Eleições 2016

O desafio da eleição em São Paulo, cidade que projeta e derruba candidatos

Disputa no maior colégio eleitoral do país costuma ser vista como termômetro para votações estadual e nacional, mas influência é relativa

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Centro de São Paulo visto do jardim suspenso localizado na cobertura do Edifício Matarazzo, sede da prefeitura

blog coisos on the goGabinete do Prefeito
Gabinete do prefeito, no Edifício Matarazzo

São Paulo – Com seus quase 9 milhões de eleitores, 6% do total nacional, e mantendo sua tendência de fragmentação (11 candidatos), a cidade de São Paulo é tida como termômetro de humores políticos e pretensões eleitorais de nível nacional. Os resultados e seus desdobramentos nem sempre confirmam essa visão, mas neste domingo (2), mais uma vez, a eleição paulistana será acompanhada com um olhar já em 2018. O professor de Filosofia Política Aldo Fornazieri não vê relação entre uma eleição e outra – “Normalmente, são autônomas” –, mas destaca o potencial, por assim dizer, destrutivo da megalópole. “O problema é que São Paulo é uma máquina de demolição de lideranças”, diz, lembrando que nas últimas votações quem estava no poder municipal não conseguiu se reeleger ou emplacar seu candidato: “Marta tentou duas vezes, Pitta foi destruído, Serra perdeu, Haddad enfrenta problemas”.

Os resultados das eleições mais recentes em São Paulo estão longe de mostrar alguma tendência. Desde a redemocratização, em 1985, houve vencedores de diversos espectros políticos. Nas quatro últimas, venceram dois candidatos do PT, um do PSDB e um do DEM, independentemente de quem estava no poder central. Quando Marta Suplicy (PT) foi eleita em 2000, por exemplo, o Executivo paulista era – como ainda é – comandado por tucanos, assim como a Presidência da República. E mesmo com Luiz Inácio Lula da Silva no Planalto, os candidatos petistas perderam em 2004 e 2008.

“Não há vinculação direta (entre a eleição municipal e a federal)”, diz Fornazieri. “O eleitor sabe fazer essa distinção, e normalmente faz. Hoje, mesmo com o prefeito Fernando Haddad, candidato à reeleição, tendo conseguido equacionar a dívida paulistana, o que representa um alívio em termos de gestão, ainda pesam desafios de décadas para a cidade, como saúde, ambiente, habitação e saneamento. “Tem muitas demandas e recursos insuficientes.”

Sendo assim, não é possível definir São Paulo como progressista, conservadora ou reacionária. “O eleitor aqui tem um caráter mais pragmático”, avalia Fornazieri, para quem o eleitorado paulistano tem menos preocupação com o perfil ideológico do candidato. Diferente de uma capital como Porto Alegre, por exemplo, onde os resultados mostram tendência de eleição de políticos de tendência mais progressista.

Termômetro

Mas a cidade tem peso óbvio em outros aspectos. Uma vitória de João Doria, por exemplo, fortaleceria as pretensões do governador Geraldo Alckmin a novamente se candidatar à Presidência da República. “Ajuda do ponto de vista interno do PSDB”, observa o professor. Alckmin impôs seu candidato perante outros caciques tucanos, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o sempre candidato José Serra – que em 2012 tentou voltar à prefeitura, mas perdeu para o petista Fernando Haddad. Na época, o prefeito Gilberto Kassab, apoiado por Serra, tinha avaliação negativa.

“As eleições municipais nas capitais brasileiras sempre são tratadas pela mídia de maneira geral como um termômetro que antecipa o clima para as sucessões estaduais e presidenciais vindouras. (…) Todavia, um olhar retrospectivo sobre estes pleitos que antecederam as disputas presidenciais de 2006 e 2010, assim como o de 2012, revela que a influência do resultado de uma eleição sobre a outra é relativa, mostrando que as eleições municipais são eivadas de particularidades, como a realidade política local e a avaliação do desempenho da gestão, que não permitem vinculá-las diretamente à disputa nacional”, afirmam, em artigo, os professores Claudio Gonçalves Couto, Fernando Luiz Abrucio e Marco Antonio Carvalho Teixeira.

Em 2004, por exemplo, com o PT já no Planalto, o partido conseguiu eleger nove entre os 26 prefeitos de capitais. Mas perdeu disputas importantes, como São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre. No caso paulistano, havia um desgaste provocado pelas reclamações de que a administração teria aumentado a carga tributária. “A expectativa de que com o PT à frente do governo federal haveria mais recursos para a cidade não foi suficiente para convencer o eleitor a reeleger Marta Suplicy. A dinâmica local pesou mais na decisão do voto”, observam os analistas.

Eles ressaltam, entretanto, que a independência entre os pleitos não impediu que a eleição à prefeitura paulistana fosse afetada pela disputa nacional. Mesmo tendo perdido em 2002 para Lula no segundo turno em São Paulo (51% a 49%), o tucano elegeu-se prefeito dois anos depois com discurso de oposição ao PT – e acabou deixando o mandato antes da metade, para candidatar-se a governador.

Para Teixeira, doutor em Ciências Sociais e professor do Departamento de Gestão Pública da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a eleição em São Paulo ganha ressonância nacional pelo fato de reunir candidatos presidenciais. “É uma eleição que tem importância capital para medir força política”, afirma. “A grande questão é que ela sempre refletiu a polaridade nacional”, acrescenta, referência à disputa recorrente entre PT e PSDB pela Presidência da República.

Neste ano, aparentemente há uma diluição dessa tendência, com a entrada em cena de Celso Russomanno (PRB) e Marta Suplicy (PMDB), mas o professor vê chances de que volte a acontecer. “O PT dirige a cidade e o PSDB quer dirigir.”

Ele também avalia que o eleitor paulistano costuma decidir seu voto mais com base na gestão do que na política nacional. “Ele cobra do candidato para além da identificação partidária”, diz Teixeira. Mas ambos os professores acreditam que, neste ano, o atual prefeito sofre em alguma medida com o desgaste do PT em nível nacional. “Tem um peso, talvez não decisivo”, comenta Fornazieri. E Doria avança com essa crise, além de certo desencanto da população pela política.

 

Fotos de abertura cedidas pelo Blog Coisos on the Go