Especulação

Movimento Parque Augusta entra com ação para que portões de área verde sejam abertos

Decreto e termos da escritura do terreno garantem acesso público a bosque. Portões da área na região central estão fechados desde 28 de dezembro. Ativistas querem que espaço se torno parque municipal

Daniel Ambooleg/Parque Augusta

Expropriação e troca por outras áreas na cidade são apontadas como opções ao pagamento do valor de mercado

São Paulo – Advogados do Movimento Parque Augusta vão protocolar na tarde de hoje (8) ação para que portões do terreno de 24 mil metros quadrados na rua Augusta, no centro de São Paulo, sejam abertos à população. Consta da escritura da área, de 1986, que o acesso ao bosque dentro do terreno seja livre, mas desde 28 de dezembro os portões que garantiam o trânsito de pedestres foram fechados.

No começo de dezembro, o prefeito Fernando Haddad (PT) sancionou um projeto de lei que prevê a construção de um parque no terreno, uma antiga reivindicação de moradores do entorno. Mas antes que isso ocorra é preciso desapropriar a área, que é privada. Em novembro, o antigo proprietário anunciou a venda para as empresas Cyrela e Setin, que teriam um projeto de construção de duas torres residenciais.

Os grupos articulados para que a área se torne um parque público, no entanto, acreditam que o anúncio foi uma forma de o real proprietário, o ex-banqueiro Armando Conde, valorizar ainda mais o terreno já que a prefeitura teria a preferência na compra, graças a um Decreto de Utilidade Pública publicado em março de 2012 e válido até março de 2017, além da indicação que consta da própria escritura. Procuradas pela RBA, Cyrela, Setin e a prefeitura não se pronunciaram. A secretária de Armando Conde, no entanto, confirmou o negócio.

“Seria obrigatória a oferta primeiro para a prefeitura e, caso o negócio tivesse sido realizado, era preciso constar uma pré-anotação na matrícula do terreno, o que não existe”, afirma o advogado Luiz Guilherme Ferreira, do grupo Advogados Ativistas que está apoiando o Movimento Parque Augusta.

Tatiana Bianconcini, do grupo Aliados do Parque Augusta, acredita que o terreno nunca esteve apto para a construção de edifícios e que todas as informações foram uma “encenação” para valorizá-lo. O mesmo motivo teria levado ao fechamento dos portões que davam acesso ao bosque, o que tem mantido um grupo de vigília na calçada da área verde desde 28 de dezembro, aumentando a pressão para que a prefeitura tome atitude em relação ao caso.

Especulação Imobiliária

Diante do acreditam ser uma jogada de especulação imobiliária, os ativistas têm procurado formas para que a administração municipal pague menos ou nada pela área.

“Estamos atrás de informações para saber se eles devem IPTU ou outros impostos. O mecanismo com o qual nós mais simpatizamos é a expropriação, por meios legais ou pelo tomada popular, que seria o mais justo por vários motivos. O principal deles é que o dono é um ex-banqueiro, que já é bem rico, e não há por que enriquecê-lo mais”, afirma Rafael Pelleti, do Movimento Parque Augusta. Armando Conde era dono do BCN, vendido para o Bradesco.

Caso a área tenha sido realmente vendida para as construtoras, Tatiana acredita que será preciso verificar se elas não têm envolvimento com os desvios de Imposto Sobre Serviço (ISS). A Cyrela, por exemplo, aparece em uma lista encontrada no computador de um dos fiscais investigados apresentada pelo Ministério Público. Outra opção, aponta Tatiana, é a prefeitura trocar a área por outra.

Para o urbanista do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos, Luiz Kohara, as dificuldades em relação aos custos da terra são um grande entrave para a realização de políticas públicas que disso dependem.

“A propriedade da terra é um dos principais entraves na política urbanística da cidade. Na teoria, se fala em desapropriação para garantir função social, mas para isso é preciso pagar valores altíssimos aos proprietários, o que muitas vezes inviabiliza o projeto. O especulador ganha muito dinheiro, pago com recurso público”, afirma.

Kohara explica que a oferta inicial do poder público é sempre feita com base em uma perícia realizada por técnicos da própria prefeitura, questionada por perícias feitas então pelo proprietário. Ao final, cabe ao judiciário dizer qual é o valor correto com base em uma outra perícia solicitada por ele. “Sempre se chega a valores altíssimos. A questão da terra é a mais retrógrada dentro do judiciário e muitas vezes há peritos comprometidos com a especulação”, afirma.

Problema semelhante vem sendo enfrentado pela ocupação Prestes Maia, na região da Luz. Segundo avaliação da prefeitura, a desapropriação do prédio, ocupado por 450 famílias desde 2010, custaria R$ 40 milhões. O valor é quase seis vezes maior do que os R$ 7 milhões apontados no estudo contratado pelo movimento a escritórios de arquitetura, que afirmam que a dívida do prédio com a administração municipal ultrapassa seu valor de mercado.