PEC do Senado prevê perda automática de mandato após condenação criminal

Proposta de Emenda à Constituição do senador Pedro Taques elimina conflito sobre a questão recentemente julgada pelo STF, mas embute riscos ao aumentar ainda mais o poder do tribunal

A recente decisão do Supremo sobre o mensalão abriu uma disputa de poderes em Brasília (Foto: Patrick Grosner/Folhapress)

São Paulo – O senador Pedro Taques (PDT-MT) apresentou, em 27 de novembro, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 60, com a intenção de resolver a polêmica questão sobre a perda de mandato de deputados e senadores em caso de condenação criminal. 

No caso dos desdobramentos da Ação Penal 470, o julgamento do chamado mensalão, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os deputados João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT) perdem os mandatos. Se o projeto de Pedro Taques for aprovado, não haverá mais necessidade de o Judiciário dirimir dúvidas e a perda do cargo será automática. Para ser aprovada, uma PEC precisa de três quintos dos votos nos plenários das duas casas do Congresso. 

A redação da Constituição Federal prevê, no artigo 55, inciso VI, “que perderá o mandato o deputado ou senador que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado”, e ressalva no parágrafo 2° que a questão “será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta”.

A PEC do senador Pedro Taques revoga o inciso VI, eliminando a contradição existente entre o artigo 55 e o artigo 15. Este determina a “perda ou suspensão [dos direitos políticos]” por “condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem os seus efeitos”. Assim, se a proposta for aprovada no Congresso, a condenação criminal automaticamente acarreta a perda do mandato. 

“Existe um conflito na Constituição entre o artigo 15 e o artigo 55. Quem resolve essa dúvida ou é o Supremo, na interpretação, como ele fez no caso do mensalão, ou é o Congresso, através de uma proposta de emenda à Constituição. Nós apresentamos a PEC para resolver isso de forma definitiva”, diz Taques.

A proposta do senador do Mato Grosso traz a mesma interpretação dada pelo STF segundo a qual a condenação provoca a perda do mandato, mas vai além e dispensa as duas casas do Congresso de decidir nesses casos. “Eu concordo com o STF que existe essa dúvida e eu concordo que o Supremo trilhou o melhor caminho entre os dois existentes. Cabe ao STF fazer isso como intérprete da Constituição”, afirma o senador. “Não existe nenhuma incongruência entre o entendimento do Supremo e a minha PEC.”

O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) concorda que “é preciso mudar, porque hoje é ambíguo”. Para ele, “a proposta do senador Taques tem a vantagem de corrigir esse assunto”. Porém, Buarque diz que há “um perigo” na proposta de Pedro Taques: “É que o mandato de qualquer parlamentar fica nas mãos de 11 pessoas [os ministros do STF]”. “Não é possível que o Congresso aceite uma pessoa que foi condenada; mas, ao mesmo tempo, não é democrático que 11 pessoas tenham o direito de cassar qualquer político eleito”, pondera Buarque.

De acordo com o senador do Distrito Federal, a proposta de Taques embute riscos ainda maiores. “Enquanto é um deputado a gente fecha os olhos. Mas imagine que amanhã seja o próprio presidente da República. Imagine que o presidente fez um cheque sem fundo. Abre-se um processo e ele é condenado no Supremo. Cassar o presidente é uma coisa séria”, argumenta.

Equilíbrio

Outra questão é saber se o próprio Congresso vai aprovar uma emenda constitucional que lhe retira poder de julgar seus próprios representantes. “Aí é uma adivinhação. Eu apresentei a PEC, mas isso vai ser debatido, depende da vontade política, cada senador e deputado tem legitimidade para fazer outras propostas”, diz Taques.

Para Buarque, “a proposta é bem intencionada, necessária”. No entanto, ele entende que “ao longo da discussão ela tem de ser aprimorada, para manter o equilíbrio entre os dois poderes. Um poder não pode ser superior ao outro. Nem o Congresso pode fechar os olhos a uma decisão do Supremo, nem o Supremo pode ter um poder maior do que o Congresso ou o poder Executivo”. 

Na visão do senador, talvez se possa chegar a um equilíbrio explicitando no texto constitucional quais tipos de crime acarretariam a perda de mandato de forma automática. “Uma condenação que leve à prisão em regime fechado, por exemplo”, sugere Cristovam Buarque. “Tem de haver um meio termo. Temos que pensar em algum tipo de limitação a esse poder total do Supremo.”