Atual é de 1950

Doze juristas têm até setembro para apresentar nova lei do impeachment

Para Lewandowski, que presidiu sessão do impedimento de Dilma, é preciso assegurar “ampla defesa e direito ao contraditório”

Jane de Araújo/Agência Senado
Jane de Araújo/Agência Senado
Em 2016, à época do golpe parlamentar, Dilma manteve sua elegibilidade mesmo após a condenação pelo Senado Federal

São Paulo – Doze juristas, 11 homens e apenas uma mulher, têm até setembro, pouco antes das eleições, para apresentar anteprojeto para uma nova lei sobre o impeachment. A atual é de 1950 (Lei 1.079, governo Gaspar Dutra). Foi usada como base para o contestado impedimento de Dilma Rousseff, em 2016, mas ignorada apesar de 143 pedidos apresentados contra o atual presidente da República.

No ato de instalação do colegiado (confira abaixo os nomes), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski, que será o presidente, disse que a Lei 1.079 é “pobre” em relação ao procedimento. “Umas das principais e mais importantes tarefas dessa comissão é estabelecer um procedimento que propicie aos acusados aquilo que é fundamental no Estado Democrático, que é a ampla defesa e o direito ao contraditório”, declarou o magistrado, que em 2016 presidiu a sessão do impeachment de Dilma.

Lei anacrônica

Dois senadores do Podemos – Lasier Martins (RS) e Eduardo Girão (CE) – criticaram a criação da comissão e a escolha de Lewandowski. “A lei do impeachment tem servido para cassar presidentes da República, mas nunca é usada para processar ministros do Supremo em constantes infrações”, disse Lasier. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), defendeu a iniciativa, afirmando que a legislação está defasada. “Diversos dispositivos dessa lei não foram recepcionados pela Constituição. A intenção é que, em relação a um tema tão discutido e tão falado no Brasil, não tenhamos uma lei tão anacrônica, com mais de 70 anos de existência. A decisão sobre a redação final é do Parlamento brasileiro.”

Para Pacheco, impeachment deve ser solução e não um problema a mais. “Se abalos e sobressaltos fazem parte da dinâmica política, a figura do impeachment não deve operar como fator de seu agravamento”, declarou, durante a instalação da comissão, no último dia 11.

Integrante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Luiz Fernando Bandeira de Mello, um dos 11 escalados, afirma que a futura lei deve incluir membros do próprio CNJ e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que não existiam em 1950. Ele também considera necessário rever artigos que tipificam as condutas que podem ser objeto de impeachment. Cita, por exemplo, crimes contra a lei orçamentária (artigo 4º, item VI). “São pontos de responsabilidade do secretário do Tesouro ou do ministro da Fazenda.”

Dilma foi acusada de cometer um crime dessa natureza. Na denúncia, a então presidenta foi acusada de ter cometido crime de responsabilidade contra a lei orçamentária e contra a guarda e o uso de recursos públicos. Em 10 de agosto de 2016, por 59 a 21, o Senado aprovou relatório que julgou a denúncia procedente. O relator era justamente Antonio Anastasia (PSDB-MG).

Dosimetria da pena

Na condição de secretário-geral da Mesa do Senado, Bandeira de Mello acompanhou o caso de perto – era escrivão no processo. Como consultor técnico, instruiu os parlamentares na votação em separado. Dilma perdeu o mandato, mas não os direitos políticos. Para ele, essa questão deve ser mantida. “Quando você olha o artigo 68 da lei, por exemplo, ela expressa isso de maneira clara. Você vota a perda do cargo e depois o tempo de inabilitação. É uma questão de dosimetria da pena, que está prevista no direito brasileiro. O juiz deve aplicar a dosimetria da pena com base na culpabilidade, na gravidade da conduta”, argumenta.

O integrante do CNJ reforça a visão de que se trata de uma lei defasada e cita um detalhe de sua origem histórica. “Foi escrita em 1949, pensada para cassar o presidente Getúlio Vargas. Se consultarmos nos debates da época – e o Senado dispõe das notas taquigráficas –, os autores da lei eram os principais adversários de Vargas. Quinze dias antes de cometer suicídio, Vargas enfrentou a votação da abertura de seu impeachment na Câmara, ainda no Rio de Janeiro, e venceu por ampla maioria, arquivando a denúncia”, lembra. Getúlio Vargas foi eleito em 1950, mas não chegou ao final do mandato – suicidou-se no Palácio do Catete, sede do governo, no Rio, em 24 de agosto de 1954.

A Lei 1.079 foi aprovada no governo do marechal Eurico Gaspar Dutra, um ex-ministro de Vargas, que havia sido eleito presidente em 1946, após o período do Estado Novo. Em pouco tempo, houve o rompimento com o ex-presidente. Além de Dutra, assinam a lei os ministros Honório Monteiro (Trabalho, Indústria e Comércio), Sylvio de Noronha (Marinha), Canrobert Pereira da Costa (Guerra), Raul Fernandes (Relações Exteriores), Guilherme da Silveira (Fazenda), João Valdetaro de Amorim e Mello (Gabinete Militar), Daniel de Carvalho (Agricultura), Clemente Mariani (Educação e Saúde Pública) e Armando Trompowsky (Aeronáutica). Curiosamente, entre os signatários não aparece o ministro da Justiça (Adroaldo Mesquita da Costa).

Quem integra a comissão:

  • Antonio Anastasia, ex-senador, atual ministro do Tribunal de Contas da União (CTCU
  • Carlos Eduardo Frazão do Amaral, mestre em Direito Público e assessor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)
  • Fabiane Pereira de Oliveira, ex-secretária-geral da presidência do STF. Será a relatora da comissão
  • Fabiano Augusto Martins Silveira, ex-ministro do governo Temer e consultor legislativo do Senado
  • Gregório Assagra de Almeida, promotor do Ministério Público de Minas Gerais
  • Heleno Taveira Torres, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP)
  • Luiz Fernando Bandeira de Mello – Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
  • Marcus Vinícius Furtado Coêlho, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)
  • Maurício de Oliveira Campos Júnior, advogado criminalista, professor e ex-defensor público
  • Pierpaolo Cruz Bottini, advogado criminalista e professor universitário
  • Ricardo Lewandowski, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)
  • Rogério Schietti Machado Cruz , ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ)

Com informações da Agência Senado e do CNJ