Sem violência

Sem PM, marchas pacíficas se multiplicam e ganham São Paulo

Após repercussão negativa de repressão policial, manifestantes encontram vias livres para protestar. Grupo força portão do Palácio dos Bandeirantes. Novo ato será nesta terça

Após a repressão da última semana, mais movimentos e pessoas individualmente aderiram ao protesto <span>(Mídia Ninja/CC)</span>Um dos braços da marcha tomou a Marginal do Rio Pinheiros (Mídia Ninja. CC) <span></span>"O povo acordou" foi um dos principais cantos entoados hoje. (Mauricio Camargo/Brazil Photo Press /Folhapress) <span></span>Manifestantes tomam a Ponte Estaiada, símbolo do uso exclusivo do automóvel (Mídia Ninja.CC) <span></span>

São Paulo – Com baixa presença da Polícia Militar, dezenas de milhares de pessoas fizeram hoje (17) em São Paulo uma das maiores manifestações das últimas décadas. A marcha, inicialmente concentrada no Largo da Batata, zona oeste da cidade, multiplicou-se e tomou várias das principais vias da cidade. Os protestos inicialmente cobravam que o prefeito da capital, Fernando Haddad (PT), e o governador Geraldo Alckmin (PSDB) recuassem na decisão de reajustar os preços de ônibus, trem e metrô de R$ 3 para R$ 3,20. Mas, hoje, o ato ganhou um caráter maior, com pautas variadas, ainda que a mobilidade urbana siga como motivação central.

“Que coincidência. Não tem polícia, não teve violência”, celebraram os manifestantes. Após a repressão da última quinta-feira, que provocou protestos de grupos de defesa dos direitos humanos, o governo estadual decidiu deixar de reprimir os manifestantes, que puderam se deslocar livremente pela capital. Chamou atenção a baixa presença de PMs, que no geral se limitaram a acompanhar as marchas e a negociar com os organizadores.

Uma parte da manifestação foi à Avenida Paulista, tradicional ponto de concentração de protestos, e de lá um grupo foi em direção à Avenida 23 de maio, importante via de ligação do centro com outras regiões da cidade. Pela Avenida Faria Lima caminharam outros manifestantes, que subiram à Ponte Estaiada, local em que se encontraram com os que decidiram seguir pela Marginal do Rio Pinheiros.

De lá uma parte dos manifestantes tomou a direção do Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista. Alguns dos integrantes do protesto decidiu forçar um dos portões do palácio, e a Tropa de Choque lançou bombas de “efeito moral”. Até o momento não há notícias sobre feridos.

Os presentes ao ato rechaçaram o uso de bandeiras de partidos ou contra políticos, pedindo aos que portam este tipo de mensagem que não a exponham ao público.

Após o sucesso da marcha, o MPL decidiu convocar uma nova manifestação para amanhã (18), com concentração marcada para 17h na Praça da Sé, região central da cidade.

O protesto ocorreu na véspera de uma reunião pública do Conselho da Cidade, convocada pelo prefeito Fernando Haddad (PT) para discutir a reação popular ao aumento. Representantes do Movimento Passe Livre estão convidados para apresentar suas críticas e propostas. E já confirmaram presença, alertando que o encontro de Perto de 260 mil pessoas confirmaram presença no ato pelas redes sociais, como o Facebook.

As passagens de ônibus, trem e metrô subiram de R$ 3 para R$ 3,20 no último dia 2, graças a um acordo entre os governos estadual e municipal. O reajuste, de 6,67%, ficou abaixo da inflação, como Haddad havia prometido em sua campanha eleitoral. Entre janeiro de 2011, quando do último aumento, e junho de 2013, a inflação acumulada no período foi de 15,5%. O esforço foi viabilizado porque o governo federal, preocupado com o impacto do aumento sobre os índices de inflação, pelos quais vem sendo duramente criticado por economistas, escolheu zerar a alíquota de PIS e Cofins que é paga pelas empresas de ônibus, metrô e transporte de passageiros por barcos.

Ainda assim, quatro dias depois, dia 6, uma quinta-feira, ocorria a primeira manifestação pública contra o reajuste. A segunda foi marcada para o dia seguinte, sexta-feira (7). Novas marchas aglutinaram milhares de paulistanos na terça-feira (11) e na quinta-feira (13). Conforme a mobilização cresceu em força e número de manifestantes, incrementou-se a repressão policial. O número de PMs enviados para dispersar o protesto mais que dobrou entre terça e quinta-feira: foi de 400 para 900 homens – nos quais estava incluído um destacamento da cavalaria.

O endurecimento havia sido anunciado pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) no dia anterior. Como resultado, 232 pessoas foram detidas, segundo a Secretaria de Segurança Pública, e, de acordo com o MPL, mais de 150 acabaram feridas com maior ou menor gravidade. Demonstrando descaso com o bem-estar da população, a Tropa de Choque utilizou bombas de gás lacrimogêneo vencidas há mais de dois anos – o que poder trazer riscos à saúde, segundo o próprio fabricante.

Até os trabalhadores da imprensa sofreram o peso dos cassetetes. Uma repórter da RBA foi agredida no rosto e na nuca pelos porretes da PM enquanto cobria a repressão na Avenida Paulista. Uma jornalista da Folha de S. Paulo e um fotógrafo da Agência Futura Press foram atingidos no olho por tiros de bala de borracha. Assim como dezenas de manifestantes, um repórter da revista Carta Capital foi levado à delegacia para averiguações antes mesmo da marcha apenas por trazer uma garrafinha de vinagre na bolsa – líquido que, além de temperar saladas, serve para amenizar os efeitos do gás lacrimogêneo.

A operação policial da última quinta-feira (13) – desatada logo no início do protesto e sem que houvesse qualquer arroubo de vandalismo por parte dos manifestantes – sensibilizou a sociedade paulistana. Alguns meios de comunicação que até então criticavam as mobilizações e pediam mais rigor policial contra os arruaceiros passaram a dar mais destaque à atuação descabida da PM. Alguns políticos também amainaram seus discursos. Um deles foi o prefeito de São Paulo. No início dos protestos, Haddad tentou repetidas vezes deslegitimar a mobilização, que classificava como minoritária e violenta. Agora, o prefeito passou a criticar a ação policial e abriu canais de diálogo com representantes do Movimento Passe Livre.

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