Com a base

Presidenta pede apoio para mudar superávit, e evita falar sobre ministérios

Parlamentares saem de encontro prometendo esforço, mas cobram definição de critérios para composição de ministério. Berzoini destaca ‘representatividade política e competência técnica’ como prioridades

Roberto Stuckert Filho/PR/Fotos Públicas

Em reunião com base de apoio, Planalto condiciona recursos para emendas a disponibilidade orçamentária

Brasília – A reunião entre a presidenta Dilma Rousseff e 23 líderes partidários, entre deputados e senadores, que compõem a base do governo, realizada ontem à noite no Palácio do Planalto, durou mais de duas horas e rendeu fotos sorridentes entre todos. Mas pouco ajudou no clima tenso do Congresso dos últimos dias e no que os parlamentares mais desejam neste momento: decifrar o enigma sobre os critérios que estão sendo utilizados pela presidenta para a indicação dos seus novos ministros. Por mais que o tema principal tenha caminhado para outro lado, o que está na cabeça de todos é entender como a presidenta vai pôr em prática a engenharia de levar representantes das legendas que a apoiaram para os ministérios.

O ministro das Relações Institucionais Ricardo Berzoini, citado por deputados presentes como “o único que fala a linguagem do Congresso”, deu uma adiantada no tema após o encontro e afirmou que a presidenta pretende unir “representatividade política com competência técnica”.

“Essa ansiedade é natural do período em que vivemos, de um novo governo, mas estamos aqui para discutir outra coisa, que é o projeto a ser votado no Congresso. Sabemos que a política entre governo e Congresso é muito natural para nós”, disse ele, acentuando que a questão da escolha dos ministros não está em jogo nesta conversa. “Até porque isso já vem acontecendo em reuniões entre a presidenta e as bancadas em separado”, acrescentou.

O discurso, porém, não serviu para acalmar a todos. “Ainda não ficou claro o que ela (Dilma Rousseff) quer. Precisamos conversar mais, caso contrário, o ano de 2015 será mais difícil do que se imagina. Acho que o sinal dado pelo Planalto terminou sendo que o grande teste de fogo vai ser a votação da mudança do superávit”, reclamou um dos deputados presentes.

Mudança na LDO

A reunião, que a princípio tinha como objetivo estreitar o diálogo com a base, ouvir os parlamentares sobre possíveis insatisfações e conversar sobre os projetos a serem votados ainda este ano no Congresso Nacional, terminou funcionando, mesmo, como um apelo formal por parte da presidenta, do vice-presidente Michel Temer e seus ministros (além de Berzoini, também participou o titular da Casa Civil, Aloísio Mercadante), para que os deputados e senadores aprovem o projeto que muda as regras de cálculo do superávit primário dentro da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

Uma das reclamações dos parlamentares foi o fato de a presidenta ter sido lacônica em suas palavras e se restringido a explicar sobre o que representará a mudança na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Dilma argumentou que caso não seja feita a mudança nas metas de superávit, haverá impacto sobre emprego e renda no país, na continuidade de obras federais e no envio de recursos para obras nos estados e municípios. Mas não se estreitou em tais temas.

O apelo mais direto, que amenizou o tom frio das conversas, segundo um senador que participou da reunião, foi feito por Berzoini, que procurou conversar de forma mais próxima com o grupo. “O ministro alertou para o prejuízo que poderá representar para a base aliada o fato de se começar um segundo governo demonstrando fragilidade na apreciação desse projeto e pediu para que a votação aconteça nesta terça-feira de todo jeito”, relatou um parlamentar.

Ao falar com os jornalistas, Berzoini ressaltou que a reunião foi um gesto de “agregação da base” e que a intenção é de mais encontros desse tipo serem realizados para firmar um diálogo permanente entre o Congresso e o Palácio do Planalto.

‘Garantia do equilíbrio’

Sobre a escolha do novo ministério, o ministro das Relações Institucionais enfatizou que “o que a presidenta está fazendo é buscando uma coalizão que reflita, por meio da sua nova equipe de ministros, a representatividade dos partidos no Congresso e na sociedade”. “O processo está sendo conduzido com representatividade política e com competência. Tenho certeza que os líderes sabem que este assunto não tem nada a ver com o que está sendo tratado aqui, que é assegurar uma legislação eficaz para o país e garantir o equilíbrio do orçamento”, disse.

Ricardo Berzoini explicou rumores de que o decreto publicado recentemente pelo governo implique em pressão para que os parlamentares aprovem logo o projeto que flexibiliza o superávit. O decreto ampliou o volume de recursos para ministérios diversos, para que o montante possa ser destinado a emendas individuais dos parlamentares – que costumam ser voltadas para obras e investimentos em suas regiões de atuação.

Com isso, subiu de R$ 7,8 bilhões para R$ 10,03 bilhões a liberação de recursos com esse fim. Mas num dos itens, o texto destaca que essa ampliação está condicionada à publicação da lei que vai resultar do projeto de lei que altera as regras de superávit. E, caso tal matéria não seja aprovada, os ministérios do Planejamento e da Fazenda vão elaborar um novo relatório de despesas para encaminhamento de outra proposta de decreto.

Acusado de chantagem e de ser uma estratégia para pôr em prática o famoso “toma lá-dá cá” observado em governos anteriores, o teor do decreto foi minimizado por Berzoini, que o considerou um texto necessário. Segundo o ministro, seria “ingenuidade” por parte do governo partir para esse caminho. “Temos total tranquilidade em relação à política com o Congresso Nacional, não faríamos isso em hipótese alguma”, rebateu.

O intuito do decreto é deixar claro, ressalta ele, que o descontingenciamento geral depende de uma questão objetiva que é o limite de superávit que o governo tem de praticar – se tiver de cumprir uma meta de economia maior do que a pretendida com a nova lei, terá menos recursos disponíveis. “Não tem nada a ver com emendas parlamentares efetivamente. O único motivo é que a LDO tem orçamento impositivo”, salientou.

Pauta bomba

Em meio às lideranças que ouviram quietas os argumentos apresentados, um dos destaques foi o líder do PMDB na Câmara, deputado Eduardo Cunha (RJ). Cunha, que é candidato à presidência da Casa e votou várias vezes contra matérias encaminhadas ao Congresso pelo Executivo, deu total apoio à votação e ainda sugeriu que seja definido em tempo hábil um acordo para evitar a votação, neste final de ano e início de 2015, de projetos que coloquem em risco a segurança contábil da União, as chamadas “pautas bomba”.

A atitude do líder peemedebista, além de ter surpreendido, foi vista como uma espécie de mudança em sua estratégia na condução da candidatura à sucessão de Henrique Alves (PMDB-RN) na Casa.

Também ficou acertado que, se depender dos líderes mais vinculados à base, a sessão será prolongada até o final da noite, de forma a garantir a votação da matéria ainda nesta terça-feira (2). “Se for necessário entraremos pela madrugada”, enfatizaram o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE) e o líder do Governo na mesma Casa, senador Eduardo Braga (AM). A disposição dos líderes deixou os deputados e senadores à espera de que, hoje, aconteça uma repetição da sessão que aprovou a Medida Provisória dos Portos, em 2013, marcada pela presença de parlamentares no plenário do Congresso até a madrugada.

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