Igrejas

Participação de religiosos em mobilizações por Estado de direito se consolida no país

Para ex-deputado Adriano Diogo, apesar da influência da ala 'mais atrasada' da Igreja Católica, católicos estão 'numa militância muito progressista'. CNBB diz que não é momento de 'acirrar ânimos'

cnbb/divulgação

Dom Darci José Nicioli recomendou aos fiéis a “pisarem na cabeça da jararaca” e foi transferido de diocese

São Paulo – Apesar de a Igreja Católica brasileira estar hoje dominada, no alto da hierarquia, por setores conservadores, a organização, militância das bases e da juventude justificam uma expectativa otimista. “No Brasil, esses grupos progressistas são minoritários. Mesmo assim, o povo católico, apesar da influência dessa teologia mais atrasada que dom Odilo Scherer (arcebispo de São Paulo) e outros bispos representam, como o de Aparecida, está numa ‘pegada’ e militância muito progressista”, diz o ex-deputado e militante da ala católica do PT Adriano Diogo.

O ex-bispo auxiliar de Aparecida do Norte dom Darci José Nicioli recomendou aos fiéis a “pisarem na cabeça da jararaca”, em referência ao ex-presidente Lula, no domingo (6). Ele foi transferido para ser bispo em Diamantina (MG).

Para Diogo, que iniciou a militância nas antigas comunidades eclesiais de base, e continua suas atividades junto ao núcleo progressista da igreja, a combatividade do “povo católico” hoje está mais consolidada. “No meu tempo de jovem, da ditadura brava, a igreja católica só começou a reagir à ditadura muito tempo depois, com D. Paulo Evaristo Arns, Dom Angélico Sandalo Bernardino e todos aqueles bispos maravilhosos da teologia da libertação. Do ponto de vista dos militantes católicos, “uma coisa boa que nos ajuda é que o papa tem uma política completamente diferente dos grupos conservadores majoritários na igreja”, diz.

Na opinião de Eduardo Brasileiro, da Pastoral da Juventude e membro da Igreja Povo de Deus em Movimento, de Itaquera (zona leste de São Paulo), o papa Francisco é um diferencial. “Ele está ouvindo as pressões populares”, diz. Para ele, a conjuntura é muito preocupante. “Estamos num momento de fragmentação da sociedade em dois polos, e isso é muito triste. Um pólo com domínio econômico midiático, colocando a sociedade na situação de medo e desencanto político, e de outro lado um grupo que ainda está numa profunda crise interna de projeto ligado aos trabalhadores”, avalia, sobre o PT e o grupo que comanda o Brasil.

O jovem acredita que, apesar da crise, o momento é “muito propício para a reformulação do que podemos querer como esquerda”. Ele lembra que os movimentos sociais estão em cadeia na mobilização para as manifestações convocadas pela Frente Brasil Popular para os dias 18 e 31 de março. “Estamos nos mobilizando contra Eduardo Cunha, contra o golpe e é por aí que vamos mostrar que precisamos nos organizar popularmente, sair dos pedestais dos partidos e privilégios.”

Para Brasileiro, “o PT vai ter que passar por reavaliação profunda de suas estruturas, inclusive o Lula”. Mas ressalva: “Não pelo que a Lava Jato vem acusando com essa espetacularização, sendo tratado como criminoso sem provas, o que é muito triste”. Na opinião do jovem, a reavaliação diz respeito aos projetos de uma plataforma sociais do PT, que grande parte da juventude considera que em parte foi abandonada pelo partido.

Sobre a transferência do religioso para Dimantina, apesar da promoção, o ato do papa equivale à chamada “queda para cima”, já que ele deixa uma diocese de grande importância para uma muito inferior estrategicamente.

Eduardo Brasileiro critica o ex-bispo-auxiliar de Aparecida. “Ele deveria ter se posicionado para dar esperança ao povo, acreditando nas instituições democráticas, mas infelizmente se posiciona de maneira raivosa e se mostra um sujeito usado como objeto da mídia”. O ativista lembra que a transferência de diocese pelo papa não deve ter sido consequência direta da fala do bispo no último domingo, quando ele deu a declaração contra Lula e o PT. Isso porque uma medida como essa não é tomada subitamente, mas respeita trâmites. “Mas fico feliz que ele não tenha ficado. Ele não poderia conduzir uma arquidiocese nessas condições. A importância de Aparecida é muito grande, é onde ocorre a Marcha dos Excluídos.”

CNBB

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou nota de seu Conselho Permanente afirmando que este não é momento de acirrar ânimos. “A situação exige o exercício do diálogo à exaustão”, diz a entidade. “Conclamamos a todos que zelem pela paz em suas atividades e em seus pronunciamentos”, diz a CNBB, acrescentando que “qualquer solução que atenda à lógica do mercado e aos interesses partidários antes que às necessidades do povo, especialmente dos mais pobres, nega a ética e se desvia do caminho da justiça”.

A superação da crise passa pela recusa sistemática de toda e qualquer corrupção, pelo incremento do desenvolvimento sustentável e pelo diálogo que resulte num compromisso entre os responsáveis pela administração dos poderes do Estado e a sociedade. É inadmissível alimentar a crise econômica com a atual crise política. O Congresso Nacional e os partidos políticos têm o dever ético de favorecer e fortificar a governabilidade”, afirma a CNBB, que diz reconhecer a importância das investigações e seus desdobramentos. “Reconhecemos a importância das investigações e seus desdobramentos. Também as instituições formadoras de opinião da sociedade têm papel importante na retomada do desenvolvimento, da justiça e da paz social.”

Igreja Presbiteriana

Ontem, o Conselho Coordenador da Igreja Presbiteriana Unida do Brasil (CC-IPU), divulgou documento se posicionando em relação ao “agravamento da crise política do país, cujo ápice se deu com as recentes ações realizadas pela Operação Lava Jato, responsável pela investigação de políticos e empresários supostamente envolvidos em prática de crimes de corrupção”.

A entidade protestante, dirigindo-se ao Judiciário, Polícia Federal, OAB e Ministério Público, defende “o direito a viver em um país sob o império do Estado de direito, da justiça e da ética, sem distinção de classes, credos, raças ou qualquer outro padrão social convencionado”.

Diz ainda defender o aprofundamento das investigações da Lava Jato, mas “sem privilegiar ou discriminar quaisquer partidos políticos”. A instituição afirma também que “condena, veementemente, o caráter midiático e teatral que os coordenadores da chamada Força-Tarefa da Lava Jato têm dado”.