Os ‘blacksurdos’ de todo lugar: sintomas do nosso tempo

Ninja Mídia Black blocs ‘em ação’ no Rio. Falta definir as causas. Os efeitos já são conhecidos Há dois complexos esquizos que polarizam a vida cultural brasileira. De um lado, […]

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Black blocs ‘em ação’ no Rio. Falta definir as causas. Os efeitos já são conhecidos

Há dois complexos esquizos que polarizam a vida cultural brasileira.

De um lado, temos o “complexo de galinheiro”, ou seja, no grande e exótico zoológico mundial, onde pontificam as feras extraordinárias, águias imperialistas, leões colonialistas, ursos alpinos e albinos, tigres asiáticos, touros ibéricos, unicórnios gauleses, impérios do sol nascente, gigantes comunistas convertidos à azia capitalista etc., nós, brasileiros, seríamos um “puxadinho” onde habitam galinhas poedeiras e galinhos garnizés. Este é mantido pela mídia conservadora.

Do outro, o “complexo de império”: somos autossuficientes, nos explicamos por nós mesmos, as tendências internacionais se afogam no Atlântico, somos uma autogestão de tendências políticas. Mais lacônico, mas não menos complexo do que o outro. Este também é mantido pela velha mídia. E por vezes pela alternativa também.

O Brasil não foge às tendências mundiais. Pode segui-las retardariamente, ao compasso, ou pode até antecipá-las. Mas segue plugado, desde sempre, no capitalismo internacional de onde não arredará um passo. Pelas próximas décadas, pelo menos.

Vejam o caso agora dos “Black Bocs”, que ganharam fotos, vídeos e manchetes, inclusive na cena internacional. A tendência até que custou a chegar ao Brasil. Ou nele florescer. Mas chegou.

Visitando as manchetes e o noticiário, vê-se que a tendência de sua aparição é a de diluir as causas imediatas que levam às manifestações que eles passam a frequentar. Por exemplo, veja-se o caso da última terça-feira, 15 de outubro, no Rio e em São Paulo. O motivo das manifestações era a insatisfação dos professores, a  greve no Rio de Janeiro, a situação secularmente precária da educação no Brasil.

Pois bem, diante da intervenção dos Black Bocs e de suas depredações, com enfrentamentos com a polícia, tudo se dissolve, numa “insatisfação da classe média”, “ninguém nos representa”, rótulos que (des)qualificam o que seria um “inevitável peso do ser” brasileiro.

Bobagens, para não dizer mentiras ou acobertações. Mas assim é.

Os Black Bocs imitam o cenário internacional – curiosamente, mais alemão do que outros. Claro: há constantes cenas de depredação em Paris, Londres etc. Mas vêm da periferia, dos imigrantes muitas vezes. Só numa noite, nas vizinhanças do 14 de Julho em Paris, 300 carros foram incendiados. Em Londres, recentemente, houve protestos de jovens durante dias (noites, aliás), com enfrentamentos dramáticos com a polícia.

Mas aqui em Berlim há o estilo, marcadamente semelhante e copiado pelos Black Bocs brazucas: vestimentas pretas, capuzes, máscaras, enfrentamentos programados via internet. Aqui, presentes há décadas,  eles se autointitulam “Autonomen”.

Apresentam-se e são apresentados como transposições históricas de um movimento italiano – o “Autonomia Operaria”, dos anos 68/69. Também se chamaram e foram chamados de “Spontibewegung”,(Espontimovimento, numa tradução livre).

Vão às manifestações para roubar-lhes a cena. Invariavelmente, são preferenciais nas manchetes do dia seguinte, esvaziando o seu conteúdo político. São fascistóides nos métodos e nos comportamentos, apesar do verniz de esquerda. Tenho certeza: daqui a dez, 20 anos, a maioria esmagadora estará atrás de uma escrivaninha, bombeiros de ocasião, mas arrotando suas lembranças dos tempos de incendiários juvenis.

Aqui na Alemanha, como tudo é mais organizado, já há um protocolo. Eles se reúnem depois da manifestação principal (parece que a turma do Rio tentou imitar esta disposição, mas um grupo se antecipou a tudo, quando do protesto dos professores), saem em passeata, e o seu roteiro parece combinado com a polícia, que os espera de antemão num ponto estratégico, favorável ao ataque em massa dos soldados e à dispersão dos manifestantes em pequenos grupos que partem para a depredação de postos de gasolina, agências de banco, lojas, carros etc.

Como aí no Brasil, são jovens predominantemente de classe média, que se apresentam como anticapitalistas, antissistema, antitudo. Há diferenças: como as viagens aqui são baratas, nas grandes ocasiões, como o 1º de Maio ou alguma reunião do G-8, eles vêm de toda a Europa.

Parece que para eles a grande ocasião vai ser a Copa do Mundo no ano que vem. Preparem-se, apertem os cintos. Porque se a atenção da mídia internacional é seu objetivo, eles a terão. Há um frenesi em toda a mídia para “desconstruir” o Brasil, o que significa impedir a sua construção.

Já que o Brasil é uma alternativa à descalibrada pseudo-administração da crise mundial, que está levando a Europa à falência e os Estados Unidos ao desfalecimento, então que se desconstrua o Brasil, em nome de manter os pressupostos neoliberais que não funcionam em recanto algum do mundo.

E preparem-se sobretudo porque, nesta reedição do filme de Nicholas Ray, Juventude Transviada (no original, Rebels Without a Cause, com James Dean), os jovens de preto, onde eles aparecerem, terão vindo para ficar.

O Brasil não foge às tendências mundiais.