Vice aumenta alcance do PV, mas divergências persistem

Candidaturas ao Senado no Rio de Janeiro e tendência favorável a Serra em um eventual segundo turno com Dilma estão distantes de consenso

Marina ao lado de Guilherme Leal, um dos sócios da Natura e dono de uma das maiores fortunas do país (Foto: Divulgação PV)

Rio de Janeiro – “Agora temos o vice dos nossos sonhos”. Dessa forma, a candidata do PV à Presidência da República, Marina Silva, comemorou no domingo (16) a confirmação do empresário Guilherme Leal, dono da Natura, como seu companheiro de chapa. Expoente do grupo de empresários identificados por seu engajamento por modos de produção sustentáveis, Leal, que comanda uma das companhias brasileiras de maior faturamento, representa o apoio de setores industriais à candidatura verde.

Com fortuna estimada pela revista Forbes em US$ 2,1 bilhões. Ao compor a chapa com Leal, a intenção é ter na vaga de vice uma espécie de “José Alencar ambientalista”. Com Luiz Inácio Lula da Silva, Alencar foi eleito e reeleito em 2002 e 2006, formando uma dupla que combinava origem popular e operária com um empresário, dono de uma rede industrial importante.

“A presença de Guilherme Leal como meu companheiro de chapa tem a ver com esse movimento que vai além do Partido Verde e é um movimento da sociedade em defesa do Brasil. Queremos alianças com os núcleos vivos da sociedade. Hoje temos a felicidade de tê-lo aqui como filiado ao partido, inteiramente integrado ao projeto e alinhado aos seus propósitos”, disse Marina, referindo-se a Leal como “amigo, companheiro e irmão”.

Leal, que co-presidia a Natura ao lado do empresário Antônio Seabra, filiou-se ao PV em setembro do ano passado, mas sua relação política com Marina vem desde o final da década de 1990. Os elos aprofundaram-se durante o governo Lula, quando Marina foi ministra do Meio Ambiente e Leal presidente do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio). Leal também é fundador e membro do Instituto Ethos, representado no lançamento da candidatura verde pelo empresário Ricardo Young, nome da legenda ao Senado por São Paulo.

Segundo Leal, “a reflexão sobre aceitar ou não o convite de Marina não foi fácil”, apesar de sua proximidade com o projeto. “Mas, essa convocação é impossível de ser recusada. Ao longo dos últimos 30 anos, estou envolvido com as políticas públicas desse país, mesmo atuando no setor privado. Acredito que um Brasil mais justo e sustentável é possível e coloco minha experiência à disposição da sociedade brasileira. Temos pela frente uma oportunidade enorme de criar um país do século XXI, mas isso não se constrói sobre um modelo que esgota os recursos naturais”, disse.

Além de empresários, artistas também marcaram presença. Estiveram no palco o grande poeta Thiago de Mello e a cantora Adriana Calcanhoto, além de Paulinho Mocidade, que cantou o contagiante jingle da campanha verde. O maior destaque, no entanto, coube ao ex-ministro da Cultura, Gilberto Gil, que também deu uma palhinha da música “Andar com Fé”, adaptando o refrão para “com a Marina eu vou, que a fé não costuma falhar”.

O coração de Gil

Para explicar a decisão de apoiar Marina em detrimento da candidatura da petista Dilma Rousseff, Gil alegou razões do coração: “Mesmo tendo passado quase seis anos no ministério do presidente Lula, me decidi por Marina porque meu coração pediu assim. Acho que se trata, sim, da questão racional do desenvolvimento da produção, da responsabilidade social, do cuidado com o meio ambiente. Mas, se trata, mais do que tudo e profundamente, da questão afetiva. A questão do amor e da amizade”, disse o ex-ministro, que se referiu à Marina como “uma cabocla decidida e dedicada”.

Três candidatos a governador do PV – Fernando Gabeira (Rio de Janeiro), Fábio Feldmann (São Paulo) e Sérgio Xavier (Pernambuco) – participaram do evento, além do presidente nacional do partido, José Luiz Penna. Outro fundador e dirigente de peso do PV, o vereador carioca Alfredo Sirkis, foi o mestre-de-cerimônias. As ausências mais sentidas foram as do deputado federal Sarney Filho (MA), principal articulador do PV no Congresso Nacional, e a do ministro da Cultura Juca Ferreira, que optou por apoiar Dilma Rousseff.
 
Racha anunciado

Apesar das presenças nacionais e do clima de festa em torno de Marina, o lançamento da candidatura serviu também para revelar as divergências internas do PV. Desgastado pela tarefa de defender a aliança com o ex-prefeito e candidato ao Senado, Cesar Maia (DEM), Gabeira demonstrou irritação com a insistência do grupo liderado por Sirkis em apresentar a candidatura da vereadora verde Aspásia Camargo, já que a outra vaga na chapa senatorial está prometida ao PPS. “A maioria absoluta do PV aprova a aliança com Cesar. Algumas pessoas estão delirando”, disse, sem citar nomes.

Gabeira também conclamou os verdes a respeitarem a decisão do Tribunal Superior Eleitoral, que confirmou a possibilidade de apenas dois candidatos ao Senado por coligação: “Acho um contrassenso o PV se insurgir contra uma decisão unânime do tribunal”, disse Gabeira.

Contrariada, Aspásia Camargo reagiu com força. “Nosso candidato a governador tem dois candidatos, a presidente e nós não teremos ninguém para o Senado? Como fica a candidatura da Marina sem um palanque de senador do PV no Rio, já que os dois candidatos a senador do Gabeira estarão fazendo campanha pró José Serra?”, protestou.

A proximidade com Serra e o PSDB também promete gerar novas crises no PV em caso de eventual disputa de um segundo turno entre o tucano e Dilma. “Muita gente pensa que o apoio do PV a Serra será automático, mas a maioria dos militantes que saíram do PT acompanhando Marina preferem o apoio à Dilma no segundo turno. Mas, ainda temos esperança de romper a polarização e levar Marina ao segundo turno. Aí, tudo ficará mais fácil”, disse um dirigente regional do PV, que pede para não ser identificado.