Interesse ideológico?

Deputado questiona Tarcísio sobre troca de nome de assentamento do MST

Projeto de Assentamento Che Guevara, formado em 1991, teve o nome alterado para ‘Projeto de Assentamento Irmã Dulce’ em portaria, sem consulta aos moradores. Paulo Fiorilo (PT) contesta a necessidade de mudança

Diógenes Rabello/MST
Diógenes Rabello/MST
Agricultores familiares também cobram que o decreto seja revogado e que o assentamento siga com o "nome escolhido pelas famílias assentadas no seu processo de luta pela terra", destacam

São Paulo – O deputado federal Paulo Fiorilo (PT), líder da Federação PT/PCdoB/PV na Assembleia Legislativa de São Paulo, protocolou nesta quarta-feira (27) um requerimento de informação questionando o governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) sobre a mudança do nome de um assentamento da reforma agrária do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Mirante do Paranapanema, no interior.

A alteração consta na Portaria 25/2024, publicada ontem (26) no Diário Oficial do Estado, pela Fundação Instituto de Terras (Itesp), vinculada à Secretaria de Agricultura e Abastecimento. A medida estabelece que o Projeto de Assentamento Che Guevara é agora oficialmente conhecido como Projeto de Assentamento Irmã Dulce. O Itesp é o órgão responsável por planejar e executar as políticas agrária e fundiária do estado. No entanto, nenhuma das 46 famílias que vivem da agricultura familiar no assentamento foram consultadas sobre a mudança.

O novo nome imposto pelo governo Tarcísio também foi considerada uma troca “abitrária” pelo MST. Primeiro na região do Pontal do Paranapanema, o assentamento é uma ocupação datada de 1991. Três anos depois, o movimento obteve a homologação definitiva, resultando em um histórico de 30 anos de formação. Para o deputado estadual, o órgão não explicou a razão da alteração. No documento, o parlamentar questiona se a portaria decorreu de uma “provocação” ou foi determinada de “forma unilateral” pelo diretor executivo da Fundação Itesp, Lucas França Bressanin.

Disputa ideológica

O requerimento também cobra se houve consulta pública às famílias produtoras, que denunciam não terem sido informadas. De acordo com Fiorilo, a “questão não é a nomenclatura em si, mas a necessidade de mudança”, afirmou em nota. “Com que parâmetros e objetivos essa decisão foi definida e se os assentados que estão na área há 33 anos foram consultados. Senão teremos aqui uma decisão ideológica e os atos públicos devem atender ao interesse público”, observou o deputado.

“A alteração de denominação de um assentamento, assim como todos os atos públicos, deve atender ao interesse público. Neste caso, impõe-se a alteração de um nome já conhecido por todos para, sem consulta aos moradores do assentamento, uma nova denominação atendendo ao gosto do Diretor Executivo da Fundação Itesp que deveria estar preocupado em seu ofício de gestor público”, acrescentou a representação parlamentar.

No texto da portaria, Bressanin informa apenas “ser de notório conhecimento que a Sra. Maria Rita Sousa Brito Lopes Pontes, conhecida como Irmã Dulce, foi uma mulher que dedicou sua vida a obras de caridade, trabalhos sociais e assistência aos mais necessitados, sendo assim uma figura que tanto contribuiu com o país e foi indicada ao Prêmio Nobel da Paz”. O diretor-executivo do Itesp também comentou a mudança nas redes sociais, como uma homenagem ao mês das mulheres.

Agricultores cobram revogação

O MST avalia, porém, que a decisão de tirar o nome de um dos líderes da revolução cubana não é somente “autoritária e antidemocrática”. E tem como objetivo “descaracterizar o histórico da luta pela terra na região do Pontal do Paranapanema”. “Todos foram tomados de surpresa com essa notícia, desta arbitrariedade do governo do estado de São Paulo partindo do Diretor Executivo do Itesp. Nós vemos todos, aqui no assentamento, que é uma disputa ideológica por parte do governo do Estado”, contestou o assentado Felinto Procópio, conhecido pela comunidade como Mineirinho.

Os agricultores familiares também cobram que o decreto seja revogado e que o assentamento siga com o “nome escolhido pelas famílias assentadas no seu processo de luta pela terra”, destaca Mineirinho. “Primeiro porque esse nome é um nome que já pertence ao assentamento. Já pertence à história do assentamento. Segundo que ninguém foi consultado, nenhuma das famílias foi consultada da intenção do governo do Estado de mudar o nome. Então, estamos pedindo a atenção de todos os aliados da Reforma Agrária a atenção para este fato.”

O governador Tarcísio tem um histórico de críticas ao MST. Em 2022, durante campanha eleitoral, ele contestou ocupações do movimento e desde que assumiu o Palácio dos Bandeirantes vem mostrando sua simpatia ao setor do agronegócio. O republicano foi quem efetivou a lei de terras devolutas, que são áreas públicas ocupadas ilegalmente e que nunca tiveram uma destinação definida pelo Estado. Com a medida, grandes fazendeiros invasores foram beneficiados ao obterem descontos que chegaram a 90% para regularização de suas propriedades. O município onde fica o assentamento renomeado também está localizado em uma região conhecida pela atuação dos sem-terra.

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