Juiz autoriza casal homoafetivo a adotar mesmo sobrenome

Magistrado entende que há amor na relação e, portanto, a constituição de uma família; na Argentina, movimentos sociais protestam contra cancelamento do primeiro casamento latino-americano entre homossexuais

A Justiça de São Paulo decidiu autorizar um casal gay a usar o mesmo sobrenome. O juiz Guilherme Madeira Dezem, da 2ª Vara de Registro Público de São Paulo, emitiu sentença na segunda-feira (30) que permite que um dos companheiros utilize o nome do outro como forma de que a dignidade não seja afetada.

O entendimento é de que o sobrenome em comum é importante para a maneira como os dois são vistos perante a sociedade, sendo considerados um casal. O juiz levou em consideração que a adoção do mesmo nome é também uma forma de homenagem.

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“Entendo que eles constituem uma unidade familiar na medida em que considero que a tônica da existência da família é o amor, pouco importando o gênero da união. Como o companheiro pode adotar o nome da companheira e vice-versa, estendi para eles o raciocínio”, afirmou Dezem à Rede Brasil Atual.

O Ministério Público, por outro lado, manifestou-se contra a aceitação da ação por entender que não há reconhecimento legal sobre o tema. Do ponto de vista de direitos de patrimônio ou de herança, a sentença não significa qualquer mudança.

Agora, o casal tem 30 dias para oficializar a mudança de nomes. De acordo com o Portal Mix Brasil, o advogado Hermano Leitão classificou a decisão como um marco na Justiça de São Paulo no que diz respeito às uniões homoafetivas.

Criminalização

Enquanto isso, o Senado prepara na Comissão de Direitos Humanos a votação do Projeto de Lei 122 de 2006, que criminaliza os crimes de preconceito, seja por raça, orientação sexual, origem ou etnia.

Esta semana, a Agência Senado encerrou enquete sobre o assunto. Votaram 465.326 pessoas, número mais alto nesse tipo de consulta, superando a questão das cotas raciais, que havia mobilizado 360 mil votos. O resultado, sem valor científico, é de 51,54% contrários ao projeto, e 48,46% a favor. 

Depois de passar pela Comissão de Direitos Humanos, a matéria deve ser aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e pelo plenário do Senado antes de retornar à Câmara, onde precisa de nova votação.

O juiz Guilherme Madeira Dezem entende que há mecanismos suficientes no Código Penal para punir o crime de preconceito, e que não é preciso pensar em novas leis sobre o tema, sendo suficiente a indenização financeira por danos morais. Ele pensa que o mais interessante seria os parlamentares pensarem na legalização da união homoafetiva. “Não vejo porque não. O Congresso precisa, para acabar com todas as polêmicas havidas no Judiciário, editar uma lei que pacifique a questão”, argumenta.

Argentina

O casal homossexual argentino que havia obtido o direito do casamento prometeu nesta terça-feira (1º) apelar do decreto de última hora que provocou a suspensão da primeira cerimônia do tipo na América Latina.

Alex Freyre, de 39 anos, e José Maria Di Bello, de 41, conseguiram uma licença de casamento de um juiz municipal há duas semanas. Surpreendentemente, o conservador prefeito de Buenos Aires, Mauricio Macri, agiu diferentemente daquilo que vinha defendendo em outras ocasiões e decidiu apoiar a união, mesmo sofrendo pressões da Igreja e de copartidários.

Mas, na segunda-feira, a juíza federal Marta Gómez Alsina ordenou a suspensão do casamento, que ocorreria, por decisão do casal, no Dia Mundial de Combate à Aids, uma forma de demonstrar que não apenas os homoafetivos podem levar uma vida sem limitações, mas também os soropositivos.

A prefeitura de Buenos Aires e o casal decidiram apelar para a Suprema Corte argentina, que já recebeu o pedido de revisão da decisão. A advogada do casal, Maria Rachid, afirmou à Reuters que vai processar a juíza por ir contra a lei.

A decisão provocou protestos por parte de movimentos sociais argentinos. Paula Martinez, integrante da associação Vox, que luta pelos direitos LGBT, entende que a pressão dos bispos contou a favor da suspensão do casamento. “Algum telefone tocou por aí e a juíza tomou a decisão. Por sorte, a igreja está perdendo legitimidade nesse sentido. Devem saber que os gays e as lésbicas, se não conseguirem isso agora, conseguirão em outro momento”, afirma à reportagem em conversa telefônica.

A Argentina foi o primeiro país latino-americano a permitir uniões entre pessoas do mesmo sexo, o que garantia alguns direitos legais para casais do mesmo sexo, mas frustrava outros, como o direito à adoção de crianças.

Para os movimentos sociais, a importância da liberação jurídica do primeiro casamento homoafetivo é a criação de uma jurisprudência que permitirá outras uniões do tipo e a pressão para que o Congresso tenha de legislar sobre o assunto.