apoio ao movimento LGBT. Algumas seleções desistiram da manifestação, por receio de sofrer retaliações. Mas, hoje, os jogadores da Alemanha, ao posar para a tradicional foto antes da partida, puseram a mão à boca, simbolizando censura. A transmissão oficial não mostrou o protesto. A federação alemã disse que não se tratou de protesto político: “Direitos humanos são inegociáveis”.

Além disso, a ministra do Esporte da Alemanha, Nancy Faeser, usou a braçadeira One Love na tribuna do estádio Khalifa durante a abertura do jogo como Japão. Ela estava sentada ao lado do presidente da Fifa, Gianni Infantino, entidade que proibiu o uso do adereço pelos capitães das seleções. Entre eles o goleiro alemão Neuer, que pretendia entrar com a braçadeira.

Antes, nesta terça (22), o time da Dinamarca entrou em campo vestindo camisas sem o emblema da seleção e sem a marca do fornecedor do uniforme. Objetivo era não exibir nem a marca, nem a imagem da confederação do país. Mas a equipe acabou tendo de estampar ao menos a bandeira nacional, como forma de identificar a seleção.

Crimes e abusos

Para o colunista Jamil Chade, do portal UOL, o gesto dos alemães já entrou para a história. Ele criticou a postura da Fifa, que tenta sufocar manifestações politicas, mas não se importa se os campeonatos que organiza são disputados em países com ditaduras e regimes autoritários.

“Não se pode fazer um gesto de defesa dos direitos humanos durante um evento esportivo. Mas se permite que aquele mesmo torneio seja manipulado para abafar crimes e abusos. Não se permite levantar o uniforme para mostrar uma mensagem de apoio à democracia ou ao movimento LGBT. Mas se premia regimes autoritários no Catar e em tantos outros lugares com a concessão de direitos de sediar grandes eventos”, escreveu o jornalista.

Durante a transmissão de Alemanha x Japão, na manhã de hoje, o comentarista Maurício Noriega, do canal SporTV, também criticou a Fifa por ter “medo da realidade”. Para ele, a entidade organiza eventos esportivos, mas não pode controlar a opinião das pessoas.